Fonte: Fotos da autora no dia da visita aos museus.
Oeiras,
08/06/2023
Saí
para um passeio em busca das tradições portuguesas e que me levasse às pessoas
que fazem das suas práticas do dia-a-dia a sua arte, mas também o seu viver e
ofício, retratando um modo de ser característico de uma comunidade. Sendo assim,
nada melhor do que visitar dois museus que se comunicam pelos conteúdos dos
seus acervos, como o Museu de Arte Popular e o Museu da Etnologia Nacional,
ambos localizados na cidade de Lisboa, em Portugal.
Ao
adentrarmos no Museu de Arte Popular percebemos estar em um ambiente
diferenciado, onde os trabalhos manuais, o artesanato, são protagonistas das
memórias do povo português através da cestaria. O Norte de Portugal é a região
do país que destaca-se na produção de uma variedade de cestos, que se destinam à
atividades diversas e que retratam por sua vez, os autores dos mesmos, suas
histórias e ofícios, característicos das comunidades onde vivem.
Fonte: Fotos da autora no dia das
visitas aos museus.
A
cestaria como o próprio nome sugere é o ofício em que se cria uma variedade de cestos,
de fibras de origem vegetal. A elaboração dos produtos artesanais pode ser através
do método de entrançar as fibras ou em forma de espiral. Em ambos os casos, os
produtos fruto destas elaborações são muito harmoniosos, com proporções
geométricas diferenciadas e que levam a uma variedade de objetos que são
transformados a partir da ideia inicial da cesta, como vemos nas imagens
abaixo.
Canoas, candelabros, potes, vasos e lustres, são apenas alguns desses objetos, que podemos citar como exemplos e que retratam o esmero em que são produzidos. Afinal de contas, são produtos originários das mãos, do toque e da delicadeza e habilidade no trato com os materiais. Nada é feito à revelia, mas tudo tem o seu sentido único de ser. As sensações que atravessam as mãos, pelo corpo, vão dando formas variadas aos materiais e dando vida também pela imaginação do seu autor, ao objeto artístico.
Fonte: Fotos da autora no dia das
visitas aos museus.
As
paredes do acervo temporário, da exposição “Um Cento de Cestos”, vão atraindo o
nosso olhar para imagens dos artesãos, construtores de tão belas peças que se
distribuem ao longo das salas. Ao olharmos com atenção cada uma das
fotografias, que dão protagonismo aos artistas-artesãos, vamos percebendo que
cada um deles tem uma forma diferenciada de manusear suas produções, como
também uma forma especial de se relacionar com as mesmas peças e com os
ambientes de criação.
Fonte:
Fotos da autora no dia das visitas aos museus.
De acordo com o que é dito no programa do museu sobre a exposição:
“A exposição “Um Cento de Cestos”,
materializa uma estratégia de estudos, documentação e divulgação de coleções
congêneres do Museu de Arte Popular (MAP) e do Museu Nacional de Etnologia
(MNE), a partir de uma abordagem integrada que pretende evidenciar, por um lado,
a complementaridade entre essas coleções, e por outro, as sinergias que se
estabelecem quando da decisão de reunir as duas instituições numa única
entidade museológica.”
(Paulo
Ferreira da Costa, Diretor do Museu Nacional de Etnologia / Museu de Arte
Popular)
A
iniciativa dos museus em reunir em um único acervo os trabalhos dos artesãos,
busca dar visibilidade às técnicas manuais que primam pela sustentabilidade, no
manuseio de materiais que pela sua própria origem vegetal tornam-se renováveis,
não ferindo o meio ambiente.
Abaixo vemos a imagem de uma
cestaria denominada de “madeira rachada”, produzida a partir da utilização de
árvores diversas, como o castanheiro e o carvalho e bastante utilizada para a
agricultura e pescaria. Desta forma podemos perceber como o trabalho dos
artesãos além de ter uma função utilitária para eles próprios e de
sobrevivência, pode de maneira solidária, vir a contribuir para o ofício de
outros, quando utilizado como instrumentos de pesca, por exemplo, colaborando
assim em extensão do trabalho, para a comunidade como um todo. Uma maneira
também de repensar a vida através de ações que ganham importância pelo ato de
preservação, por ser sustentável e munido de pensamento coletivo.
Fonte: Fotos da autora no dia das
visitas aos museus.
Alguns
nomes dos autores das peças de cestaria cujos trabalhos estão expostos no museu
merecem ser referenciados, são eles: Dinis Cunha, cujo trabalho artesanal é
feito com madeira rachada, Manuel Dias, em vime, Antônio Gomes, em cana, Carlos
Silvestre em palha de centeio, Maria de Fátima Santos em junça e Vanessa
Flórido em palma.
Fonte: Fotos da autora no dia das
visitas aos museus.
Os
materiais são valorizados em cada detalhe na exposição, como os que mostramos
na imagem acima e através das características de cada uma das matérias-primas vamos conhecendo uma zona
de Portugal, a exemplo do sanguinheiro, do vime e do choupo. Essas
matérias-primas dão origem a utensílios variados como o cesto, usado nos
trabalhos agrícolas e as canastras utilizadas no comércio ambulante, nas feiras
em vilas, como em Miranda do Corvo no Distrito de Coimbra, cujas
matérias-primas neste caso da região em específico, são o castanho e salgueiro.
Mas também podemos citar como exemplo o viveiro de peixes utilizado para
transportar o peixe vivo dentro da água, origem em Vila Franca de Xira e cuja
matéria-prima é o salgueiro.
Fonte: Fotos da autora no dia das
visitas aos museus.
Seguindo
em nossa busca pela arte popular portuguesa, chegamos em nosso passeio
finalmente ao Museu da Etnologia Nacional e vamos aos poucos, nos envolvendo
com os brinquedos populares, os variados instrumentos musicais criados com
materiais rústicos, mas que esbanjam criatividade e que fazem das festas
populares portuguesas tão singulares em ritmos, performances e cores. E assim,
em ato de apreciação, aos poucos ao caminharmos pelo acervo do museu, vamos
sendo capturados pelo olhar, pelas fotografias do povo em festa e pelos vídeos
das celebrações, que também revelam seu sincretismo, que em menor ou maior
grau, relacionam o sagrado ao profano, das festas dos santos aos brinquedos
gigantes mascarados.
Fonte: Fotos da autora no dia das
visitas aos museus.
Acima
a Dança do Homens na Festa da Senhora do Alto dos Céus, imagem de Benjamim
Pereira de 1963. Foto tirada pela autora em visita ao acervo do museu.
Fonte: Fotos da autora no dia das
visitas aos museus.
Por
sua vez, das imagens que mostramos acima vê-se da esquerda para direita o
instrumento dos cartoze pauzinhos de pau-ferro, onde através das correias é
suspenso no pescoço do tocador, que com o chuço, material agarrado as correias,
quando arrastado pelos pauzinhos produz sons que vão seguindo conforme o ritmo
e compasso da dança que o acompanha. À direita temos a cabeça de gigatone ou
cabeçudo. Bastante conhecido nos carnavais da cidade de Tomar em Santarém.
O tempo dita a atuação de
determinados instrumentos e que consequentemente só se ouvem em determinados
períodos do ano. A flauta e o tamboril são tocados em conjunto pelo taborileiro
em zonas de Trás-os-Montes e Alentejo, tendo nesta última caráter cerimonial.
Ou em Santo Aleixo da Restauração na Festa de Santo Antônio, em Maio, e em
Barrancos na Festa de Santa Maria, em Agosto. Normalmente esses instrumentos
são propriedade da comunidade onde são tocados.
Chegando ao fim do nosso passeio
pelos museus que trazem em seus acervos a arte popular portuguesa através dos
cestos, dos instrumentos musicais e brinquedos folclóricos, fica a vontade de
conhecer ao vivo a atuação dos artesãos em suas comunidades e nos faz pensar e
questionar sobre uma possível aplicabilidade destes materiais e suas produções,
como substituição de produtos industrializados e assim, também como uma forma
de promover a sustentabilidade, fomentando o empreendedorismo local, a
empregabilidade ou um rendimento acrescido.
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