domingo, 10 de novembro de 2019

"Citizen Kane", de Orson Welles

Citizen Kane (1941), de Orson Welles

Citizen Kane (1941), filme realizado por Orson Welles, conta a história de Charles Foster Kane, um empresário americano de começos humildes que se torna um dos homens mais poderosos, ricos e influentes do mundo.  

As primeiras cenas do filme retratam a morte de Kane (Orson Welles). Ao som de Bernard Herrmann (compositor da banda sonora do filme), é revelado um lugar sombrio e escuro, onde é apresentada uma silhueta de um castelo, que mais tarde se reconhece ser Xanadu, “um paraíso na terra” mandado construir pelo próprio Kane. Nestes primeiros minutos surge o grande mistério do filme, o significado da palavra Rosebud, dita por Kane momentos antes da sua morte. Jerry Thompson (William Alland), um dos jornalistas que pretendia fazer um filme sobre a vida de Kane, pretende desvendar este enigma, procurando e entrevistando as pessoas que lhe eram mais próximas.

Ao longo das entrevistas, as personagens vão recordando Charles Kane e contando alguns dos momentos mais importantes e decisivos da sua vida, desde a infância até à velhice. A partir destas cenas, que assumem a forma de flashbacks, Orson Welles, dá a conhecer ao espetador a vida de Kane, bem como a opinião que cada um tem do empresário, considerado por todos um homem solitário, carente e distante.


Citizen Kane (1941), de Orson Welles
A sua infância é simples e modesta, sendo marcada pela decisão da sua mãe para que ficasse à guarda do banqueiro Walter Thatcher (George Coulouris). Esta separação fez com que crescesse revoltado e agressivo, nunca desenvolvendo uma relação próxima com o seu guardião. Mais tarde, através da direção do jornal Inquirer, procura controlar e manipular o ambiente político e social à sua volta, ao mesmo tempo que contraria a vontade de Thatcher. O jornal desenvolve-se e ganha cada vez mais popularidade, tornando Kane num dos homens mais influentes do seu tempo. Jovem, rico, ambicioso, não se submete às normas sociais e considera-se o centro do universo, causando o afastamento de todos aqueles que lhe eram próximos, nomeadamente, o amigo Jedediah Leland (Joseph Cotten), Mr. Bernstein (Everett Sloane), seu assistente e braço direito e Susan Alexander (Dorothy Comingore), a sua segunda mulher.

Ao longo do filme o espetador é convidado a identificar-se com Charles Kane e a sua história. Através dos seus amigos, é revelada a sua morte e o seu passado. Cada um conta a sua versão de um homem obsessivo, que tenta preencher um vazio interior com bens materiais. Um dos exemplos dessa necessidade foi a construção da enorme propriedade Xanadu, que demonstra o poder da sua riqueza. No entanto, é apenas um lugar atormentado pelas trevas, pelo isolamento e solidão vividos, primeiro com Susan e mais tarde, sozinho. O dinheiro não compra tudo, e Kane é o reflexo disso. Dono de uma grande fortuna, nunca foi capaz de amar os outros senão a si próprio.

Citizen Kane (1941), de Orson Welles

“Mr. Kane was a man who got everything he wanted and then lost it. Maybe Rosebud was something he couldn't get, or something he lost. Anyway, it wouldn't have explained anything... I don't think any word can explain a man's life. No, I guess Rosebud is just a... piece in a jigsaw puzzle... a missing piece.”
Citizen Kane (1941), de Orson Welles (Jerry Thompson)

Para Thompson, Rosebud continua a ser um mistério e algo que, mesmo que revelado, não conseguiria representar Charles Kane. No entanto, no final do filme é revelado o seu verdadeiro significado. Rosebud era o nome do trenó com que Kane brincava quando foi separado dos seus pais. Assim, Orson Welles estabelece um paralelo entre a infância, a morte e a forma como nos últimos momentos da sua vida, Kane e até mesmo qualquer pessoa, reflete sobre a vida que deixou para trás e sobre as memórias que leva. Geralmente, as memórias de infância são consideradas as mais felizes, as mais simples e as mais reais.

A história de Kane é marcada pelo sucesso e pelo fracasso, um exemplo perfeito da decadência. De grande empresário e dono de um império de milhões, termina a sua vida sozinho, num castelo inacabado, que embora repleto de esculturas e bens valiosos, expõe o enorme vazio e solidão que vivia. Citizen Kane, mais do que retratar a vida de um empresário rico decadente, retrata uma tragédia causada pelo egoísmo, pela necessidade de controlo e narcisismo.

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Referências:
Bradshaw, Peter (2015). Citizen Kane and the meaningof Rosebud. The Guardian
Ed. Müller, Jürgen (2011). 100 All-Time Favorite Movies of the 20th Century. Taschen

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