segunda-feira, 6 de junho de 2022

Xilofones

“A outra vida dos animais”.

Vídeo “No ordinary people”


Ao visitar o Museu Nacional de Arte Contemporânea, junto com as minhas colegas de Mestrado em Educação Artística, entramos num espaço que nos leva a diversas exposições, a qual nos levou a uma em específico, “A outra vida dos animais”, destinada a um público infantil, logo aqui começa uma experiência emocionante, que nos vai levar por caminhos encantatórios e por vezes frios e tristes também. Toda a exposição parte do nosso imaginário, de literatura, de filosofia e de Arte, sobre os animais.

Em que passámos de uma existência, como fazendo parte da natureza, tem com ele uma relação tortuosa, à luta com os recursos naturais, a água, a Terra, os animais, queremos tudo para nós. É como tal uma relação difícil.

Esta mostra apresenta trabalhos de pintura, desenho, fotografia, escultura, instalação, vídeo e media artística, de setenta obras, entre os quais, Amar Roque de Oliveira, António Manuel de Fonseca, Amadeo de Souza-Cardoso, Dárdio Gomes, Júlia Lema Barros, Júlio Pomar, Mikhail Karikis, entre outros.





À medida que vou entrando neste mundo, vou-me apercebendo que os quadros e os desenhos estão expostos à altura das crianças, o que faz com que muitas vezes me tenho de baixar.

Logo aqui para nós adultos, há como que um adaptar, da nossa corporeidade, perante nos adaptarmos a um espaço, em que as obras expostas de forma, dispersa, pelas várias salas nos dão como se uma maior responsabilidade, respeito e quase como uma certa intimidade perante o que estamos a vivenciar.





Aqui pensamos em Charles Darwin(1809-1882) que nos demonstrou a sua teoria, sobre a evolução da espécie, em que nos propôs um olhar diferente, na maneira como pensamos o nosso lugar no mundo, e tantos anos se passaram, com tantas espécies em extinção, em que finalmente começamos a ter consciência que o que fazemos aos outros tem também consequências graves em nós.

As suas vidas, são riquíssimas, únicas, e fazem parte de diversidade da natureza.

Temos de dar voz aos outros animais, não lhes fazendo mal, e assim perceber melhor a nossa própria voz, e a perceber a nossa natureza animal.


Ao ter todos estes pensamentos em efervescência, entro num espaço pequeno, sento-me num puff, estão vários espalhados no chão, e vejo um vídeo com crianças a dizerem palavras de ordem, e a debater, a caminharem, com máscaras de várias cores. Ouvem-se os sons da natureza, o video chama-se “No ordinary people”, ouvem-se barulhos, como se fossem criaturas, nas grutas, os adultos envenenam tudo. Há muito ruído, aqui o poder das palavras, da linguagem, palavra de origem de vida, origem dos sons, ruídos, os animais, tocam xilofone, imitar os sons dos animais e da natureza.

Alerta para o porquê deitar veneno na água? Vai afastar criaturas inofensivas nos rios e como impedia que o mundo seja envenenado.

As crianças em grupo batem palmas, como se nos estivéssemos a sentir uns aos outros, e através do poder do barulho, espalham com as palavras de ordem: 1- justiça, 2- Criaturas,         3- Poder e 4- Acção.

Estão com máscaras feitas de cartão, como se fosse uma cabeça de animal, pintada com várias cores, como se tratasse de arte pré-histórica, as pinturas com ritual, no qual a nossa relação artística com os animais sempre existiu e existe na arte actual. 





O projeto “No ordinary Protest” do artista Mikhail Karikis, é uma performance, em formato de filme e som, tendo como inspiração o romance infantil de ficção científica “The Iron Woman”,(1993) do escritor e poeta britânico Ted Hughes no qual a história se baseia como se fosse uma parábola.


Em que a ecologia e o papel da mulher junto com o poder do som produzem efeitos no contexto físico, social e político. Há uma super-heroína, que oferece um barulho, o som, de presente às crianças. 

Transmite-o através do sentido do tacto, o toque, orgânico, o som, o ruído ressoa com a vozes de um conjunto de pessoas que habitam o planeta terra, os terráqueos e são afetados pela poluição, nas suas mais variadas formas. 

As crianças tomam conta do assunto e entram nas fábricas poluentes e infectam confrontação sem filtros, para uma ação imediata, com o argumento de não podemos esperar mais. 

O autor Kariakis envolveu-se com um grupo de crianças de 7 anos de uma escola primária em Londres, Inglaterra, durante todo o ano letivo.

Desenvolveu o seu projeto em várias fases, através de oficinas, utilizando metodologias experimentais, fez leituras, debates e brincadeiras. Em conjunto, com todas estas ferramentas de trabalho, criaram um projeto que trata os temas ambientais do livro e através da imaginação do tal ruído, de que o livro fale, que assiste os participantes no seu protesto. 

É um protesto feito, no aqui e agora, envolvendo algo que estas crianças são levadas a pensar, e que estão a passar na 1ª pessoa, como se fosse em tempo real, pois a poluição é algo que se está a passar, no seu tempo, afetando as suas vidas, a vida de todos, dos animais e da natureza, o ambiente.


Através do improviso, tendo a voz como instrumento, meio, com o qual emitem os sons junto com instrumentos musicais e brinquedos, experimentam os ruídos, criando, formas visuais, que nos lembram sítios, locais, paisagens que estão constantemente a mudar - o que vemos é que o som(o ruído da comunidade deve-se mobilizar, juntar e lutar para uma mudança, um virar de página através do som, do poder do som, como se de um grito, palavras, sons de ordem se tornasse. 

Vemos as crianças a debater o que é justo, com responsabilidade para com o meio ambiente e a necessidade que é urgente de solidariedade com todas as criaturas.

Nós e a natureza somos um todo, sem existir esse equilíbrio de um respeito mútuo, o presente, o aqui e agora, a acção tem de ser rápida.

As crianças surgem com máscaras com pinturas de várias cores, lentamente, quase que nos assustam como se de monstros se tratassem agitando-nos através do som e do vibrar do universo. 






Neste projeto, não sabemos como irá ser o futuro, sabemos que agora, no presente é importante estarmos todos juntos, nós os adultos, passarmos às novas gerações, que elas, as crianças, também têm uma voz política, uma ideologia e criatividade e imaginação ativista, preocupada, lutadora, onde devemos e temos o dever de ouvir a comunidade, as pessoas e o barulho, olhá-las como ferramentas, que podem atravessar um rio, nos espaços entre, que ultrapassam obstáculos, barreiras, tempestades, políticas ambientais e transformar o mundo em que vivemos para que possamos continuar a viver nele. 


O artista, ele próprio ao sentir que era excluído também, de um estrato social diferente sentiu a atração de trabalhar com comunidades onde muitas pessoas se sentem à margem e por alguma razão, perdem a sua voz, como se fossem invisíveis. No seu trabalho, colabora com essas pessoas, tentando entendê-las, e ver o mundo, através da sua perspetiva. É um projeto de todos em que somos iguais na sua criação.


Ele gosta de trabalhar com diferentes formatos, com o inesperado, com o novo, seja num museu, num site specific, num determinado local.


Ao criarem barulho todos juntos, eles planearam salvar o planeta de uma forma ecológica como alerta aos adultos. Terminando com a velha metáfora de que as crianças, esta geração têm o poder de mover montanhas.


Como afirma António Monteiro: “Convido todos os visitantes a envolverem-se neste olhar artístico sobre os laços que, desde sempre nos ligam aos animais, para não esquecermos que, no frágil equilíbrio da Natureza, também somos uma espécie animal”.


Exposição: “A Outra Vida dos Animais”


Local - Galeria Millenium BCP no Museu Nacional de Arte Contemporânea


Duração: 5 de Maio a 28 de Agosto de 2022


Horário: 10h às 18h


Curadoria de Emília Ferreira e Colaboração da Ana Vasconcelos


Encomendado pela Whitechapel Gallery, Film and Video Umbrella e Middlesbrough Institute of Modern Art


Apoiado pelo Arts Council England


http://www.mikhailkarikis.com/category/all-projects/no-ordinary-protest/


Casa-Estúdio Carlos Relvas

 Carlos Relvas, lavrador, cavaleiro, criador de cavalos, músico, inventor e amante da fotografia, natural da ilustre Vila da Golegã, era uma das personalidades mais ilustres da sua época.


Filho de famílias abastadas, entre 1871 e 1875 manda construir este edifício. Este apresenta características únicas mundialmente, tais como, o facto de ter sido construída de raiz, como monumento aos precursores da fotografia e com o objetivo exclusivo de acolher um laboratório e estúdio dedicado especialmente ao desenvolvimento desta arte. Relvas teve a oportunidade de criar um local de excelência para a revelação dos seus negativos e ensaio dos novos métodos daquela disciplina científica e tecnológica.



No meio de um jardim romântico bem típico do século XIX, a Casa-Estúdio é um monumento expressivo da arquitetura do ferro com 33 toneladas de ferro fundido. O revivalismo de estilos, como o gótico e o mourisco que marcavam a época é evidenciado pela decoração e simbolismo emprestado a construção.

A fachada principal, ladeada de dois “baptistérios”, ostenta um pórtico decorado com uma baixo relevo de um cavalo marinho, por cima um janelão-varanda rodeado pois dois bustos dos pioneiros da fotografia Niépce e Daguerre. Por cima um óculo rosáceo, onde se juntam as alas laterais com figuras de anjos segurando câmaras fotográficas.


Assim que entramos na casa encontramos à direita a laboratório escuro, aqui era onde a magia acontecia. Utilizando uma solução de colódio sobre uma placa de vidro que permitia a estampagem da fotografia captada. Mais à frente o laboratório claro, onde hoje é exibido em pequeno filme de 10 minutos sobre a sua vida e obra. Carlos Relvas foi casado com Margarida, e pai de quatro filhos. Margarida era uma mulher muito querida pelo povo da vila, ligada a várias causas nobres o que ajudou em parte na ligação de Carlos com várias pessoas de classe baixa que ele ambicionava fotografar. Após 1 ano da morte precoce de Margarida, Relvas volta a casar o que gera um grande conflito familiar com o seu filho mais velho José Relvas, que o expulsa da casa de Alpiarça e o obriga a ocupar o estúdio de fotografia também como casa. Mariana a sua nova esposa, era da faixa etária do seu filho José e ao contrário de Margarida, esta enquanto Carlos viajava pelo mundo praticando a fotografia Mariana em vez de permanecer em casa, viajava muitas vezes para fazer compras em Paris.




Paralelamente uma sala onde estão expostos alguns dos desenhos do seu amigo arquiteto que projetou a construção do edifício, fotografias tiradas por Carlos e os vários diplomas premiativos dos seus trabalhos fotográficos.

No fim deste piso a sala de espera, o camarim, onde quem iria ser fotografado se preparava e maquilhava antes de subir para o piso superior onde seriam fotografados. Ao fundo uma escada em caracol de madeira proveniente de Itália, mandada fazer de propósito para a casa, com escadas largas para as damas passarem com os seus grandes vestidos. Porém apesar de fotografar personagens ilustres como Rei Dom Carlos e a rainha Dona Amélia, Carlos fotografava muitos mendigos, mulheres ciganas e crianças pobres e estes não passavam por esta sala dentro da casa, entravam pelas escadas laterais do lado de fora da casa diretamente para o estúdio.

Por fim na nave superior, a razão desta casa ser tão emblemática. De cobertura e paredes envidraçadas, entre ferros trabalhados de forma eximia, encontra-se o magnifico estúdio onde a entrada de luz natural permanece durante todo o dia possibilitando a arte de fotografar, esta era regulada através de panos brancos controlados por mecanismos de fios e roldanas. Em exposição alguns dos mecanismos e acessórios fotográficos muito avançados para a altura. E ao fundo uma pequena sala, onde seria o seu escritório, onde planeava os cenários e inovações para as fotografias.



Do seu estúdio, o anfitrião Carlos Relvas e os seus convidados podiam avistar a monumental matriz, bem como a vasta e emblemática planície agrícola, rasgada pela então Estrada Real que unia Lisboa ao Porto e que constituiu um dos fatores de desenvolvimento e progresso da Golegã da época.

Após a morte de Carlos, devido a um acidente a sua esposa Mariana cumpre um dos seus desejos, e doa o estúdio à Câmara Municipal da vila onde permanece até hoje. Esta é sem dúvida uma viagem no tempo, até ao século XIX a não perder nos dias de hoje.

Reportágem rtp:

https://www.facebook.com/Casa-Est%C3%BAdio-Carlos-Relvas-469009403205156/videos/1125003181382733

domingo, 5 de junho de 2022

Retratos com história

No dia mundial da criança, 1 de junho, mais uma vez Leiria recebe a feira do livro. Este ano o município de Leiria decidiu homenagear a autora Alice Vieira, com uma exposição sobre a sua vida e obra. Na cidade podemos contar com a sua presença para a abertura da feira, assim como a inauguração da exposição de fotografia com curadoria de Nélson Mateus.

Ao entrarmos na sala de exposição, entramos sem grande acolhimento ao público, somos lançados numa sala com apenas imagens. A falta de legendas das fotografias deixa-nos apenas a nossa própria observação como ferramenta para o entendimento das mesmas. É uma exposição baseada no olhar atento do observador e tem como intuito partilhar um pouco da vida da autora.




Reconheço a falta de legendas como sendo um fator deveras interessante pois puxa pelo observador, pelo seu olhar, pela sua atenção, pela sua interpretação das fotografias à sua frente. No entanto, reconheço a necessidade de uma pequena identificação, descrição dos acontecimentos ou indicação da data das fotografias apresentadas, seria interessante para obter uma melhor noção temporal dos acontecimentos. Mesmo sem saber as datas, acompanhamos o crescimento da autora tendo presentes vários momentos marcantes na vida da mesma. 

As fotos estão divididas em painéis, numa disposição harmoniosa e equilibrada que faz os nossos olhos viajarem pelas várias imagens juntas. Por sua vez, esses painéis são possíveis de ser divididos por diversos momentos, alguns dos painéis retratam a infância da autora, outros mostram a sua vertente familiar, há dois grupos de painéis sobre a sua carreira, um enquanto jornalista e outro enquanto escritora, alguns momentos das suas condecorações e alguns retratos da sua velhice.



Os painéis com os conjuntos de fotografias são-nos apresentados em preto e branco, dessa forma a linguagem gráfica mantém-se ao longo do crescimento da autora, minimizando as diferenças das fotografias mais antigas e das fotografias mais recentes. Apesar da exposição ser-nos visualmente apresentada a preto e branco, há alguns conjuntos de imagens que interrompem essa linguagem gráfica mantendo as suas cores originais. 

Em destaque estão algumas fotografias fora destes conjuntos que são apresentadas individualmente, com as suas cores originais e uma maior dimensão. Estas fotografias são os retratos atuais da autora, são as fotografias que mais conquistam o olhar devido à expressão sorridente e feliz de Alice Vieira.

 



Devo destacar o painel colorido, que atrai logo o olhar do observador ao entrar devido ao seu grafismo. É uma linha temporal do lançamento dos seus diversos livros, deixando-nos conhecer o seu trabalho. É de leitura pois esta obra foi feita com fotografias das capas dos seus livros, o conjunto de fotografias é da autoria de Sandra Ventura.




 Esta exposição tem como objetivo destacar e valorizar a velhice e a sua beleza, assim como homenagear as personalidades que contribuíram para a nossa cultura. Vem por esta forma recordar e partilhar momentos da vida e obra da autora, com especial ênfase no seus momentos de velhice, sempre retratados de forma bela e real.


PandorArte – O CAM em Movimento

É verdadeiramente viável a fruição de obras de arte fora dos museus, como por exemplo em espaços públicos? Qual seria a relação possível com tais objetos, se estes estivessem espalhados pela cidade? 
 
O Centro de Arte Moderna da Fundação Calouste Gulbenkian – CAM, situado em Lisboa, encontra-se encerrado desde agosto de 2020 para obras de remodelação e ampliação do seu espaço. A data prevista para a sua reabertura está marcada para o próximo ano de 2023. O hiato temporal que aparentemente poderia configurar uma limitação para qualquer museu ou centro de arte tornou-se para o CAM uma oportunidade de expandir a sua geografia e dar a conhecer ao público um conjunto de novas obras. 
 
É neste contexto que nasce o CAM em Movimento, uma programação fora de portas que, a partir das obras da coleção, fomenta, em vários pontos da cidade de Lisboa, intervenções site-specific de artistas convidados. 
 
Por ocasião do seu surgimento em 1983, o CAM tinha como objetivo organizar a coleção de arte moderna e contemporânea da Fundação Calouste Gulbenkian. O acervo conta atualmente com mais de 11.000 peças de arte moderna e contemporânea dos séculos XX e XXI, as quais incluem importantes referências da arte internacional, bem como uma destacada seleção cujo foco é a arte portuguesa. 
 
A nova programação decorreu em diferentes fases e contou com a colaboração artística de nomes como Fernanda Fragateiro, Didier Fiúza Faustino, Carlos Bunga e Rui Toscano. As obras abordam desde intervenções em comboios da linha de Sintra e de Cascais até projetos desenvolvidos de raiz para contentores marítimos. 
 

Projeto “Não ligar (Movimento) ”, de Fernanda Fragateiro, desenvolvido para o CAM em Movimento. Estação Cais do Sodré. Foto: Pedro Pina.

Projeto “um mapa do céu”, de Didier Fiúza Faustino, desenvolvido para o CAM em Movimento. Estação do Rossio. Fotos: Pedro Pina.

 
Viajar de um ponto a outro da cidade consiste num convite para que as pessoas, ao habitarem a obra, possam se sentir parte dela. No entanto, para habitá-la é necessário primeiro conhecê-la. Para muitos, esta pode ser uma relação inédita em que a reflexividade do eu é contínua e tudo penetra*. As pessoas, ao serem interpeladas pela arte no seu quotidiano e no espaço público, são convocadas para refletir sobre inúmeras questões e para viver novas subjetividades. 
 
Junto à estação fluvial do Terreiro do Paço é possível encontrarmos a obra Home, de Carlos Bunga, que lança diversas indagações sobre o conceito de casa, um tema que o artista tem trabalhado continuamente. O que significa ter casa? O que significa não a ter? Esta casa-memória ou casa não-lugar suscita questões tanto poéticas quanto políticas. 
 

Instalação “Home”, de Carlos Bunga, desenvolvida para o CAM em Movimento. Foto Pedro Pina.

Instalação “Home”, de Carlos Bunga, desenvolvida para o CAM em Movimento. Foto Pedro Pina.

 
Uma das obras que nos chama a atenção é a do artista Rui Toscano. A instalação Music is the Healing Force of the Universe #4 é mais uma peça inédita criada, a convite do CAM, para o contentor marítimo que se encontra na Praça do Centro Comercial Fonte Nova, em Benfica.
 

Contentor Rui Toscano, desenvolvido para o CAM em Movimento. Foto Mariana Faria.

Instalação “Music is the Healing Force of the Universe #4”, desenvolvida para o CAM em Movimento. Foto: Pedro Pina.

 
Ao entrarmos no contentor, continuamos sob a influência dos ruídos envolventes e pela azáfama da cidade. Entretanto, de forma inesperada, esquecemo-nos de que estamos numa praça pública. No âmago da grande caixa é possível observar a instalação de duas camadas de acrílico que se desdobram em tensão, enquanto os nossos olhos reconhecem os tons em preto e o cromatismo que vai do vermelho ao laranja, ambos realçados por uma luz interior. No centro está a imagem, duplicada e distorcida, de Dionísio, rodeado por sátiros que dançam e tocam castanholas. O deus do vinho, reproduzido à escala humana, enverga uma lira num cenário que retrata a sua festa mítica. 
 
A aventura de ingressarmos nesta estrutura de metal faz-nos recordar o mito da caverna de Platão, mas de uma perspetiva de fora para dentro: a luz do conhecimento artístico pode, de alguma forma, ser encontrada no interior desta caixa, que está aberta para todos nós.
 
O título da obra também parece nos provocar: "A música é a força de cura do universo". Entre o atual flagelo dos tempos de guerra entre a Rússia e a Ucrânia e de um mundo pandémico longe de ter os dias contados, mantém-se no ar o que a música e a arte são capazes de estimular ou apaziguar. 
 
Até o final de julho, as intervenções do CAM em Movimento estarão em exibição pelas ruas de Lisboa, e esta é uma oportunidade especial para encontrarmos diferentes sentidos e outras leituras desta relação entre a arte e o espaço público. 
 
*Giddens, A. (2002). Modernidade e Identidade. Rio de Janeiro: Jorge Zahar.