No formato livro e no formato podcast, as relações entre o Verbal e o Não verbal são possíveis. O livro de artista, em particular, é o campo ideal para explorar estas sinestesias e sincretismos. Na realidade, tanto o livro de artista como o podcast podem ter "uma dimensão interpenetrativa entre os vários sentidos e promover a experiência da totalidade fenomenológica" ou, segundo a designação de Merleau-Ponty, “a comunicação dos sentidos” (1945). Pode-se por exemplo, misturar o texto e a imagem, o som, o corpo e o movimento, numa espécie de processo de hibridação transmediática.
Neste caso, pretende-se um objeto híbrido e não linear (simplificado e experimental), contrário ao livro tradicional, cuja narrativa é normalmente linear e estruturada segundo um princípio, meio e fim.
Para a construção deste livro de artista está a ser desenvolvido um projeto de planificação diagramática do mesmo, onde se tenta "coser" as diferentes categorias passíveis de serem transpostas no formato livro - matérica, cromática, eidética e topológica, os seja, a folha, a tipografia, a imagem, o mapa.
Estas categorias são os instrumentos gráficos e semióticos considerados para se poder transpor as diferentes camadas/linguagens presentes apenas sonoramente no objeto a artístico escolhido - o podcast Árvores sem Raízes, de Eduardo Costa Pinto.
As camadas sonoras de cada episódio e as suas transposições primárias para o formato livro são:
Verbais:
- Perguntas (tipografia)
- Respostas (tipografia)
- Excertos literários (tipografia)
- Música (tipografia)
Não Verbais:
- um percurso (mapa),
- uma topografia (mapa)
- um ritmo (imagem)
- uma atmosfera (imagem),
Como resultado da montagem e edição sonora de todos estas camadas narrativas no podcast, surge no sujeito que o ouve uma nova experiência de relação com a cidade e consigo próprio, ou seja, um possível movimento de enraizamento e uma consequente relação de transformação com o espaço urbano.
Esta experiência de movimento pode ser considerada uma outra camada (psicogeográfica / rizomática) e pode traduzir-se no aspeto final do livro, por exemplo.
Como conciliar e relacionar estas diferentes linguagens no seu processo de transposição para o formato livro, de forma a obter um efeito de unidade no objeto final? Eis alguns princípios:
1. Fazer corresponder a cada uma destas camadas acima descritas uma parte/folha do livro, cuja dimensão e desenho será variável.
2. Explorar graficamente cada uma destas partes/folhas, através da escolha e composição da tipografia, da imagem e do mapa, a sobreposição e a transparência, a cor, a interpenetração de planos, o desenho do espaço em branco, dobras, etc.
3. Deve tentar traduzir de forma sincrética e sinestésica a experiência de ouvir/ler/ver/sentir este Podcast.
A forma do livro, quando aberto, deverá ter uma estrutura em raíz ou rizoma, representando assim a experiência fenomenológica em que se inscreve o ouvinte deste podcast.
4. Pretende-se um livro pluriplanar, com diferentes possibilidades de leitura e de sentidos, ênfases, cortes, atalhos, percursos, mapas, imagens, diagramas, a descobrir em diferentes tempos ou em tempos sincronizados.
Como referências, apresentam-se este livros de artista:
Capital Cities, livro onde o artista Runjing Wang transforma mapas
de cidades em enigmáticas malhas, recortando tudo excepto as ruas.
Grace Kwami Sculture, livro onde o artista Atta Kawami faz uma
homenagem ao trabalho artístico da sua mãe, Grace Salomé Kwami.
Desenhado em forma de raíz, em que cada "braço" é dedicado a um
tópico da sua obra, como a geografia, método de trabalho, história
e contexto, géneros artísticos e os seus processos concomitantes,
e é ilustrado com fotografias e imagens do seu arquivo pessoal.
A impressão foi feita no Royal College of Art, em Londres, 1993.
Apresentam-se ainda os estudos muito iniciais do livro de artista em curso:
de planificação do livro, programa de edição do podcast)
Fontes:
Merleau-Ponty, M., O Olho e o Espírito, Ed. Nova Vega, 2013.
Deleuze, G. e Guattari, F., Capitalismo e Esquizofrenia Vol. 2 - Mil Planaltos, Ed. Assírio e Alvim.
Barthes, R., Le plaisir du texte, Paris,
Seuil, 1973.
Greimas, A. J., e Courtés, J, Sémiotique
- Dictionnaire raisonné de la théorie du
langage, Paris, Hachette Université, 1986.
http://www.bocc.ubi.pt/pag/babo-maria-augusta-texto-como-textura-heterogenea-texto-como-textura-hibrida.pdf
https://lume.ufrgs.br/handle/10183/27046
https://westportlibrary.libguides.com/artistbooks
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