segunda-feira, 19 de maio de 2025

Sem memória não há futuro: uma visita ao Aljube

 

Ao caminhar pela Rua Augusto Rosa, em Lisboa, um edifício branco se diferencia dos demais: tem as portas e janelas restringidas por grades escuras, de aspecto triste. Inaugurado há dez anos, o Museu do Aljube – Resistência e Liberdade transforma a antiga Cadeia do Aljube em um ambiente de memória.

À data da visita realizada, o museu conta com uma exposição temporária no rés do chão, intitulada Antes de ser independência foi luta de libertação e disponível do dia 03 de abril de 2025 ao dia 31 de janeiro de 2026. Os pisos superiores, por sua vez, encontram-se ocupados pela exposição permanente, que conta não apenas a história do Aljube, que foi prisão desde o período romano até 1965, mas também sobre o fascismo e a luta pela democracia em Portugal.

A primeira exposição, de curadoria da diretora do museu, Rita Rato, é derivada de outra exposição temporária, realizada em 2022, e explora o arquivo documental do museu para refletir sobre a resistência anticolonial durante a ditadura e suas relações com as independências e com o fim do fascismo no país. A forma encontrada para apresentar esse arquivo é diversificada e eficiente: o visitante tem contato com reproduções de cartazes fixadas nas paredes, importantes documentações sobre a vida e a resistência em países como Angola e Guiné-Bissau, dispostas em mesas expositivas, e relatos em formato de vídeo.

Vista da exposição temporária. Foto: acervo pessoal.

 

Na sala, também é interessante como a estrutura da exposição, colorida e atual, se mescla à estrutura do Aljube, com as paredes expostas e desgastadas.

Já a exposição permanente, distribuída ao longo de três pisos, se inicia com impressionantes dados comparativos sobre mortalidade, analfabetismo, infraestrutura e outras importantes questões em Portugal ao longo dos anos e, depois, segue uma ordem cronológica, desde 1890 ao 25 de abril de 1974.

O design da exposição é criativo, o que permite chamar a atenção do público e transmitir de forma clara a informação. Em uma das salas, por exemplo, um discurso de Salazar passa em uma televisão, confrontado por dados e análises dispostos nas paredes que mostram os resultados das afirmações feitas por ele, tal como a frase “não discutimos a glória do trabalho e o seu dever” seguida por uma explicação de como a legislação de 1933 liquidava os sindicatos livres. Em outro espaço, o visitante pode ver uma reconstrução dos curros, celas pequeníssimas que ficavam no segundo andar do Aljube.

Detalhe de uma das paredes na exposição permanente. Foto: acervo pessoal.



 

De modo geral, a integração entre os textos informativos e os objetos dispostos é muito bem feita e permite um aprendizado profundo sore conteúdos relevantes. Todavia, em algumas das salas, a quantidade e a diagramação dos textos atrapalham a leitura e resulta tanto em visitantes que não leem as informações, quanto em dificuldades de circulação, já que aqueles que param para ler acabam por bloquear os estreitos corredores da exposição. Para além disso, tanto na exposição permanente, quanto na temporária, há uma falta de acessibilidade, com letras pequenas que impossibilitam que pessoas com deficiência visual ou idosos acessem o conteúdo.

Visitantes a lerem os textos da exposição. Foto: acervo pessoal.

 

Ainda assim, o Museu do Aljube – Resistência e Liberdade cumpre bem o seu papel na divulgação e manutenção da memória do passado sombrio do país e na produção de pensamento crítico acerca desse passado. “Sem memória não há futuro”, está escrito ao final da exposição permanente. E são espaços como este que permitem evitar que as gerações futuras repitam os erros do passado.