sábado, 17 de maio de 2025

Casa-Museu Leal Da Câmara a Casa dos Corações Coroados

 
Sintra… “O Monte da Lua”, um lugar Mágico, cheio de Lendas, Histórias, de uma Beleza Romântica e de Amores vividos. Um conselho com um Património Cultural rico: Museus, Palácios, Castelos, Quintas, Casas Senhoriais e Casas Saloias. A Arte nasce debaixo das pedras, dentro dos bosques e surge do nevoeiro das Ninfas. Atualmente pode-se usufruir de diversos Museus gratuitos, Companhias de Teatro, Bibliotecas e Ateliers. São muitos os artistas que escolhem este conselho para viver e nascer. Quantos músicos, atores, cantores, escultores, escritores e pintores são conhecidos dos nossos ecrãs.  Em Sintra podemos encontrar uma das Casas-Museus mais antigas de Portugal, a Casa-Museu Leal da Câmara. 
Decidimos, desta vez, escolher a Residência tardia de um artista reconhecido internacionalmente e em Portugal, no início do séc. XX, pela sua irreverência inconveniente, mas que a tornou no seu Canto de Amor. Viajando pela IC19 em direção a Sintra, desviamos para a localidade de Rio de Mouro, e vamos ter a um local Saloio de nome Rinchôa, encontrando “O velho casal saloio…não muito distante do largo da Feira das Mercês e tendo no seu horizonte, a emoldurá-la, a serra de Sintra, passa para o domínio de Leal da Câmara no ano de 1923. Aqui residirá o artista e a sua mulher desde 1930 até à altura das suas mortes, respetivamente em 1948 e 1965.”  

Folheando as páginas do tempo, até ao séc. XVIII, verificamos que esta Casa Saloia tinha outrora a função de “Entreposto” de muda de cavalos, de Sebastião José Carvalho e Melo, Marques de Pombal. Esta situa-se entre a Quinta da Granja do Marquês (Terrugem, Sintra) e o Palácio de Oeiras, passando pela Quinta do Bosque que em 1780 se junta à Quinta de São Bento. No séc. XIX, foi um Hospital de campanha das tropas portuguesas durante as invasões francesas.  
  Símbolo do Marquês de Pombal    


Quando estamos perante a parte lateral e da frente da Casa-Museu, podemos dizer que tem uma boa leitura informativa para a estrada estreita, antiga e com muito transito. Encontra-se num cruzamento apertado com estradas estreitas, mas com estacionamentos.

Chegamos à porta da entrada, e deparamo-nos com um pátio-jardim de uma beleza calma, romântico, muito bem cuidado, e imaginando os belos fins de tarde sentados nos verdes bancos do jardim. Olhando em volta, podemos observar dois símbolos pessoais criados por Leal da Câmara: um Coração grande e escrito sobre uma das portas principais e um Brasão com dois Corações Coroados sobre a porta de saída. Com quarenta anos, Leal da Câmara, encontra o amor da sua vida e casa em 1920 com Dª Júlia de Azevedo(20 anos mais nova). Adquire a casa Saloia na Rinchôa, restrutura para residência e cria o seu ateliê tornando-a no seu Canto de Amor, “Corações Coroados”, símbolos criados e deixados por tão grande amor que nutria pela sua esposa.                                                                                                                                                          



   





 Entramos no segundo Alpendre, bem pequeno, convidados a tocar à campainha. A porta abre, somos bem recebidos e atendidos por uma senhora que é uma das guias do Museu.  Assim que se entra na Casa-Museu acendem-se as luzes e, por encanto, encontramo-nos numa sala confortável, acolhedora cheia de fotos, quadros, móveis e uma pequena receção com muita informação.          


 


 
                                                                                                                   













Deparam
o-nos com a fotografia de Leal da Câmara, que nos recebe, com um sorriso desafiador e que nos fixa com os seus olhos grandes e argutos.  De Nome, Tomás Júlio Leal da Câmara, nasce em Pangin (Nova Goa), a 30 de novembro de 1876. O Pai, Oficial do Exército, de nome Eduardo Inácio da Câmara e descendente de um dos bravos de Mindelo. A mãe, Emília Augusta Leal, pertencente a uma das famílias de maior prestígio, residente na India Portuguesa. Leal da Câmara teve uma educação calma, mas desde cedo apresentou uma irreverente personalidade, e desde os 11 anos que gostava de desenhar. O pai decidiu o melhor caminho para ele, estudar agronomia e veterinária. O pai morre cedo, Leal da Câmara, deixa de estudar e troca tudo pela profissão de jornalista, a qual ele sempre a desejou. Com a sua personalidade critica e humorística do desenho caricatural, ele vai andar entre Portugal, Espanha e França.  Foi o Mestre Leal da Câmara que inaugurou, a 16 de setembro de 1945, o seu Ateliê-Museu ao público e a todos os que estivessem interessados no contacto e o intercâmbio de ideias com o mundo exterior, a qual foi a primeira “tentativa de musealização”. Em 1965, depois da sua morte, é incorporada no património da Câmara Municipal de Sintra. Dª. Júlia trata de tudo, este projeto sempre foi dos dois. A Casa-Museu vai sofrendo várias alterações ao longo de todo estes anos, mas sempre sem descaracterizar o que resta da traça original.

                                                           

Em frente à receção abre–se uma sala de jantar encantadora, pronta para iniciar uma refeição. Todos os móveis foram criados pelo artista, tendo em particular as dobradiças das portas em forma de corações. No teto encontra-se um friso com a temática dos “saloios”, também da sua autoria. Vemos algumas peças do Bordalo Pinheiro, o qual, era um grande amigo da família. Do lado esquerdo, um móvel de canto, repleto de livros e objetos com a parede decorada de desenhos, caricaturas e até um gesso com o rosto do Eça de Queiroz.  Mas, o mais interessante é o “EX LIBRIS”, o qual era colocado nos seus artigos dos jornais, trabalhos e é o logótipo da Casa-Museu. Da sua autoria, este pequeno “diabinho”, é um autorretrato em caricatura: Eu sou um Diabinho Bobo, com uns olhos bem grandes e redondos, muito atentos ao meu redor e aos quais não escapa nada. A minha barriga é grande porque está cheia de informação, perpicaz e com um humor acutilante, coloco a cauda entre as pernas. Estou sempre pronto com a minha caneta de dois aparos, para escrever e desenhar com uma atitude mordaz. 
A segunda sala, é uma marquise comprida e estreita como um corredor que vai dar acesso ao espaço íntimo do casal( o qual está fechado, e é a casa da cuidadora da Dª. Júlia. Foi para esta casa com 20 anos e agora tem 90 anos.)  Esta, está toda forrada por azulejos pintados pelo Mestre. Ao fundo, do lado esquerdo, um magnifico móvel, da sua autoria, com as dobradiças em forma de corações. As paredes estão cheias com as pinturas de Leal da Câmara. Na parede, em frente às janelas, encontramos várias vitrines onde guardam algum espólio da esposa de Leal da Câmara, como: objetos pessoais, Certificados, Diplomas de Mérito, medalhas e condecorações relacionados com o seu trabalho interventivo de ajuda e de apoio na sociedade da época. Dª. Júlia era uma mulher muito ativa e professora primária.                   

                                                                                                     
O terceiro espaço, é a "Sala de Convivio"  do casal, muito agradável, acolhedora e decorada com muito bom gosto e móveis da autoria do Leal da Câmara. No centro da sala, no canto esquerdo, encontra-se um recanto, vermelho morango, com dois sofás da mesma cor de autoria do artista, e quando juntos formam um coração. Esta sala está preenchida de quadros, desenhos, pinturas, objetos da sua autoria e também da autoria dos seus amigos. Em frente, uma grande lareira da época do Marques de Pombal. Sobre o arco da lareira uma caricatura de Leal da Câmara representada num azulejo. Pendurada na parede da lareira, uma tapeçaria bordada pela Dª. Júlia, decorada com desenhos de “saloios”. Na base da lareira encontra-se o símbolo da rosa, do Marquês de Pombal.                                         
                                

Quando se sai da Sala, entramos no quarto espaço: abre-se uma sala enorme onde se encontra exposto parte do espólio de objetos de família, pinturas, desenhos, caricaturas, jornais, postais, fotografias, Certificados, Diplomas de Leal da Câmara. A Exposição museológica está organizada cronologicamente por idade, por temas e pelo percurso de vida do Mestre. Família, Caricaturas do rei D. Carlos, Monarquia Espanhola, França, Républica Francesa e Portuguesa, 1º Guerra Mundial, 2º Guerra Mundial e personalidades e amigos. Está dividida por oito espaços de exposição com placares de madeira, e por um corredor central denominado o“Caminho da Aprendizagem”. As obras estão expostas em placares de madeira separados e, placares em forma de vitrines para os objetos ou desenhos. A maior parte das obras encontram-se emolduradas com vidro e/ou protegidas pelos vidros das vitrines. A iluminação da sala é boa, mas um ponto fraco que encontramos são os vidros, não são antirreflexos, dificultando a leitura das obras. No oitavo espaço expõem semanalmente uma obra em contato com o público. O circuito da visita ao museu é fácil, organizado e bem planeado.  Encostado à parede, das janelas, encontram-se diversas vitrines expondo todas a edições de livros, catálogos, postais, folhetos, desdobráveis que a Câmara de Sintra publicou, ao longo dos anos, sobre o artista Leal da Câmara e a Casa-Museu.


Caminho da Aprendizagem
Desenhos com 11 anos



Esbosço da planta da sala de exposição realizado durante a visita.

Por último, descemos umas escadas de madeira que nos vão levar à cave, um espaço com as mesmas dimensões do R/C, e com diversas janelas. No início encontramos a "Sala de Palestras e Conferências". No lado direito encontramos o "Espaço das atividades Educativas" para crianças e jovens, e onde se encontra a Exposição Temporária. Em frente encontramos uma sala mais pequena, a qual, é o ateliê do artista. Na entrada do ateliê está exposta a última tela, iniciada e inacabada, do Leal da Câmara, sobre a feira das mercês. Encontramos ainda, autorretratos, caricaturas e retratos que lhe ofereceram. A secretária onde trabalhava e dava as suas aulas, contêm ainda o material e objetos de desenho, expostos.  As paredes são corridas com vitrines expondo: tintas, pincéis, lápis, canetas, diários gráficos, instrumentos auxiliares para desenho e trabalhos artesanais, réguas, esquadros que ele utilizava para dar as suas aulas. Quando abrimos a única porta desta sala entramos para um lindo e enorme jardim, muito bem cuidado e conservado, com um recanto construído com uma mesa e bancos de pedra. Um lugar que deve guardar em si os sons dos diversos lanches e conversas que o artista e a sua esposa devem ter organizado, para os amigos.

 
A organização museológica, a curadoria e Serviço Educativo dos Museus Municipais pertencem à Câmara Municipal de Sintra. Todo o espólio e a Casa-Museu encontra-se muito bem conservada e cuidada. Apresentam diversos desumidificadores, aquecimentos e a iluminação só é acesa quando necessário. As visitas são guiadas, e muito bem acompanhadas com a simpatia, disponibilidade e conhecimento das guias. Apresentam ainda visitas guiadas para estrangeiros, com auscultadores para tradução imediata, e muito bem assinaladas. As escolas podem marcar visitas de estudo, as quais são gratuitas. Oferecem um catálogo desdobrável de 16 páginas, com fotografias diversas e informação escrita. O design gráfico é muito bonito, com uma excelente impressão de imagens num papel de muito boa qualidade. Foi uma visita, com uma experiência enriquecedora ao nível histórico da Casa-Museu e de todo o seu espólio gráfico de caricaturas, um desenhador exímio. 
A Casa-Museu Leal da Câmara, é uma visita ao sonho de um artista português, o sonho de dar a conhecer a arte portuguesa, a caricatura e a Educação  Artística, com a possibilidade de a fazer  gratuitamente.