domingo, 7 de janeiro de 2018

Bónus de Ana Jotta

















Na Rua do Embaixador 30B, vemos nas portas de vidro as cortinas magenta que poderiam cobrir quaisquer outras janelas, mas no entanto sabemos que apenas brevemente nos separam do seu interior, a entrada na exposição de Ana Jotta é livre, das onze às dezanove horas, e encerra à terça-feira. 
No mais comum dos espaços, mas que descobriremos ser cada vez menos isso à medida que o adentramos e nos (des)familiarizamos, vemos nas duas primeiras grandes paredes a série Ricochete #1 a Ricochete #9, os alvos trouvé marcados não pela passagem de balas, mas pela pressão tintada de peças de um jogo infantil e colagem de papel japonês - xilogravura e chine-collé a preto e magenta fazem mover-se círculos e largas circunferências, e suas secções, como que devolvidos pelos alvos ao invés de que estes se deixem ser atravessados, permanecendo no limite da perfuração. E como com qualquer disparo de uma arma de fogo, e o respectivo ricochete da bala que acerta mas ressalta do alvo impenetrável, tudo acontece num ápice. 
Só depois da série, ou salva, de “tiros” consegue o visitante examinar os resultados, descobrindo o caminho até à cave, e a Entrevista Perpétua. Lá, ele entra no ambiente lynchiano que a artista lhe mostra como a própria o encontrou, a cor nas cortinas e nos alvos, o magenta, repete-se nas paredes e até no ar, no espaço vazio, por força dos filtros alaranjados das luzes de tecto. E ao fundo, um círculo de luz. Enquanto desce as escadas, o visitante já consegue vislumbrar a mesa posta, do outro lado do gradeamento, uma mesa iluminada com inúmeros objectos reluzentes… mas é na direcção daquele foco luminoso ao fundo, ao não imediatamente reconhecível, que ele se dirige em primeiro lugar. A artista faz mínimas alterações ao espaço, no entanto assina-o ao fundo, ao canto, com uma bengala de J, proclamando ao mesmo tempo que questiona a condição de autor, no mesmo gesto fazendo substituir o seu nome por um objecto dourado que o assiná-la. 
Encapsulado por uma cor, o visitante flutua no espaço sem ter a certeza de pisar o chão axadrezado, e pode examinar os objectos dourados em cima da mesa: cacos de cerâmica, um livro, baquetas de madeira, pedras da praia, todos em bronze polido. Objectos familiares e quotidianos tornados relíquias que sintetizam o impulso coleccionista, potenciando-os enquanto objectos artísticos, como nos explica a curadora da exposição Ana Anacleto, Entrevista Perpétua é uma “tentativa de obter respostas para a perpetuação de perguntas”. 

«Haverá vida depois do trabalho?» será sempre a pergunta bónus. 


A exposição decorre até dia 5 de Fevereiro de 2018, e “parte de uma relação de entendimento entre a artista e o museu” MAAT, na sequência da atribuição do Grande Prémio Fundação EDP em 2013.












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