terça-feira, 9 de novembro de 2021

Bruce Nauman: Linguagem e a «Condição Humana

 «Eu não trabalho assim. Parte disso tem a ver com uma ideia de beleza. Pôr do sol, flores, paisagens: esse tipo de coisa não me motiva a fazer nada. Só quero deixá-los em paz. Meu trabalho vem da frustração com a condição humana. E sobre como as pessoas se recusam a entender outras pessoas. E sobre como as pessoas podem ser cruéis umas com as outras. Não é que eu acho que posso mudar isso, mas é uma parte muito frustrante da história humana ».

           - Bruce Nauman em: Robert C. Morgan (2002). Bruce Nauman, p. 281


O artista estadunidense Bruce Nauman (n. Indiana, 1941) é parte de uma geração de artistas que buscam, de maneiras diversas, intervir no debate sobre a arte através de seus trabalhos. Difere de seus contemporâneos, entretanto, no ponto em que tal intervenção não se concretiza em produções textuais sobre a temática mas na integração da linguagem à própria obra de arte. Além de Artes, Nauman estudou matemática, física e lettering — áreas cuja influência é perceptivel na dinâmica combinação entre criatividade e lógica que encontramos em seu trabalho, além da centralidade dada ao trabalho tipográfico em algumas de suas obras.

Longe de ser um artista que se pode acusar de um «estilo característico», remarca mais pelas temáticas abordadas e meios utilizados do que por uma estética fixa, considerado minimalista por seu interesse na repetição de formas simples, visual e verbalmente e pela crueza da apresentação final de suas obras, sem tentativas de ocultar as marcas do processo que levaram ao objeto final.


Bruce Nauman, Run from Fear, Fun from Rear, 1972

Foto: Nathan Keay, © MCA Chicago

Fortemente influenciado pelos trabalhos de Ludwig Wittgenstein e Samuel Becker, o enfoque linguístico que toma forma concreta a partir do uso de signos-palavra em algumas de suas obras e abstrata em outras — e que se utiliza de métodos muito semelhantes àqueles presentes no trabalho de Beckett, como a repetição cacofônica e os jogos com diferentes significações e sonoridades — tem como finalidade uma exploração da condição humana através do caos propositado causado pela confusão linguística. Para Nauman, «Quando a linguagem começa a se fragmentar um pouco, ela se torna emocionante e se comunica quase da maneira mais simples possível: você é forçado a estar ciente dos sons e das partes poéticas das palavras. Se você lida somente com o que é conhecido, você terá redundância; por outro lado, se você lida apenas com o desconhecido, não consegue se comunicar de forma alguma. Sempre existe alguma combinação dos dois, e é como eles se tocam que torna a comunicação interessante» (Bruce Nauman, 1989).

Bruce Nauman, Good Boy, Bad Boy,1985. © ARS, NY and DACS, London 2021


Em termos práticos, tais jogos linguísticos buscam ofuscar a clareza da transmissão e recepção de mensagens no processo de comunicação. Para isto, descontextualiza termos, ironiza o palavreado cotidiano, e insere sentidos obscuros à linguagem corrente e, assim, promove uma disrupção na percepção da comunicação linguística diária. «O resultado, por vezes, tem qualidade literária inegável e carga emocional desconcertante.» (Benetti, L. (2016). “Ficção corrói fato”: uma introdução aos escritos de Bruce Nauman. ARS (São Paulo)14(28), 353-373. https://doi.org/10.11606/issn.2178-0447.ars.2016.124507).

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