quarta-feira, 31 de maio de 2023

“Emoção, Paixão e Sensibilidade no Teatro Camões em Lisboa através da Companhia Portuguesa de Bailado Contemporâneo


Fonte: Fotos da autora tiradas no dia da apresentação.




Georgina Furtado Franca



Oeiras, 04/04/2023




A Companhia Portuguesa de Bailado Contemporâneo apresentou-se em 1 e 2 de Abril no Teatro Camões, em Lisboa, em celebração aos 25 anos da mesma, com quatro números coreográficos de qualidade técnica incontestável. Fundada em 1997 por Vasco Wellenkamp e Graça Barroso, a companhia mantém o seu estilo diversificado, que atualmente sob a direção de Cláudia Sampaio, traz como herança e missão uma linha estética que se atravessa entre o universo onírico e aquele dos desenhos coreográficos dos corpos em movimento. Universo este, que evoca pensamentos e sensações que nos fazem refletir sobre o nosso lugar no mundo e sobre as múltiplas relações que podemos estabelecer uns com os outros.  Como um reinventar constante desse encontro inusitado, mas não menos empolgante, do real com o imaginário, das ações quotidianas e do entrelaçar com as mais profundas substancias do nosso ser, da nossa mente e da nossa alma.

Fonte: Fotos da autora tiradas do programa da apresentação.


O corpo passa a ser um instrumento sensível e de comunicação dos atores-bailarinos, que convida a nós da plateia a construirmos subjetividades dando vida a personagens que em sua grande maioria só existem em nossa imaginação, mas que ao mesmo tempo se comunica com personagens reais que podem estar nas ruas, no bairro, pessoas como nós, com suas dúvidas e anseios, seus desejos e sonhos, seus conflitos e superações, como numa teia da própria vida. Enquanto assistimos ao espetáculo vamos procurando também não nos perder, como quase uma busca pela construção de sentidos. Nada nos parece ou chega a nós como pronto, mas tudo está por vir. Alguns personagens históricos podem surgir como de súbito, de associações feitas até mesmo com partes do cenário, de adereços dos bailarinos-atores, nas vozes que ressoam de microfones ocultos, como se atravessassem de algum sítio, até mesmo das paredes. 

Tudo se relaciona e ao mesmo tempo tudo se dissolve nesta teia de relações e bem como, os sentidos que nós, que assistimos, também construímos. 

Fonte: Fotos da autora tiradas do programa da apresentação


Uma arte democrática que lança como desafio à plateia a sensibilidade e interpretação livre, a leitura das imagens em movimento. A dramaturgia é uma constante busca por afirmação e vai nesse interim também se colocando em causa como se abrissem espaços vazios no texto, para uma comunicação aberta. Somos nós que nesse instante, o público, que do nosso olhar construímos a coreografia e isso não seria possível se não existisse uma fluidez coreográfica de deixar espaços vazios na escrita dos corpos em movimento. Vamos da plateia criando relações com o que vemos e sentimos, preenchendo os espaços coreográficos com sensações nossas e pensamentos que nos conduzem mais a perguntas do que respostas, como se fizéssemos parte juntamente com os artistas de um mesmo processo criativo.

Fonte: Fotos da autora tiradas do programa da apresentação


O primeiro número coreográfico, intitulado “Públic Domain”, coreografia de Ricardo Campos Freire, nos trás a incomunicabilidade do mundo. O cenário formado por cadeiras dispostas ao palco e televisões que nada informam. Estas apenas arranham com sons indecifráveis essa incomunicabilidade. Com uma técnica esplendorosa, os bailarinos nos falam através dos seus corpos sobre algo que de pronto não identificamos, o que nos causa estranhamento e estupor, juntamente com o som irritante da televisão e vozes que ecoam em inglês formando uma confusão de sons que aparenta comandar as ações dos bailarinos. Torna-se difícil perceber o que se passa e o que nós da plateia sentimos. Tudo se mistura e ficamos a nos perguntar: Por que tanto sofrimento? A coreografia parece ter sido feita para provocar, tirar da zona de conforto e nos fazer pensar, fazer-nos viver uma experiência sobre o que sentimos daquilo que em si nem mesmo existe.

O segundo número coreográfico, intitulado “almada E TUDO!”, coreografia de Maria Mira, dá vida no palco de maneira jocosa ao Manifesto Anti-Dantas, de José de Almada Negreiros. O Manifesto Anti-Dantas em 1913 foi uma contestação ao renomado crítico literário Júlio Dantas que se opunha a “Revista Orpheu” lançada em época por Almada Negreiros e seus contemporâneos, artistas vanguardistas, que por sua vez davam a sua resposta às acirradas críticas que receberam por suas ideias e textos irreverentes em prol do modernismo artístico e literários em Portugal. No palco dois dos bailarinos personificam as adversidades de posições entre o academismo literário e o Futurismo e os demais do elenco ilustram a repressão exercida à divulgação dos novos valores.

O terceiro número coreográfico, intitulado “Prelúdio à Sesta de um Fauno ou O Labirinto do Desejo”, de Vasco Wellenkamp, nos sensibiliza ao encontro de dois corpos no palco que revelam a paixão e desejo dos personagens, o Fauno, meio homem e meio animal e a Ninfa personagem dos seus sonhos. A fluidez dos corpos e sintonia dos bailarinos em cena evoca a poesia do amor e nos faz imergir no envolvimento que nasce a cada gesto e expressão dos bailarinos. 

O quarto número coreográfico, intitulado “S-Concerto”, é uma exuberante apresentação, que conjuga de forma harmoniosa a música e a dança em favorecimento a técnica dos bailarinos.

Ao fim do espetáculo de celebração dos 25 anos da Companhia sentimos que como expectadores, fizemos uma imersão no desconhecido, por sermos convidados a vivenciarmos através do nosso olhar uma experiência única através das variadas maneiras que nos foram oferecidas de interpretação. Uma forma diferenciada de contato com a obra artística, que nos permitiu através das nossas vivências e subjetividades, a construir do nosso olhar, das nossas sensações e emoções, a dança.


domingo, 28 de maio de 2023

Adoremos as Marias Cheias de Graça

As Marias Cheias de Graça são um grupo de comédia stand up completamente feminino. É um projeto da Bang Produções que começou em março de 2022 com o objetivo de destacar comediantes portuguesas, já que a comédia stand up é uma indústria maioritariamente masculina. Um espetáculo a não perder para qualquer fã de comédia e não, não é preciso ser-se mulher para apreciar as piadas. Estiveram no Teatro Sá da Bandeira no Porto no dia 18 de março. 


Fonte: Bang Produções

O grupo consiste de seis comediantes: Catarina Dores, Sandrina Rodrigues, Rita Gaspar, Carolina Parreira, Sofia Briz e Mafalda Vicente. Como Mestre de Cerimónias têm a Joana Neves, membro da banda Fora de Série. Já houve alguma mudança nos seus membros, por isso vale sempre a pena voltar a ver o espetáculo, pois o material apresentado difere.

Cada comediante tem apenas o seu género em comum, já que cada uma demonstra um tipo de humor bastante distinto, havendo algo para todos os gostos. O espetáculo é definitivamente para graúdos, já que podemos contar com algum humor negro e muito humor de natureza sexual.

Como em qualquer espetáculo de comédia stand up, o seu sucesso não está apenas dependente dos – neste caso, das – comediantes, mas também do público. O público num espetáculo como este pode fazer uma piada sem graça parecer de génio, assim como pode destruir a mais inteligente das anedotas. No entanto, tivemos sorte. O público era participativo, mas não em demasia e não de maneira ordinária. Podemos adorar as Marias com toda a sua devida graça.

Os tópicos abordados pelas comediantes, como já mencionado, foram variados. No entanto, existiu um em comum: os homens. Realmente, não é o tema mais criativo, aliás, muito do humor feminino depende em criticar o sexo masculino ou peripécias que ocorreram nas chamadas dating apps. Relembra nomes como a americana Ali Wong ou a brasileira Bruna Louise, que muitas vezes recorrem a este tema.

No entanto, mesmo com um tópico que alguns podem considerar já está batido, como as relações de poder e sexuais entre homens e mulheres, continua a ser um tema relevante, já que essas relações ainda não são equilibradas. Qual é a mulher que não se identifica com um encontro com um depravado? Ou ter sido ghosted (ignorada por alguém online) por um homem porque demonstrou um átomo de inteligência? Mas não se preocupem, há piadas para toda a gente de todos os géneros.


Fonte: Band Produções

Estas Marias demonstram também um lado feminino com o qual a sociedade atual ainda tem alguns problemas: mulheres confortáveis com quem são e que não têm medo de falar a verdade, à vontade com os seus corpos e sem medo de serem pouco “femininas”. Muito do humor apresentado vem acompanhado de gestos rudes, power poses e mímicas explícitas, relembrando outra vez a comediante Ali Wong, com as suas expressões faciais fortes e poses desajeitadas.

Sendo ainda nomes pequenos da indústria, é natural que ainda haja momentos de esquecimentos e tropeções, e é nestes momentos em que o público pode ser castigador ou compreensivo. Como mencionado anteriormente, o público estava ali para se divertir e estava de bom humor. Além disso, o à-vontade das comediantes nesses momentos também demonstrou o seu profissionalismo.


Fonte: Bang Produções

A única verdadeira crítica a dar é que a Mestre de Cerimónias às vezes excedia o seu tempo de antena. Às vezes parecia que estávamos a assistir a outro set, em vez de à apresentação da próxima comediante. Deve ser quase irresistível para uma artista que também deseja o seu destaque, mas não se deve tirar o foco das artistas que realmente estão lá para atuar.

O palco já muitos o devem conhecer, mas sente-se a história do teatro à nossa volta, com os seus camarotes vermelhos e estruturas de madeira branca decorada com dourado. Foi até um lugar apropriado para as Marias, já que o espaço era muito utilizado para teatro de revista, especialmente durante o Estado Novo. Não é surpreendente então que também se tenham estreado no Parque Mayer no dia 7 de maio. Deve ter sido uma sensação indescritível para as comediantes trazer de novo a comédia a estes palcos tão históricos.

Em comparação com o seu primeiro espetáculo no Lisboa Comedy Club a 5 de março de 2022, as Marias desenvolveram bastante o seu arsenal e as suas técnicas. Dá para notar uma diferença considerável nas suas atuações. Já não se engasgam tanto e conseguem lidar com o público de maneira mais hábil, além dos seus textos já terem sido desenvolvidos e testados.


Fonte: Bang Produções

É um prazer ver estas artistas a crescerem, e ainda mais satisfatório, como mulher, ver outras mulheres a terem sucesso nesta indústria. É bom também ver que o humor português tem espaço para acolher novos artistas como as Marias Cheias de Graça no stand up português, oferecendo-lhes ajuda para florescerem e um palco onde atuar.

As Marias Cheias de Graça ainda não têm nova data de espetáculo, mas sigam o seu Instagram® para se manterem informados. Certamente teremos mais chances de irmos adorá-las e reforçar a nossa fé na comédia portuguesa.

Marias Cheias de Graça
Instagram: @marias.cheias.de.graca

Bang Produções
Instagram: @bangprod
Website: https://bangproducoes.com/

DÒING! Mas com cuidado, meninos!

Para celebrar os 25 anos da Expo 98, a escola onde trabalho decidiu levar os alunos do 5º e 6º anos ao Pavilhão do Conhecimento. O plano foi visitar o museu todo, mas especialmente a nova Dòing Oficina Aumentada. As crianças adoraram os trinta minutos que lá estiveram, mas como professora fiquei um pouco desapontada com as funcionárias do serviço educativo do museu.

Para quem, como eu, cresceu com a Expo 98, com certeza conhece o Pavilhão do Conhecimento, também conhecido como Centro Ciência Viva, e que o relembram com afeto. É extraordinário como museu, já que foi construído especificamente para crianças. As suas exposições são interativas, informativas e existe algo para todas as idades. Quem não se lembra de rodar manivelas, apertar botões e puxar correntes neste espaço fantástico?


Fonte: autor

Com o intuito de apresentar os nossos alunos a esse espaço, foi marcada uma visita e uma sessão na Dòing Oficina Aumentada, um espaço interativo e criativo mais recente, onde as crianças podem ser inventivas e podem explorar vários conceitos científicos, como a gravidade, a resistência do ar e a eletricidade. O espaço é convidativo, com várias estações de atividades variadas, e as crianças são deixadas à sua mercê para serem livres para fazerem as suas próprias descobertas e para trabalharem em equipa.


Fonte: autor

Existem sete desafios, cinco deles permanentes, e cada um deles apresenta uma atividade interativa. O desafio que chamou a atenção das crianças em primeiro lugar foi, claro, a Estação de Robótica. Ele consiste em uma área dividida em quatro partes, onde as crianças podem controlar dois robôs através de tablets e guiá-los através de obstáculos variados. É divertido, mas rapidamente se cansaram da atividade quando perceberam que não podiam fazer quaisquer mudanças aos labirintos ou mexer nas rampas e árvores feitas de cartão. Mal lhes tocaram, apareceu uma funcionária a exclamar “Não toquem! Não toquem!”. Os alunos mudaram rapidamente de área, mas eu fiquei desapontada. Afinal, o objetivo não é experimentar coisas diferentes?


Fonte: autor

O segundo desafio mais popular foi a Máquina dos Berlindes. Num painel de madeira esburacado as crianças podem utilizar diversos tubos, funis e peças variadas para criar um percurso para um berlinde, trabalhando com conceitos como a gravidade, propulsão e fricção de materiais diferentes como a madeira e o plástico. Os alunos adoraram esta estação e foram realmente livres para criar as suas máquinas. No entanto, houve uma escassez de parafusos para segurar as peças e logo houve alguma fricção entre as crianças. Como o tempo foi escasso, muitas criações ficaram por acabar.


Fonte: autor

Outro desafio muito popular foram os Tubos de Vento, onde as crianças tinham de criar “foguetões” que descolassem nos tubos, trabalhando conceitos como a resistência do ar. Tinham vários materiais à sua disposição e divertiram-se imenso. Exaltavam-se quando as suas máquinas descolavam a toda a velocidade e maravilhavam-se quando rodopiavam no ar. Infelizmente, não havia fita cola suficiente para todos os “foguetões” que foram criados, e as funcionárias do museu pareciam mais preocupadas com arrumar os materiais do que com ajudar as crianças a experimentar coisas diferentes.

Um desafio que me despertou especialmente a atenção foi a das Máquinas de Rabiscos, onde se podia construir robôs cujo objetivo era rabiscar a folha de papel providenciada. Havia exemplos e peças diferentes para utilizar. Notei que os únicos que prevaleceram nesta estação foram os mais interessados em mecânica, pois não havia quaisquer instruções e os alunos tiveram muitas dificuldades. As funcionárias ajudaram um pouco, mas rapidamente os abandonavam. Também não deixavam mexer muito nos exemplos dados, o que poderia ter ajudado a resolver este desafio.


Fonte: autor

Outro desafio muito popular foi o dos Circuitos Elétricos. As crianças têm acesso a vários fios, baterias, campainhas, lâmpadas e buzinas e têm de investigar como é que a eletricidade funciona. Aqui as crianças não precisavam de assistência nenhuma, sendo os circuitos elétricos algo que podem descobrir de maneira intuitiva. Chamavam-me constantemente para me mostrar as suas criações e sorriam radiantes quando finalmente conseguiam acender uma lâmpada.


Fonte: autor

Os últimos dois espaços não foram tão populares. O Maker, um espaço de costura, teve apenas uma aluna como participante. O objetivo era fazer um personagem com tecidos e fios, mas não percebe a sua conexão com ciências. A aluna gostou muito da experiência e mostrou o seu resultado com orgulho. O espaço de Porta-chaves de Robôs não teve qualquer aderente, ou por falta de interesse ou falta de instruções.

O meu grande desgosto foi realmente que as funcionárias do museu que estavam a auxiliar os alunos não pareciam ter paciência para a excitação natural que um grupo de crianças tem quando lhes é dito para experimentarem e fazerem o que quiserem. Fiquei especialmente desapontada com o facto de que não se podiam levar materiais de uma estação para outra, especialmente quando o objetivo do espaço é, de acordo com o seu website, “criar, fazer, experimentar, construir e partilhar, onde tentativa e erro se conjugam de forma divertida e inspiradora” (Pavilhão do Conhecimento, 2023). Como dizia Paulo Freire, “Ninguém nasce feito, é experimentando-nos no mundo que nós nos fazemos” (Freire, 2001, p. 40). Estava à espera de algo mais aberto e com menos regras para encorajar essa experimentação.

São crianças! Queria eu exclamar às funcionárias. Vão desarrumar as coisas, vão querer tocar em tudo, fazer tudo, vão empurrar-se umas às outras, vão tirar materiais umas às outras, vão exaltar-se, vão aborrecer-se, vão cansar-se. Há que lhes dar a liberdade para serem elas mesmas e fazer erros para depois tirarem conclusões e aprenderem de maneira significativa.

Infelizmente, esta atitude dos funcionários dos serviços educativos não é rara. Foi a mesma situação quando se visitou o Museu Bordalo Pinheiro, onde a funcionária demonstrou pouca paciência para com os alunos. No entanto, já tive muitas experiências positivas, como no Centro de Interpretação da Batalha de Aljubarrota e no Palácio Nacional de Mafra, onde era óbvio o entusiasmo dos nossos guias. A melhor visita foi no Museu da Farmácia em Lisboa, onde o nosso guia tinha muitas estratégias de gestão de comportamento, identificando imediatamente os alunos mais problemáticos e dando-lhes tarefas para os ocupar.

Acredito que os serviços educativos têm de ser compostos, não só por especialistas nos assuntos do museu, mas também que saibam lidar com crianças e tenham a paciência e o entusiasmo necessários para despertar o seu interesse e aumentar a sua curiosidade. Temos necessidade de profissionais treinados em educação, não só em museologia, e atividades que mantenham os alunos entretidos ao mesmo tempo que ajudem a reter a informação oferecida. Claro que alguma dessa responsabilidade também pertence aos professores, mas sinto uma relutância e falta de paciência para com os visitantes entre os 10 e 14 anos de idade por parte dos funcionários.

No entanto, ao perguntar aos meus alunos se tinham gostado das atividades e das funcionárias, responderam logo que a experiência tinha sido muito positiva. A minha última crítica é que trinta minutos é uma duração muito curta para poderem explorar cada área a fundo, mas com certeza será muito apreciada por qualquer criança. É um espaço que estimula a curiosidade e o pensamento crítico, algo essencial e que parece estar em falta em muitas das crianças com as quais lido. Vale muito a pena marcar uma visita.


Dòing Oficina Aumentada
Necessita de marcação prévia.

Reservas: Telefone: (+351) 21 891 71 04 (chamada para a rede fixa nacional) - de segunda a sexta-feira das 9.30 às 18.30

Localização: Pavilhão do Conhecimento - Centro Ciência Viva, Largo José Mariano Gago, nº1 Parque das Nações 1990-073 Lisboa

Horários: De segunda a sexta-feira: das 10.00 às 18.00 (última entrada: 17.30; 16.30 para os grupos) | Fins-de-semana e feriados: das 10.00 às 19.00 (última entrada 18.30)

Preçário: Adulto - € 11 | Criança até 2 anos - GRÁTIS | Criança 3-11 anos (1) - € 8 | Jovens 12-17 anos (1) - € 9 | Sénior + 65 anos - € 8 | Bilhete família (família nuclear: 2 adultos com filhos até 17 anos) - € 28


Bibliografia

Pavilhão do Conhecimento. (2023). Dòing Oficina Aumentada. Recuperado a maio 28, 2023, de https://www.pavconhecimento.pt/

Freire, P. (2001). Política e Educação: ensaios (5th ed.). Cortez. https://drive.google.com/file/d/0B3GQrRvm4KXOSjctdkxnUHo1dTQ/view?resourcekey=0-7Y8K9Fz8ywkIRROAo0rJKg

terça-feira, 23 de maio de 2023

Vejamos Bem "O Anúncio" de José Cardoso

 “Vejam bem, que não há só gaivotas em terra,

Quando um Homem se põem a pensar…”

José Afonso

 


A obra que pretendo analisar encontra-se dividida em 2 momentos. Inicialmente temos o o filme do realizador luso-moçambicano José Cardoso (Beira, 1930 - 2013) “O Anúncio”. Realizado em 1966 na Beira, Moçambique, é o primeiro filme de ficção do realizador, em formato de curta-metragem. O filme retrata um dia na vida do protagonista (interpretado pelo próprio José Cardoso) onde o mesmo, vivendo numa situação precária, procura trabalho em vão, nos anúncios do jornal local ou nas obras da cidade. Eventualmente a personagem é levada para para um evento carnavalesco, onde rouba dois ovos cozidos para comer. Acaba adormecendo no local, sendo mais tarde acordado por uma tempestade e regressa de novo para a rua. 

O segundo momento da obra é o tema musical que a acompanha, “Vejam Bem” de José Afonso (Aveiro, 1929 - 1987). O tema musical embora tenha sido escrito para o contexto do filme, não estava incluído na primeira versão, tendo sido adotado em 1968, ano em que a música foi escrita. O tema pertence ao álbum Cantares de Andarilho (1968), tendo lugar na faixa número onze do mesmo. 

A divisão desta analise é proposta pelo facto de ambas as obras viveram, independentes e dependes uma da outra. O filme, feito dois anos mais cedo foi feito sem a existência da obra musical de José Afonso. A música existindo como colaboração entre os dois artistas, possui uma vida muito além do filme. Sendo até, a participação da música nesta curta-metragem, pouco conhecida por muitos.


Pretende-se assim inicialmente, rever os dois momentos (filme e tema musical) num contexto separado fazendo uma breve análise de cada, terminando a mesma com uma interpretação da obra num todo. Esta recensão tem como objectivo apresentar a força visual da música e letra de José Afonso, representada também ela no filme. O desafio de observação social que tanto a música como o filme nos impõem.


Difícil começar a análise do filme sem logo referenciar as semelhanças do mesmo com o movimento cinematográfico italiano neo-realista. A representação social, representação do cotidiano, a falta de conclusão, sem final (feliz ou mau) na expressão máxima do neo-realismo italiano, leva-me com rapidez ao “O ladrão de bicicletas” (1948) de Vittorio De Sica. Um trabalhador que vive (ou mesmo sobrevive) de uma bicicleta para trabalhar, a mesma que lhe é roubada e o mesmo encontra-se numa aventura (sem solução) para reaver um objecto que define a sua possibilidade de sobreviver. Em “O Anúncio”, José Cardoso encontra-se já em numa situação de desemprego, num desespero e desconforto social, sentido por muitos cidadãos moçambicanos numa altura de opressão política que o realizador tenta representar. O cariz social é directo, um cidadão que representa a luta de muitos outros. Uma imagem filmada a preto e branco num tom mexido e algo caótico que se identifica com o sentimento e ambiente sentidos e desejados pelo realizador.” (Vieira, 2022). 






Como muitas outras obras de José Afonso as nuances aos problemas sociais vividos em Portugal são constantes. São feitas referencias à PIDE e a acções de clandestinidade. A “estátua” referida no texto desta música, é um dos exemplos destas subtis referencias impostas pelo autor, que sugere a tortura usada pela PIDE sobre os prisioneiros políticos, ou os “caminhos de pão”, indicando aqui os desejos de distribuição igual de bens. As “gaivotas em terra” expressão comum usada para se referir à chegada de uma tempestade, José Afonso, com bastante clareza, desafia o ouvinte a perceber que o acção do pensamento é o primeiro passo para uma mudança social, a emancipação do povo, pensador e crítico, que observa e reflecte sobre o que vê. Esta música, que se torna uma das mais emblemáticas do autor, marca uma das épocas mais políticas e interventivas de José Afonso.




O início do filme tem um carácter quase ilustrativo da música. Vendo que o filme se antecede ao tema percebe-se que José Afonso tira parte da sua inspiração da curta-metragem. Sendo um referente aos problemas sociais da época em Moçambique (“O Anúncio”, José Cardoso) e o outro de Portugal (“Vejam Bem”, José Afonso) as posições de cada artista eram próximas principalmente no que tocava à guerra colonial e à interferência de Portugal nas colónias africanas. “ (…) a transformação política do regime encontra fortes resistências à sua concretização, nomeadamente em relação à guerra colonial e à acção da polícia política (PIDE).” (Simões, 2017)





A música, acompanhando o início do filme, dá-nos o mote para o que viremos a ver. Interessante o facto de a curta ser toda ela muda com os únicos momentos em que ouvimos alguém falar é através do canto de José Afonso. A história está contada, Um homem que dorme ao relento na areia, num dia de tempestades (gaivotas em terra) desespera por trabalho para se alimentar (desbravando os caminhos do pão). José Afonso vai mais longe que o filme, e desafia o homem, e o espectador/ouvinte, a pensar a reflectir, ao contrario do que o protagonista do filme faz que se perde no ócio da noite carnavalesca para se ver novamente no mesmo lugar. 



Termina o filme, num final digno do neo-realismo italiano, com um andar, um futuro incerto deixando o espectador na incerteza sobre o resto da vida do protagonista, mas sobre este final incerto, regressa José Afonso desafiando novamente o espectador/ouvinte a “ver” não o filme mas o que há para lá do mesmo. As problemáticas sociais da época, do contemporâneo que ainda hoje se pode assistir e ouvir na actualidade da sua voz.


Lista de referencias bibliográficas: 


Obras Artísticas:

  • Afonso, J. (1968). Vejam Bem (Música). Cantares de Andarilho. Orfeu
  • Cardoso, J. (Realizador). (1966). O Anúncio (Filme). Beira-64

A Graça Monumental no Jardim Vizinho – Um Bom Retiro Para Manolo Quejido

Por entre árvores e relvados, fontes e lagos, no coração da capital espanhola, Madrid, está guardado o Parque del Buen Retiro, abrangendo cerca de 125 hectares, contendo num espaço aberto e verde, diversos monumentos e pontos de interesse. Originalmente edificado na primeira metade do séc. XVII, como um jardim real que cercava o Palácio del Buen Retiro, destinado ao rei Felipe IV (1605-1665), foi aberto ao público para fins recreativos em 1767, graças ao rei Carlos III (1716-1788) e mais tarde, em 1868, foi definido como parque público, passando a posse do grande jardim, para a Câmara Municipal de Madrid. Em certos momentos, as vistas do parque, relembram cenas das pinturas de Seurat, relvados inclinados á beira lago, onde as pessoas descansam e convivem, como em “Un dimanche après-midi à la Grande Jatte”. O aspeto atual do parque, é o resultado de um conjunto de alterações e renovações ao longos dos anos, onde se destacam as intervenções em resposta à destruição, após a Guerra da Independência (1808-1814). O parque, é casa a diversos monumentos, como o brilhante Palácio de Cristal, o Monumento a Afonso XII, junto da Lagoa Grande onde os turistas andam de barco, o Palácio de Velázquez, o Observatório Astronómico Real, bem como a Fonte do Anjo Caído e tantas outras esculturas, onde se destaca o Paseo de la Argentina, que glorifica um conjunto monárquico de 13 reis espanhóis. De entre tanta beleza histórica, de um ecleticismo imenso, aqui se realça o Palácio de Velázquez, por ser um centro designado às artes visuais, situado no centro do parque, dedicado a exposições contemporâneas temporárias, administradas pelo Museo Nacional Centro de Arte Reina Sofía.






Originalmente Palácio de la Minería, foi construído entre 1881-83, para a Exposición Nacional de Minería, pelo arquiteto Ricardo Velázquez Bosco - o qual deu posteriormente nome ao Palácio, não Diego Velázquez - juntamente com o engenheiro Alberto Palacio e o ceramista Daniel Zuloaga, para comemorar os avanços e conquistas nas áreas da mineração, metalurgia, cerâmica, fabricação de vidro e indústrias de água mineral. Com dimensões de 73,80 m por 28,75 m, sua arquitetura é emblemática da era, num estilo neoclássico, de rigidez monumental, coberto por tijolo vermelho e amarelo, bem como azulejos, da Real Fábrica de La Moncloa, com motivos geométricos, vegetalistas e animalistas, de tons laranja, azul e branco. A cobertura do palácio, é feita com abóbadas de ferro e vidro, de modo a iluminar naturalmente o espaço interior. A fachada principal é marcada por uma arcada, com pilares com capiteis de inspiração coríntia, arcos de volta perfeita e duas estátuas imponentes de leões alados, erguidas no topo das escadas, que dão entrada ao palácio. A ordem e o virtuosismo convocados através da monumentalidade, contrastam com os motivos figurativos e cor dos azulejos, destacando o edifício, entre todos os outros museus de Madrid, não atingindo a brutalidade nem frieza do Museu do Prado, preferindo manter a gramática formal, casada com um espírito mais alegre, graças à azulejaria floreada e o tijolo bicolor, com traços de Arte Nova, unidos às cores e motivos da azulejaria hispano-muçulmana.






No interior permanece um espaço museológico, em estilo White Cube, onde a luz do sol ilumina uma ampla ala central, através de uma claraboia em ferro fundido e vidro fusco, coberta nas laterais por aço em chapa, deixando apenas uma fileira horizontal em vidro, que acompanha a sala principal. Tendo em conta as inovações de François Joseph Belanger (1744-1818), é uma abóbada modesta, especialmente quando está erguida tão perto do Palácio de Cristal, que demonstra uma mestria da arquitetura do ferro e do vidro. A essência original do Palácio permanece sensivelmente a mesma, apesar da reconstrução após destruição parcial, causada por um furacão em 1886-88.  A alma do palácio está adaptada à sociedade industrializada da era: os pavilhões relembram a arquitetura das gares, com pilares delgados de aço, de capiteis jónicos, com arcadas de aço e vidro, em arcos abaulados, com motivos vegetalistas discretos e medalhões. A planta retangular do palácio, salienta a geometria e simetria neoclássica, dividida conforme a exposição em vigor – geralmente um grande espaço aberto, com uma sala principal e duas adjacentes, juntamente com duas naves laterias menos iluminadas. É um museu relativamente pequeno, face ao espólio madrileno, contudo é uma visita bem-vinda, de entrada gratuita, inserida no grande espaço do parque, facilmente visitável, após um passeio tranquilo numa tarde soalheira. A qualidade da exposição é obviamente variável, pelo que a experiência deste espaço, está diretamente influenciada pela dimensão e excelência daquilo que é exposto – neste contexto, considere-se que o espaço estava corretamente aproveitado, face à exposição em vigor.






Decorreu de 21 de outubro de 2022 a 16 de maio de 2023, a exposição Distancia Sin Medida, que relembra a carreira do pintor sevilhano, Manolo Quejido (1946). Trata-se de uma retrospetiva da obra multifacetada do artista espanhol, pertencente à Nueva Figuración Madrileña, que captura aspetos do expressionismo, surrealismo, pop-art, experimentando com mensagens políticas (Faixa de Gaza), figuração vibrantemente colorida e abstrações geométricas. De entre tantas pinturas, destaca-se as seguintes: La Pintura (2002) um quadro que brinca com a ideia de pintura, enquanto algo que reproduz mas também representa, representar emoção e reproduzir emoção, ao mostrar o pintor no ato de pintar, como se a tela pintada fosse a tela real, perto da modelo em pose, que é simultaneamente a modelo na tela pintada e figurante na pintura real; Sin Consumar (1997-99), uma obra de acrílico sobre várias placas de alumínio, que  reflete sobre a sociedade do consumismo, numa euforia de cores chamativas e elementos atraentes, que remetem para alimentos, marcas, produtos e letras; Sin Nombre nº84: Psiquiátrico (1998), uma tela de um amarelo berrante que mostra uma sala de espera de um consultório, onde uma figura solitária permanece, com a companhia única de si própria, rodeada de tantas cadeiras vazias, suscitando questões de “Quem é aquela pessoa? Porque está ali?”, onde o espaço relembra a fixação amarelada de Van Gogh, evocando o tema das doenças mentais, corroborado pelo título da obra. A exposição, reflete tantos aspetos da pintura moderna, que atrai apreciadores distintos, nunca desapontando, pela qualidade do artista e pela sua obra variada, mas focada em momentos muito únicos divididos corretamente pelos espaços do pavilhão, como momentos quotidianos, com várias figuras simplificadas num espaço natural, relembrando os temas de Paul Gauguin, ou momentos em que retrata máquinas de escrever num tom solto e expressivo, deixando ainda espaço para um conjunto de impressões que remetem para M.C. Escher e/ou os testes de Rorschach.





Um jardim adorado pelos locais, com música ao vivo e cafés para conviver e comer, dezenas de monumentos para observar e visitar, locais recatados para descansar à sombra, longe da cacofonia metropolitana. Para o turista mais atento, que encontra o Palácio de Velázquez, é gratificante a visita gratuita, a um espólio de uma enorme energia pitoresca, num espaço histórico, eclético, amplo e livre. O interior deste palácio feito galeria, é espaçoso o suficiente para apreciar calmamente as obras, sem pressa, longe dos grandes museus e o seu caos habitual. Diga-se, que neste grande jardim, por entre esculturas e monumentos, pombos e patos, no meio de lagos e fontes, no Palácio de Velázquez, a obra de Manolo Quejido, encontrou um bom retiro.


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AGENCIA EFE (2022), La exposición "Distancia sin medida" retrata el sentir del pintor Manolo Quejido

https://www.youtube.com/watch?v=wS2gSaooBIQ


Palácio de Velázquez

https://www.esmadrid.com/pt/informacao-turistica/palacio-de-velazquez


Wikipédia (2023), Palácio de Velázquez

https://en.wikipedia.org/wiki/Palacio_de_Vel%C3%A1zquez


terça-feira, 16 de maio de 2023

A Imortalidade da Arte

A Morte do Corvo

Edgar A. Poe

Crédito: Arlindo Camacho



Espetáculo Imersivo - Teatro
Período: 13 de janeiro a 30 de julho de 2023
Horário: quarta a sábado 21h; domingo:17h
Local: Antigo Hospital Militar da Estrela
Morada: Morada: R. Santo António à Estrela 29 A, 1350-291 Lisboa
Valor: Entre 38€ a 60€
Duração do espetáculo 100 minutos
Maiores de 18 anos


Ficha Técnica: Nuno Moreira, ideia e direção artística; Ana Padrão, encenação; Bruno Rodrigues, direção de coreografia; Bruno Rodrigues, Celso Pedro, Ema Fonseca,Emanuel Arada; Gabriel Delfino Marques, Henrique Gomes; Leonardo Dias, lia Goulart, Mariana Fonseca, Patricia Borralho, Pedro Nuno, Rebeca Cunha Sérgio Diogo Matias e Soraia Sousa, interpretação


Espaço Cénico | Rui Francisco e Susana Fonseca
Criação musical | Jorge queijo
Design de Figurinos | Miss Suzie
Desenho de Luz | João Cachulo
Sistema de Som | João Maya
Maquilhagem e Cabelos| Ana Lorena, Ana Ferreira
Fotografias | Arlindo Camacho
Design e Ilustração | José Costa e Pedro Naves
Realização e Montagem dos trailers | Santa Rita filmes: Patricia Sequeira 
Direção de Fotografia | João Souza
Correção de Cor | Marco Amaral
Direção de Cena | Diogo Chamorra, Gabriel Lapas, Luisa Pereira
Operadores Multimédia | Francisco Ramos, Matilde Sardo
Assistentes de Figurinos | Carolina Fadigas e Nuno Gonçalves



A Peça Imersiva | House of Neverless

O antigo Hospital Militar da Estrela com três pisos e mais de 20 salas foi transformado numa Sociedade Secreta, a Ordem dos Corvos, a decoração cenográfica e a micro adereçagem criam a sensação de sermos transportados para os loucos anos 20.

O set não tem palco, o espaço é todo ele um palco em que o espetador partilha o mesmo pódio que os atores, circulando ambos em pé de igualdade por todo o espaço cénico.

Não há diálogo e a interpretação física substitui as palavras. O espectador encontra-se perante várias cenas em simultâneo, que por vezes se cruzam, escolhe o nível de proximidade que deseja dos atores e pode escolher também seguir, ao longo do enredo, a personagem que quiser. É parte da história. O espaço, com as suas passagens secretas, torna-se parte intrigante da experiência carregada de emoção, segredos e erotismo.


Sinopse 
 
A trama dramática passa-se em Lisboa no ano de 1924. A funerária Nevermore, esconde no andar de cima uma sociedade secreta, A Ordem dos Corvos, que procura o segredo da vida para além da morte.
Fernando Pessoa, membro da Ordem, encontra-se a traduzir o poema “ The Raven” de Poe.

Os dois poetas, Fernando Pessoa e Edgar Allan Poe, nutrem um misto de admiração e inveja um pelo outro.

A Ordem é liderada por Edgar Allan Poe, que movido por uma incontrolável inveja da genialidade de Fernando Pessoa arquiteta uma forma de o matar, manipulando todos à sua volta.

Os membros da Ordem são convidados a passar por um ritual iniciático que envolve uma comunhão com as forças da natureza, depois deverão assinar um contrato que implica a entrega póstuma do seu corpo para experiências de reanimação.

Pessoa, convida o seu grande amigo Mário de Sá-Carneiro, para o ritual de iniciação para entrar na Ordem.

Sucedem vários acontecimentos que desencadeiam em Pessoa um ciclo depressivo: A rejeição de Ofélia, o suicídio de Mário e também o descrédito em si próprio. Ciclo este que termina, para si, da pior forma. Termina com o funeral de um dos maiores poetas de sempre.


A Organização do Edifício d'A Morte do Corvo 

Piso 0: Funerária Nevermore
Simboliza a Morte, com tons mais escuros, entre o roxo e o negro. Aqui podem encontrar o Escritório de Poe, a Ervanária e o Quarto de Pessoa e Ofélia.

Piso 1: Ordem dos Corvos
Celebra a vida, e a cor dos corredores abre para encarnados.
É onde está o Quarto de Mário e Hélène, a Floresta Iniciática e o cabaret burlesco, The Green Fairy.

Piso 2: L'Opium
Remete para o sublime, marcado pelo azul celeste. 

Os Residentes de Nevermore:

Edgar Allan Poe
Diretor da Agência Funerária e líder da Ordem dos Corvos, em Lisboa.
Vasco, o Barman
Trabalha no The Green Fairy e fará tudo para ser promovido.
Celeste
A Ervanária, cunhada de Poe. Envenenou o marido, Poe ajudo-a a fugir e agora exige a sua lealdade.
Leonore
A mulher morta de Poe, que ele pretende trazer de volta, contrariando as leis da Ordem.
O Agente Funerário
Trabalha para Poe, mas planeia roubar-lhe o negócio.


Os Convidados de Nevermore:

 Fernando Pessoa
Casado com Ofélia. Está a traduzir o poema “ The Raven” de Poe e convida Mário para entrar na Ordem.
Mário de Sá-Carneiro
O poeta, que convidado por Pessoa, vai ser iniciado na Ordem dos Corvos.
Ofélia
É levada a desconfiar que o marido Pessoa, e Mário possam ser mais do que amigos.
Hélène
A amante Parisiense de Mário. O seu sonho é trabalhar nos Ziegfeld Follies. Poe ajuda-a em troca de favores.



A Performance | Bruno Rodrigues interpretando Mário de Sá-Carneiro


O desespero de Mário
Crédito: Arlindo Camacho



Bruno Rodrigues interpreta a personagem de Mário de Sá-Carneiro.

Manipulados por Allan Poe, são vários os que conspiram para o “fim” de Mário: A Ervanária, que o droga antes do ritual Iniciático e lhe oferece estricnina, através de um balde lançado por uma corda.

Ofélia, que o humilha no jogo de xadrez, revelando que sabe do seu fetiche por cavalos. E o Barman, que se veste com a gabardine e o chapéu de Pessoa, somente para o provocar e rejeitar de seguida.

Numa performance de teatro físico de extrema beleza e sensibilidade, narrando únicamente com o corpo, o ator traduz emoções e sentimentos que nos fazem crer que a narrativa vale cada segundo. Determinado, intenso, dramático, violento, desesperado, explorando os limites da expressividade física na recriação da morte e do desespero. Na tensão que coloca nos gestos, no sofrimento que traduz a sua respiração na violência das quedas e do confronto com o espaço e na exploração dos limites da proximidade física com Hélène.

Convincente e intenso nas cenas de diálogo corporal com o barman. Parece tão autêntico que se entranha em nós e nos arrepia e nos cansa, nos faz suspirar e necessitar de desviar o olhar para recuperar o fôlego. A despreocupação do espaço pessoal e a proximidade física com os visitantes aumenta a estranheza da partilha nas cenas mais intensas e mais dolorosas de tão verdadeiras que parecem.


A capacidade de nos fazer imergir numa realidade ficcionada provocando emoção suscita a nossa imaginação e convoca-nos para o universo da fantasia e leva-nos para os enredos e tramas, convida-nos a espreitar os seus segredos e fetiches e devolve-nos o peso da sua angústia e da sua dor. Todo o seu corpo comunica. O Cheiro dos espaços, a cenografia e os desenhos de luz convocam igualmente a nossa imaginação.

Os Amantes ( Hélène e Mário) discutem violentemente.

Crédito: Arlindo Camacho


Vasco, o Barman veste-se de Pessoa e rouba o anel da Ordem a Mário

Crédito: Arlindo Camacho





Trailer:

Outros espetáculos imersivos: Punchdrunk`s Sleep No More