A REVOLUÇÃO DE GUTENBERG: “O gutenberguismo”
Quem
foi Johannes Gutenberg?
Sabe-se
pouco sobre Gutenberg. O ano do seu nascimento é estimado: por volta de 1400.
Nasceu entre 1393 e 1405, filho do comerciante, em Mainz. Mais tarde, viveu num
povoado que, devido à sua localização em Mainz, levava o nome de “Zum
Gutenberg”, mas não se sabe a razão pela qual ele escolheu este nome como
sobrenome.
Acredita-se
que, devido à sua habilidade técnica e comercial, tenha tido uma formação
profissional à altura da sua classe social, numa escola monástica ou numa
universidade. Entra em cena no ano de 1434, na cidade de Estrasburgo, Alsácia,
que na época fazia parte do Reino Alemão, e se situava na região diretamente
vizinha a Mainz.
Gutenberg
provavelmente trabalhou em Estrasburgo como ourives. Já quase com 40 anos de
idade, ele funda, com parceiros, uma empresa para confeccionar espelhos para
peregrinos a caminho de Aachen. No processo de fabricação já se adivinha a
futura fundição de caracteres de metal.
Da caligrafia à Tipografia.
Johannes
Gutenberg foi o responsável para que a escrita passasse a ficar duradouramente
fixada em letras de chumbo; as formas das letras já não evoluíram
exclusivamente pela invenção, destreza e fluidez da mão do calígrafo, já não
sofreram as mutações próprias do gesto humano de escrever.
Ultrapassaram-se
os caprichos da estética da letra manuscrita, mas também se anularam as
variações e os erros dos copistas. Em vez de manuscritos e de caligrafia,
passamos a ter uma tipografia
Do
ouro ao chumbo
Para fabricar mecanicamente livros,
Johannes Gutenberg (que tinha aprendido o ofício de ourives) combinou várias
das suas invenções revolucionárias. A combinação conduziu ao resultado final: o
processo tipográfico, utilizando tipos móveis, fundidos em metal.
Primeiro foi necessário
fabricar punções -
patrizes. Estes carimbos – também chamados patriz - molde macho – eram gravados
em aço duro.
Com estes punções eram gravados numa
matriz de metal mais macio, em cobre. Resultavam glifos de forma negativa.
Fabricar tipos de metal
Estas matrizes eram
integradas no fundidor manual –
outra importante invenção de Gutenberg.Esta liga de metais - chumbo e antimónio - tinha que
esfriar célere, para possibilitar uma produção rápida. No estado frio e sólido
tinha que ser dura, para que os tipos
fundidos durassem várias impressões.
Os tipos eram
guardados em caixas tipográficas bem ordenadas. Quando era o momento de fazer
um livro, o artesão compositor retirava-os
da caixa, para juntá-los no componedor, formando as palavras de uma linha de texto.
A famosa B-42 “ Bíblia de 42 linhas” , das quais apenas se
conservam 48 exemplares de uma edição total estimada em 180 exemplares, saíra
de um prelo, e era portanto um documento impresso.
Chumbos utilizados na impressão da Primeira Bíblia em 1439 por Guttenberg
Como imprimir uma folha?
A tinta de impressão para papel e pergaminho também foram inventadas por
Gutenberg. Uma tinta com alta viscosidade, que não permeasse o papel, pois o
verso da folha também era impresso. A tinta devia de secar rapidamente, para
não demorar o processo de produção do livro.
Para produzir a tinta de impressão, Gutenberg misturou fuligem, resina e
óleo de linhaça. A tinta era aplicada com duas almofadas, forradas de couro de
cão e com crina de cavalo dentro. A pele de cão não tem poros – os cães
transpiram pelo focinho e pela língua – o que faz com que a tinta não seja
absorvida pela almofada e permaneça na sua superfície.
A forma tinta - composição de tipos com a tinta aplicada – é colocada no
carrinho da prensa. O papel ou o pergaminho são inseridos na tampa. Estes são
colocados, então, sobre os caracteres tintos e o carrinho completo é colocado
sob a placa da prensa.
Com ajuda do torniquete da prensa, imprime-se a placa com o papel sobre
os caracteres. Enquanto um artesão imprime, o outro aplica tinta nos
caracteres, sempre de forma alternada. A prensa fornece uma face de texto muito
mais homogénea do que a que os melhores escribas da época eram capazes de fazer
manualmente.
E a prensa?
Gutenberg vivia
numa região caracterizada pelo cultivo de vinho desde a época romana, chamada
hoje de Renânia-Hesse e Palatinado. Os vinhedos estendem-se por várias centenas
de quilómetros ao longo do Reno, além de Estrasburgo, Karlsruhe até Mainz e
mais para o norte.
Esta região é, até
hoje, o maior conjunto contínuo de áreas vinícolas da Europa. Prensas de vinho
já eram utilizadas para a obtenção do vinho, a fim de “ex-primir” o suco das
uvas. A prensa de vinho foi tomada como molde embora ainda fosse necessário
muito trabalho para transformá-la numa impressora.
A suspensão da
placa, que não deveria girar, foi uma importante inovação. A semelhança com as
prensas de vinho desta época é inconfundível.
Gutenberg continuou
a imprimir na casa de seus pais. Em 1462, foi atingido por outro revés. Vários
cidadãos foram forçados a partir para o exílio após a luta pela sucessão do
arcebispo de Mainz, entre eles Gutenberg e seus ajudantes.
Foi-lhe permitido
voltar a Mainz após algum tempo, mas muitos dos seus colaboradores já tinham
partido para outras cidades. Assim, a «arte negra» da impressão do livro acabou
por se propagar rapidamente por toda a Europa.
Gutenberg faleceu
em 1468 como um conceituado cidadão de Mainz. Cerca de 50 anos após a sua
morte, existem tipografias em 270 cidades européias. Até aquela época, já
haviam sido impressos mais de 40.000 títulos com mais de 10 milhões de
exemplares.
Prensa de tipos móveis de 1811, em exposição em Munique, Alemanha
E as repercussões sociais?
A invenção da
tipografia com caracteres móveis foi inicialmente considerada bemvinda pela
Igreja Católica, pois com ela podia, por exemplo, imprimir cartas de indulgência em grandes
quantidades. Com o pagamento de uma soma em dinheiro, qualquer católico podia
livrar-se de cumprir as suas penitências — e até mesmo do purgatório.
Uma vantagem da
tipografia: a reprodução dos textos era mais fiel. No passar das décadas
seguintes, mais e mais pessoas podiam ler a Bíblia, que se tornara mais barata
por meio da sua reprodução tipográfica.
A França
revolucionária do século XVIII trataria Gutenberg como o “primeiro
revolucionário e benfeitor da humanidade”, queria mudar o nome da tipografia
para “gutenberguismo”, e até mesmo dar o seu nome a uma constelação...
Escultura de Johannes Gutenberg decora a fachada da antiga Casa
Garraux - atual Bovinu´s Grill - em São Paulo.
João Carlos Canotilho | @canotilho_ | 14600
Estudos Avançados de Cultura Visual | Prof. João Queiroz | FBAUL | 2022/2023
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