‘Viagens’ é o título da mais recente exposição do ceramista contemporâneo António Vasconcelos Lapa, presente no Museu Nacional do Azulejo até 30 de abril. O artista convida-nos a fazer uma viagem pelas suas obras, desde azulejos a esculturas desmontáveis, a máscaras que dão asas à nossa imaginação. A exposição contém 35 peças produzidas pelo artista a partir de 2001, ano em que o seu neto Vicente nasceu e o inspirou a ter uma abordagem mais lúdica e interativa ao seu trabalho.
António Vasconcelos Lapa, para aqueles que não o conhecem, é mais famoso pelas suas esculturas cerâmicas que aludem a mundos fantásticos. A sua longa carreira é uma demonstração da sua criatividade e a sua obra contém uma forte vertente narrativa e personagens diversos e coloridos. Ao longo dos anos produziu painéis de azulejos, tapeçarias e ilustrações, tendo exposto o seu trabalho tanto em Portugal como internacionalmente.
Esta exposição, de coordenação geral de Alexandre Nobre Pais, é uma jornada
através das alegres experimentações do artista com a cerâmica e também uma
peregrinação através do próprio museu, já que, além da sala de exposições
temporárias, podemos encontrar as suas peças espalhadas pelo espaço do antigo
convento.
Mangal (2022) e Figura Feminina (2021) de António Vasconcelos Lapa. |
Ao seguir o percurso da coleção permanente somos de vez em quando
surpreendidos pelas peças brincalhonas do artista, trazendo-nos um sorriso ao
rosto no meio da castidade religiosa do espaço que as rodeia. De alguma
maneira, parece que sempre pertenceram às salas onde se encontram, tal foi a
delicadeza com que se escolheram as suas posições.
Frutos (2022) de António Vasconcelos Lapa. |
Algo único no trabalho de Vasconcelos Lapa é que as suas peças, cheias de textura, cor, movimento e som foram feitas para serem tocadas e apreciadas com todos os nossos sentidos. O próprio artista disse, numa entrevista ao Museu Nacional do Azulejo sobre a presente exposição, que as suas obras têm como objetivo “pôr as pessoas a participar na brincadeira” (Museu do Azulejo, 2022), afirmando que gosta que as pessoas passem a mão nas peças, mesmo havendo o risco de se partirem.
É referido que a exposição tem dois momentos, o de inspiração vinda pelo nascimento do neto do artista e outro inspirado pela flora descoberta nas suas viagens pela Ásia. No entanto, as peças desses dois momentos estão misturadas, criando uma simbiose nas duas coleções. As plantas deslumbrantes complementam as personagens fantásticas de Vasconcelos Lapa, gerando um mundo onde tudo aparenta ser possível.
Vicente e o Dragão (2005) de António Vasconcelos Lapa. |
No entanto, mesmo que essa informação esteja descrita no painel de introdução à exposição, não nos sentimos muito confortáveis para tocar nas peças divertidas do artista. Completado o percurso do museu, sentindo o peso de um silêncio próprio de um convento e caminhando pelas suas salas silenciosas, não nos é natural assumir o estado de espírito quase infantil que é necessário para apreciar as peças do artista como ele pretende que o sejam.
Mesmo aparentemente tendo autorização para tocar nas peças, não somos
capazes de o fazer. O olhar inquisidor do segurança nunca se descolou de nós,
dando-nos a impressão de estarmos na escola a ser observados por um professor
que sabe que estamos prestes a fazer asneira. Assim, ficamos limitados a olhar
para as cores vivas das peças e a imaginar como seria sentir a sua textura nas
mãos.
Plantas e Frutos (2020) de António Vasconcelos Lapa. |
O trabalho de António Vasconcelos Lapa é algo que solta a imaginação e que nos faz sentir como se fôssemos crianças novamente, trazendo-nos memórias nostálgicas à superfície e inspirando histórias nas nossas cabeças. No entanto, o ambiente religioso do Museu do Azulejo não é propício para essa exploração dos sentidos ou para essas ‘viagens’ através do imaginário do artista.
No entanto, esse mesmo contraste adiciona uma camada suplementar ao seu
trabalho, pois podemos apreciar melhor as suas formas criativas e texturas
variadas, mesmo que de maneira mais controlada e ordenada. O contraste de tom
faz-nos apreciar o quanto algo feito com uma qualidade inocente, inventiva e
guiada pelo gosto de ir à descoberta de mundos novos nos pode inspirar.
Lagarto-sapo (2014) de António Vasconcelos Lapa. |
Vale a pena visitar a exposição, principalmente se ainda não conhecem a
obra deste grande artista português, mesmo que não a possam experimentar no seu
potencial máximo. Sugerimos que sigam o percurso do museu para poderem ser
surpreendidos pela fantasia do artista, mas, como refere a descrição da
exposição, “Nesta exposição não há um percurso, há uma descoberta”.
Exposição: ‘Viagens’ de António Vasconcelos Lapa
Datas: 17 novembro 2022 - 30 abril 2023
Local: Museu Nacional do Azulejo
Morada: Rua Madre Deus 4, 1900-312 Lisboa
Horário: terça a domingo 10h-13h (última entrada 12h30), 14h-18h (última
entrada 17h30)
Custo: Normal – €5 / Estudante ou Sénior – €2,50 / Criança (até 12) -
gratuito
Fontes:
Museu Nacional do Azulejo. (2022, December 27). Entrevista
a António Vasconcelos Lapa [Video]. YouTube. https://www.youtube.com/watch?v=s72c3hjSDS4