Fonte: Fotos da autora tiradas no dia da apresentação.
Oeiras,
07/06/2023
Um espetáculo de encher os olhos no Teatro Politeama em Lisboa! Canto, dança, música e narrativas que contam de maneira jocosa, através de sátiras e ironias sobre o teatro de revista em Portugal, seus personagens e contextos, e revive a “revista” como um gênero teatral que trás o riso e a crítica social como mobilizador da ação cênica. Como um dos próprios atores se refere no palco, em que a revista é “a arte de ser português”, Filipe La Féria nos vai revelando pouco a pouco, em um espetáculo de variedades, os personagens que fizeram da revista portuguesa um sucesso de público e entrelaçando assim a tradição com a contemporaneidade.
Os
atores e dançarinos em figurinos graciosos e ricos em detalhes, contam-nos
sobre experiências vividas pelos artistas, os de ontem, de meados do século XX,
que fizeram a revista portuguesa quando a mesma nasceu, assim como os de hoje,
que nos trazem a revista contemporânea. Em cenas que remetem ao quotidiano, o
espetáculo mostra também pessoas comuns, bem como críticas aos políticos e
autoridades, expondo as mazelas sociais, criando conexões com os tempos atuais,
unindo a revista do passado à revista do presente.
Vamos
da plateia rindo e nos emocionando com a atuação dos atores no palco que buscam
em muitos momentos a interação com o público, quer seja nas brincadeiras
endereçadas a alguém da plateia, que nos leva a gargalhadas, quer seja no
chamamento às palmas ou até mesmo, na narração engraçada de uma estória que se
comunica com as nossas vivências do dia-a-dia, ou através dos números cantados
e dançados e interpretados ao ritmo do fado. É como se subíssemos ao palco a
cada atuação e vamos a cada instante sendo convidados a bater palmas, a
cantarmos, nos envolvendo e divertindo juntamente com o elenco, dando um ritmo
especial ao espetáculo que nos vai afetando como a própria vida.
Alguns
locais da cidade de Lisboa são citados e assim aos poucos vão sendo construídos
através da atuação dos atores contextos variados na nossa imaginação, como o
Teatro Apolo, ponto central da revista, o Teatro da Trindade, o Teatro Nacional
e o Teatro Maria Vitória, considerado o primeiro teatro do Parque Mayer que fez
100 anos e que foi palco de vários teatros de revista, inaugurado em 1922.
Fonte:
Foto da Agenda Cultural.
Enquanto imaginamos os contextos, somos ao som do Charleston, uma dança surgida na década de 1920 na Carolina do Sul na América do Norte, convidados a bater palmas, vão aparecendo então a seguir, as canções e danças populares portuguesas, o público reconhece as canções e vão seguindo cantando com os atores e cantores, momentos especiais vão sendo criados em que a plateia e os artistas fazem a festa, o espetáculo de revista. Neste palco da alegria e da irreverência, os atores e atrizes vão personificando acontecimentos, e dando vida a personagens, a conceitos, e a instrumentos políticos, como a censura. Personificada como uma velha senhora, a censura, símbolo da repressão, é representada pela atriz que afirma ser contra a revolução, figura vigente nos períodos da monarquia e da ditadura. Todos no palco gritam, evocando o pensamento crítico em meio à brincadeira e a alegria.
O
espetáculo vai-se tornando também uma homenagem aos artistas da revista, surgem
no palco grandes painéis com os retratos de cantores, atores, coristas e vedetas
que se sobressaíram no teatro de revista, citando alguns nomes como: Eunice Munhoz
(1928-2022), Beatriz Costa (1907-1996), Ribeirinho (1911-1984), Vasco Santana
(1898-1958), Eugenio Salvador (1908-1992), Ivone Silva (1935-1987) e que são interpretados
pelos artistas da companhia. Através de cantorias que unem o fado às narrativas
de vida dos artistas da revista de um tempo longínquo, pelas memórias de tempos
idos vão sendo reveladas à plateia, com humor e emoção, sentimentos pensamentos
e modos de ser.
A
crítica mordaz, a sátira e as piadas preenchem o palco com personagens que de
suas palavras relatam a obscuridade das ações de agentes políticos que
prejudicam a população, gerindo mal os recursos. Para ilustrar, em um
determinado momento no palco, entra um ator que interage com outro grupo de
atores que representa um rancho folclórico. Como um coro bem jocoso e
divertido, este grupo vai reforçando e representando os descalabros provocados
pelos agentes políticos à população. Os atores se utilizam do exagero nas
expressões corporais e nas repetições das ações e falas, para ressaltar o
desespero como consequência das ações desastrosas que acometem a população vitima
do desrespeito e da exclusão.
Como em um ato de manifestação, indignação e inconformismo, com piadas e duplos-sentidos, os personagens vão relatando à plateia os problemas atuais, como por exemplo, os 125 euros de apoio extraordinário dos ordenados, o aumento de 50% das reformas em um mês, e da retirada de 30% ao ano nos impostos, o aumento do leite, do gás, das fraudas, da gasolina, do aumento constante das taxas e mais taxas e taxinhas.
Já
chega! Somos pobres! Também quero agradecer a Marcelo, o Marcelinho. É fome! É
miséria! É injustiça! Falta de habitação! Se alguém souber de um T0 por menos
de 100 euros...é que fico esperando vocês rirem das desgraças.
A plateia se diverte e é convidada pelos atores para acompanhar com palmas o canto, que vai se tornando cada vez mais crítico e sendo acompanhado pelas danças folclóricas que reforçam toda a situação de desagrado e desespero da população representada pelos atores em cena. Uma cena inusitada quando uma vedeta entra no palco em desespero por não ter comida para fazer uma sopa. O canto é crítico, dando destaque ao preço do pão, do leite, do bacalhau. Em meio às piadas, as cantigas de fado seguem emocionando, gerando dramaticidade e vão revelando personagens de revista de outrora. A plateia canta juntamente com os atores uma das canções de Lisboa que diz em coro:
Quando
o espetáculo se aproxima do fim o ápice das interpretações dos atores vai se
dando através dos variados solos de fado. As vozes incríveis dos atores entram
em conexão com a emoção da plateia que busca acompanhar cantando. Retornam
narrativas de vida, as vedetas contam as suas histórias, dando vivacidade à
apresentação, que não reduz a energia e empolgação em nenhum momento, dando
ritmo ao espetáculo nas alternâncias das variadas cenas. Um dos atores ressalta
que a vida é bela! Um teatro que vai se mostrando alinhado com as causas
sociais, humanitárias e instigando a plateia a compartilhar com o riso e as palmas,
o que é dito com o coração.
Vamos sentindo que não queremos que o espetáculo acabe. Tudo vai se tornando uma ode à alegria. Em meio às plumas das vedetas, seus cômicos e dramáticos relatos e em meio as cores dos figurinos que encantam o olhar, as letras das canções vão-se posicionar como em alto relevo no palco, mais um convite para que as pessoas da plateia participem da festa da revista, lendo do telão, cantando e batendo palmas juntamente com os atores.
Deixem
esse teatro com uma gargalhada! A vida vale a pena se tivermos a coragem de
rirmos dela! Porque Revista é sempre Revista!
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