sexta-feira, 30 de maio de 2025

Última Esperança - FITEI 2025- 22 de maio de 2025

 

Última Esperança - FITEI 2025

Auditório do Campo Alegre - 22 de maio de 2025

Apresentada a 22 de maio de 2025 no Auditório do Campo Alegre, no âmbito do FITEI — Festival Internacional de Teatro de Expressão Ibérica, a peça "Última Esperança", do coletivo chileno Cuerpo Sur, é uma experiência teatral que transcende o convencional. Com direção e interpretação das duas únicas atrizes, Hilda Snippe (Países Baixos) e Ébana Garín (Chile), a obra propõe uma reflexão profunda sobre a dependência humana das imagens e a construção da memória através dos sentidos.

A narrativa desenvolve-se em duas línguas — holandês e espanhol — com legendas em português e inglês projetadas no palco e adaptadas ao movimento em cima do palco, criando uma atmosfera multilíngue que reforça a universalidade dos temas abordados. A peça inicia-se de forma contemplativa, convidando o espectador a mergulhar no presente e a questionar a origem da relação entre as duas personagens, e o espectador dá por si, no seu imaginário a criar imagens que não foram experienciadas pela sua visão.

No momento seguinte existe um monologo, onde Hilda se deita no chão como se estivesse a comtemplar o seu céu ao relembrar memórias com o seu pai, aqui Ébana estava a filmar esta cena de Hilda e esta mesma gravação está a ser transmitida no mesmo ecrã onde são lidas as legendas, é neste instante que o público se apercebe a atriz é realmente cega, a narrativa avança e revela-se que Hilda possui apenas 1% de visão. Este facto torna-se o eixo central da narrativa, explorando como a ausência de visão influência a perceção do mundo e a formação de memórias. A peça desafia o público a reconsiderar a primazia da imagem na experiência humana, sugerindo que sensações e conceitos podem ser tão ou mais significativos.

A encenação inclui momentos em que as atrizes interagem fisicamente com o cenário, um desses momentos, e dos mais impactantes ocorre quando um pano suspenso simboliza as "montanhas holandesas" descritas pelas personagens invisual. Neste cenário, ambas percorrem o tecido com o corpo, guiadas pelo tato, invertendo os papéis habituais: a personagem cega lidera, ensinando a outra a "ver" através do sentir. Esta cena sublinha a ideia de que a perceção não se limita à visão, mas é uma construção sensorial complexa que vai além da visão.

A peça é pontuada por diálogos profundos, como quando Ébana questiona Hilda sobre o medo da morte por ataque cardíaco, pois sabia que a figura paterna de Hilda tinha falecido dessa forma, ao que a mesma responde que o seu maior receio é perder o pouco de visão que lhe resta. Esta confissão revela a fragilidade e a importância que atribuímos aos sentidos na nossa identidade, ou que por vezes até o temos como garantidos.

            "Última Esperança" é uma peça de teatro que propõe um exercício de empatia e imaginação. Mesmo para aqueles que não são habituais apreciadores de teatro, a obra oferece uma oportunidade única de introspeção sobre a dependência das imagens e a riqueza dos outros sentidos. Pessoalmente, esta peça quase que não foi sentida como uma peça, foi mais como uma experiência de decifração, pela quantidade de descrições narradas, descrições estas, como por exemplo, de cores como sensações.  As projeções de manchas luminosas no palco, por exemplo, desorientam inicialmente, mas acabam por aproximar o espectador da perspetiva da personagem cega, é uma perceção surpreendente do que é o teatro sem imagens concretas de apoio, apenas com luz, áudio e imagem desfocada.

Em suma, "Última Esperança" é uma reflexão sensível e necessária sobre a perceção, a memória e a inclusão. Ao colocar em cena a experiência da cegueira de forma poética e sensorial, a peça desafia-nos a repensar a forma como interagimos com o mundo e com os outros. Faz nos questionar a nossa dependência nas imagens, quase como se a vida fosse o provérbio “Ver para crer”.


Fonte: Colectivo Cuerpo Sur, 2025 (https://fitei.com/pt/evento/ultima-esperanca-colectivo-cuerpo-sur-varios-locais-2025/)


Durante a peça não foi possível fazer qualquer tipo de registos fotográficos.

Webgrafia:

Colectivo Cuerpo Sur. (2025). Última Esperança [Espetáculo de teatro]. Festival Internacional de Teatro de Expressão Ibérica (FITEI), Porto, Portugal. https://fitei.com/pt/evento/ultima-esperanca-colectivo-cuerpo-sur-varios-locais-2025/ 

quinta-feira, 29 de maio de 2025

Exposição “Uma Graça Natural", Torres Novas

Local: Praça do Peixe, Torres Novas Santarém

Data: de 12 de abril a 22 de junho de 2025

Curadoria: António Gonçalves 

Coleções: Fundação Carmona e Costa e Galerias Neupergama



A exposição Uma Graça Natural, patente na Praça do Peixe, em Torres Novas, revela uma curadoria onde a sensibilidade e a inteligência convergem num diálogo intergeracional da arte contemporânea portuguesa. Sobre a direção de António Gonçalves, a exposição reúne mais de cinquenta obras provenientes das colecções da Fundação Carmona e Costa e da Galeria Neupergama, convidando à reflexão sobre a afinidade estética e emocional que atravessa diferentes gerações de artistas. A exposição propõe antes um espaço de diálogo entre obras que, pela sua força plástica e carga poética, partilham um denominador comum: a autenticidade do gesto artístico.

O título Uma Graça Natural sugere, na minha leitura, um reconhecimento da leveza e espontaneidade — não como superficialidade, mas como uma qualidade essencial. Trata-se de uma graça que emerge da liberdade do gesto, de uma intuição rigorosa, da tensão subtil entre o visível e o invisível. A curadoria constrói assim um ambiente poético, onde diferentes linguagens coexistem — do figurativo ao abstracto, da instalação ao desenho — unidas por uma vibração partilhada e por uma sensibilidade que se manifesta no traço, na cor ou no silêncio.

A presença de Paula Rego oferece à exposição uma dimensão profundamente emocional e política. As suas obras, de carácter narrativo e simbólico, exploram o universo feminino e os recantos da psique com um estilo inconfundível: simultaneamente grotesco e lírico, inscrito numa tradição crítica e autobiográfica que questiona normas sociais e visuais.

Contrastando com essa intensidade narrativa, artistas como Julião Sarmento e Rui Chaves adotam uma linguagem mais austera e conceptual. Nestes, o corpo está presente sobretudo pela sua ausência — pela sugestão, pela lacuna. As suas obras, marcadas por uma economia formal, exigem do espectador uma escuta atenta, quase um acto de fé na força da arte silenciosa.

Entre estes diferentes registos, sobressai a subtileza dos traços de Ana Hatherly. A sua escrita visual convoca uma arqueologia do signo e da palavra, num diálogo com a tradição da poesia concreta. Nos seus desenhos, de aparente leveza, esconde-se uma densa reflexão intelectual, demonstrando como um gesto mínimo pode conter um universo inteiro. Já a obra de Pedro Cabrita Reis conduz-nos a um território onde matéria e ideia se confrontam — entre ruína e construção, forma-se uma poética do inacabado.

A dimensão plástica da exposição é amplificada pela qualidade do espaço. A Praça do Peixe, com a sua luz natural filtrada, proporciona uma experiência sensorial envolvente. A disposição das obras não segue uma ordem específica, mas mais uma lógica rítmica, quase musical, que convida o olhar a manter-se, a surpreender-se e a reencontrar-se. A curadoria aposta numa dramaturgia visual oscilante entre impacto e suspensão, entre excesso e contenção. Há momentos de pura contemplação — como o da escultura de Rui Chafes — e outros de confronto direto, como nos desenhos de Mário Cesariny.

O discurso curatorial evita uma explicação exaustiva, preferindo sugerir percursos interpretativos que exigem um pensamento crítico por parte do visitante. As obras comunicam entre si e com o público, formando caminhos visuais e afetivos. A presença de artistas de diferentes gerações reforça a ideia de que a arte é, acima de tudo, um território de encontros — não só formais, mas humanos. O gesto artístico torna-se, assim, uma forma de estar no mundo, uma resistência ao ruído contemporâneo, criando beleza a partir do fragmento, do erro, da dúvida.

Do ponto de vista crítico, é de notar que a exposição exige do público uma certa disposição contemplativa, pouco comum nos ambientes atuais de receção rápida e mediada. Porém, essa exigência é precisamente uma das suas virtudes: a mostra recusa o didatismo e o espectáculo, e convida ao mergulho atento e sensível. A aposta na subtileza e na multiplicidade de leituras confere-lhe uma maturidade estética notável.

Em suma, Uma Graça Natural é mais do que uma exposição de artes visuais — é uma experiência estética e filosófica. Um convite a perceber a arte como escuta, como afeto e como sintonização de sensibilidades diversas. A graça do título é, afinal, aquela que se manifesta quando o olhar, desacelerado, encontra uma forma que fala com o seu interior. Trata-se, sem dúvida, de uma oportunidade não apenas para observar, mas sobretudo para sentir.







segunda-feira, 26 de maio de 2025

“Pinóquio – Cyber estórias para um velho boneco” na Casa Mantero, em Sintra – mergulho no universo imaginário infantil do “ser”, entre o passado e o presente.


A companhia de Teatro TapaFuros encontra-se em cena com uma peça para crianças no Jardim da  Biblioteca Municipal de Sintra: “Pinóquio – Cyber estórias para um velho boneco”, a partir do conto de Carlo Collodi, entre os dias 3 e 25 de maio, aos sábados 17h00 e domingos às 11h00. Reservas: 968610105 / producao@tapafuros.com/ R. Gomes de Amorim 12-14 - Sintra. 
Uma adaptação livre de Rui Mário desta obra clássica, “que aqui ganha uma nova visão, um Pinóquio dos tempos modernos, mas que continua a fazer sonhar todas as crianças e jovens que assistem”, pode ler-se. Como uma característica própria e envolvente, do teatro de rua dos TapaFuros, o público é convidado a participar nesta nova aventura de Teatro para toda a Família, nos jardins da Biblioteca Municipal de Sintra – Casa Mantero.  Duração 50 min | M/ 6.                           
A partir do conto Carlo Collodi | Texto Original Rui Mário | Encenação Rui Mário | Música Original Pedro Hilário | Interpretação Ana Valente; Nuno Fonseca e Zé Redondo | Cenários e adereços André Fradique | Figurinos Sónia Marques e Xana Capela | Design Gráfico Adriano Lopes | Fotografia Sérgio Santos e André Rosa | Produção Executiva Samuel Saraiva | Produção Teatro TapaFuros. Este espetáculo foi realizado ao abrigo do Programa Apoio às Artes Performativas – PIAP 2025.
“O trabalho do colectivo marca-se por uma estratégia bem definida de sensibilização de públicos e da sua recepção, sendo as produções apresentadas na rua a prova dessa aposta, ao fazer com que os espectadores se sintam integrados nos seus espectáculos, participando como figurantes num jogo teatral que se pretende, antes de mais, comunicante – conforme sucedeu em vários locais como o largo fronteiro ao Palácio Nacional de Sintra, a Quinta da Regaleira, Biblioteca Municipal - Casa Mantero ou Parque da Liberdade e, mais recentemente, no igualmente prestigiado Museu Arqueológico de S. Miguel de Odrinhas. O reconhecimento do trabalho do colectivo, por parte da edilidade Sintrense, teve um ponto de relevo com a atribuição da medalha de mérito municipal grau ouro. Tem como mecenas a Fundação CulturSintra e como parceira a Câmara Municipal de Sintra." 

O Teatro TapaFuros, fundado pelo Rui Mário, em 1990, com 33 anos de atividade ininterrupta em Sintra, tem desde sempre procurado a versatilidade que julga imprescindível face ao panorama cultural contemporâneo. Rui Mário, de formação em Filosofia, pela Universidade de Letras de Lisboa, pertenceu à companhia de teatro da Faculdade de Letras, da Universidade de Lisboa. Desde sempre, a sua paixão, não o fez parar. Criou ainda, a companhia de teatro da escola secundária Leal da Câmara, em Rio de Mouro-Sintra, "Os Reticências", e trabalhou em parceria com o animador cultural e músico Pedro Hilário, desde 2001(em 2008 começa a trabalhar no TapaFuros a tempo inteiro). Desde sempre, que este Teatro Escolar tem desenvolvido grandes atores, os quais, passam para o TapaFuros e são lançados para outros voos dentro do teatro, cinema, telenovelas e outras profissões ligadas ao Teatro em Portugal. Com o mestrado em Ensino do Teatro, da Escola Superior de Educação, continua o seu trabalho também como professor de Teatro, na mesma escola. 

 A Companhia de Teatro TapaFuros trabalha em 4 variantes do teatro: Teatro de Rua (dia), Teatro de Rua/Performance (noite), Teatro de Sala e Teatro Infantil, a sua sede tem sido em Mem Martins, no Estúdio 2M.

                                                              Pelas quatro e meia da tarde entra-se pelo pátio da Biblioteca e, aparece uma pequena mesa forrada com uma toalha amarela, a pequena recepção. Um ator da companhia atende com uma sincera simpatia e cortesia. Paga-se, e em troca um pequeno bilhete encantador, de uma excelente qualidade gráfica e impressão sobre papel. Diretamente para a agradável e recuperada cafetaria, com uma esplanada visualmente decorada, com a paisagem mágica da serra, com o Castelo dos Mouros. A fila forma-se pelos alegres pais e filhos, que afinal entram  com a idade de 2 anos. Os 6 anos eram referente aos seus familiares. Dentro da cafetaria, o balcão estava cheio devido ao letreiro que dizia: “Fábrica de Queijadas”. Um espaço amplo e cheio de estudantes que trabalham ao som da Cafetaria. Dentro desta, num pequeno, mas largo corredor, uma pequena Galeria de Arte com uma exposição da artista plástica Ana Margarida Ferraz. Uma casa de banho ampla e mista, contém também um grande ponto forte, uma pega para os casacos e malas das mulheres, na parte de trás da porta.

No início do espetáculo vêm buscar o público ao pé da mesa Amarela. Os pais e as crianças sobem as escadas e todos seguem o guardião do jardim. Por entre árvores aparece o espaço do palco ao ar livre. A plateia forma um arco, e as crianças ficam à frente nos colchões, os pais atrás sentados em cadeiras. A música é contemporânea e misteriosa, vai estar sempre de acordo ao longo da história. O narrador é uma voz gravada, alta e forte que parece vir do jardim.  O cenário é o jardim, e os acessórios são simples, mas eficazes: Uma caixa com rodas que se vai abrindo e se desloca ao longo do espetáculo; a sua pintura está entre o clássico, o brinquedo e os efeitos digitais; abre-se em várias situações: é  a bancada computadorizada para a construção do Pinóquio, um teatro de fantoches, onde aparecem as personagens do país das brincadeiras, as quais, se vão transformar em personagens verdadeiras, a máquina cibernética que o transforma numa criança humana. Um caixote enorme e verde que vai ser uma prisão, um saco de moedas e um boneco fixo e gigante com umas longas barbas e ganha vida com os braços de um ator no seu interior (o guardião do país das brincadeiras), com uma voz também alta, forte e imperial. A atmosfera criada pelo cenário, pelos acessórios, pelos figurinos das personagens à volta do Pinóquio, é saída de contos clássicos, como a Alice no País das Maravilhas, o Quebra-Nozes, os Brinquedos que Ganham Vida. Com apontamentos atuais, óculos de sol, o menino malandro vestido à moda atual, a fada com bigode, o Pinóquio todo prateado como um robô. Os Figurinos estão muito bem adequados às cenas, são muito práticos de vestir e mudar rapidamente. São somente 3 atores: um, é o Pinóquio, que tem de mudar e adquirir vários pequenos adereços ao longo do espetáculo, só no fim muda de roupa em palco, dentro da caixa que o transforma em criança. Os outros atores realizam, cada um, 5 personagens que aparecem de diversos sítios. O ritmo do espetáculo é muito bom, conseguem interagir com as crianças e prender a atenção delas o tempo todo, durante 50m. 


  

 “Avançamos no tempo, desde os idos do sec. XIX e fazemos um “upgrade” nesta narrativa encantadora que nos fala da natureza humana, da infância e seus desafios, em suma: do que é crescer e tornar-se humano. Esta é a história de um menino que nasce a partir de uma motherboard, sempre metido em confusões, peripécias e mentiras. Cibernóquio gosta pouco da escola, prefere brincar e divertir-se. Facilmente se deixa enganar por outras pessoas, arranjando problemas. Depois, como não quer desiludir o pai, mente e o seu nariz cresce muito… O que acontecerá a este menino especial e ao seu nariz? Novas aventuras de um velho boneco! Prepare-se para uma viagem única e surpreendente, onde o clássico de Carlo Collodi ganha uma nova e eletrizante versão! Pinóquio – Cyber estórias para um velho boneco, a história que todos conhecemos é transformada numa aventura cibernética. Neste espetáculo, o famoso boneco de madeira não é feito de pinho, mas sim de uma motherboard que ganha vida diante os nossos olhos. Pinóquio, agora digital, enfrenta desafios e peripécias tão fantásticas e emocionantes quanto as do conto original, com a ajuda da sua inesquecível fada, a Fada XPTOUm espetáculo divertido e com reviravoltas inesperadas, que promete encantar toda a família, trazendo o equilíbrio perfeito entre tradição e inovação. As lições que Pinóquio nos ensina, mais atuais do que nunca, lembram-nos da importância de seguir o coração e de buscar sempre a nossa verdadeira essência."                    



As personagens que estes dois atores criaram foram:   

 O Gepetto: “Pensei em fazer só para mim uma bela invenção, surpreendente, mas uma invenção maravilhosa, que faça coisas incríveis e nunca vista, que espante tudo e todos.”                    O Cereja:“Mas de onde terá saído aquela vozinha que disse "ai"?... Aqui não há viva alma! Terá por acaso esta geringonça começado a falar e a queixar-se comoum rapaz? Não posso crer. Ora isto não passa de um circuito, de um monte de fios para montar um computador...”

Os 2 personagens do:"Grande Teatro do PAPAFOGO"
O Gato: "Olha para mim, por causa da paixão louca de estudar perdi a vista de ambos os olhos."
Raposa: "Nós não trabalhamos pelo nosso interesse: nós trabalhamos unicamente para enriquecer os outros."

o Master Pirilamps: “Se não vieres comigo vais arrepender-te. Onde vais encontrar um país tão bom para todas as crianças como nós?”

A Fada XPTO

O Condutor /O Apresentador do Circo do País das brincadeiras:"Vou fugir... O autocarro para o País das brincadeiras nunca vai parar..."

A Mensagem é para todos: é necessário estudar e aprender, há sempre tempo para brincar, cuidado com as tecnologias, não acreditar em tudo, nunca mentir e venham sempre ao teatro.

   





domingo, 25 de maio de 2025

MUDE - Museu do Design


 

R. Augusta, 24. Lisboa

3ª a 5ª feira: 10h - 19h

6º e sábado: 10h – 21h

Domingo: 10h-19h

 

www.mude.pt

 

Instalado desde julho de 2024 no antigo edifício do Banco Nacional Ultramarino, o MUDE — Museu do Design e da Moda — encontrou aqui uma nova casa, fruto de uma série de decisões políticas e pareceres do Instituto Português do Património Arquitetónico (IPPAR). Em 2019, António Costa, então Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, propôs a transferência do museu para este edifício, que, até então, acumulara várias tentativas de reabilitação arquitetónica entretanto abandonadas por falta de orçamento. Quando o novo projeto teve início, o edifício já apresentava áreas bastante degradadas, com zonas em ruínas. O projecto do arquiteto Luís Saraiva privilegiou uma estreita articulação entre arquitetura e museologia. O edifício preserva vestígios das suas vidas anteriores, estabelecendo um diálogo constante entre a sua memória histórica e a linguagem da arquitetura contemporânea.

 



O edifício do MUDE desenvolve-se por sete pisos, cada um com características distintas que refletem diferentes dimensões do museu. No piso 0 encontra-se o átrio principal, onde se destaca um monumental painel de azulejos que remonta ao edifício original, anos 20 / 30, funcionando como testemunho visual da sua história, onde se insere o balcão da bilheteira. Neste mesmo piso localizam-se também a loja do museu, um espaço dedicado à divulgação editorial com uma seleção cuidada de publicações sobre design português e internacional, livros de artistas, literatura infantil e catálogos de exposições. Ainda em fase de ampliação, a loja será brevemente expandida para um espaço contínuo. Um dos elementos marcantes deste piso é a exposição de fotografias em tamanho real que retrata vários trabalhadores envolvidos no processo de reabilitação do edifício, criando um diálogo direto entre os operários e os visitantes.


No piso 1 do MUDE encontra-se a Biblioteca de Design, gerida pela Câmara Municipal de Lisboa. Ocupa a antiga sala de reuniões da administração do banco. Aberta ao público durante os dias úteis, bem como no primeiro e terceiro sábado de cada mês, a biblioteca disponibiliza um vasto acervo especializado, acessível para consulta presencial. É possível realizar pesquisas prévias através do catálogo online disponível no site oficial do MUDE , facilitando o acesso a livros de design nacional e internacional, publicações temáticas e materiais de apoio à investigação.

Também no piso 1 encontra-se a exposição temporária Portugal Pop. A Moda em Português. 1970–2020, patente até 12 de outubro de 2025. Esta exposição convida o visitante a percorrer a história contemporânea de Portugal, desde os momentos que antecederam a Revolução de Abril até aos dias de hoje, através da moda e das expressões visuais de identidade. A exposição constrói-se a partir de peças de vestuário de designers portugueses e internacionais, usadas por figuras icónicas como Amália Rodrigues, Mísia, António Variações, Heróis do Mar, Teresa Salgueiro, Joana Vasconcelos e Conan Osiris, entre outros. Estilistas como José António Tenente, Dino Alves, Luís Buchinho, Helena Cardoso, Ana Salazar e os Storytailors revisitam o imaginário popular português, reinterpretando trajes tradicionais de várias regiões do país: os trajes minhotos, as vestes de trabalho dos pescadores ou das vindimas, as sete saias da Nazaré ou o capote alentejano. A exposição revela ainda criações inspiradas em figuras centrais da cultura portuguesa, como Paula Rego, Sophia de Mello Breyner Andresen e Fernando Pessoa, bem como em momentos históricos marcantes, como o 25 de Abril. Organizada em três núcleos, Memória Coletiva e Identidade Nacional, Territórios Pessoais: a Intersubjetividade na Primeira Pessoa do Singular e Ecoló-gico: Antropologia de Lugares, Materiais e Saberes, a exposição propõe uma reflexão alargada sobre a moda enquanto expressão cultural, política e ecológica. Também se destacam práticas experimentais de confeção, processos de reciclagem e modelos de produção sustentáveis, que questionam os paradigmas da moda no contexto atual. A exposição inclui ainda diversos conteúdos audiovisuais, entre os quais videoclipes dos artistas cujos figurinos estão em exibição, e uma instalação sonora do artista Tiago Pereira, que aproxima o visitante de um Portugal simultaneamente rural e urbano, tradicional e moderno.


Vestidos usados por Amália Rodrigues em diversos espéctaculos.



Coleção Colheitas . Reinterpretação das memórias 
colectivas das Vindimas do Douro. 
Filipe Augusto, 2018/2019
 

Exploração têxtil numa intrepertação da estética barroca que toma a herança dos 
Caretos de Carnaval de Trás-os-Montes e Douro como tema central discutindo a questão de género.
António Castro, 2021.
 
Videoclipe de Cláudia Pascoal, Quase dança, 
com trajes tradicionais portugueses que evocam o folclore nacional

O piso 2 é composto por galerias e salas destinadas a atividades diversas que abrirão brevemente ao público

Nos pisos 3 e 4 encontra-se a exposição de longa duração Para Que Servem as Coisas Peças do Acervo MUDE 1900–2020 uma viagem cronológica pelo design ao longo do último século A mostra apresenta objetos que marcaram diferentes períodos históricos colocando a questão da utilidade dos objetos e do seu impacto no quotidiano humano A exposição está organizada por temas como: Sinais de Modernidade no Mundo e no País 1920–1930, Campanha do Bom Gosto e Imagética Nacionalista 1930–1950, O Luxo Antes e Depois da Segunda Guerra, Sinais de Reconstrução no Cenário de Pós-Guerra 1945–1948, Utopias e Distopias 1960–1970, Exaltação do Plástico 1960–1970, Sinais de Mudança e de Revolução 1960–1970, Cultura de Excessos 1980–1990
Natureza como Fonte de Recursos e Inspiração 1990–2020, Como Viver no Futuro 1990–2020, Recusar Reciclar Reparar 2000–2020, Perspetivar o Futuro 2000–2020.Através desta estrutura o visitante percorre a evolução da relação entre objeto e sociedade compreendendo os desafios estéticos técnicos e ideológicos que atravessam o design contemporâneo. Estão em exibição peças emblemáticas de designers nacionais e internacionais que ajudam a interpretar a evolução dos modos de vida e os sistemas de produção e consumo.

 
Livros de Raul Lino sobre arquitectura 
inseridos na seção "Campanha do Bom Gosto" e Imagética nacionalista: 1930-1950

 
Peças de mobiliario de diversos designers
 inseridos na seção de "O Luxo antes e depois da Segunda Guerra"
 
 
Cadeira Garden Egg de Peter Ghyczy, 1967 
inserida na seção Exaltação do Plástico: 1960-1970

O piso 5 está reservado para futuras residências artísticas, enquanto no piso 6 se localizarão a cafetaria, o restaurante e o terraço, atualmente ainda em fase de reestruturação, pelo que não se encontram abertos ao público neste momento.

Tal como o próprio conceito de design, o MUDE revela-se como um espaço de experimentação, aberto ao diálogo, que convida ao debate e se estrutura para acolher novas propostas e perspetivas. A sua arquitetura e organização interna refletem a dinâmica que pretendem instalar, com espaços multifacetados que se adaptam a diferentes usos e públicos. As várias galerias do piso 2, ainda por inaugurar, o espaço do Serviço Educativo e o auditório multidisciplinar são exemplos dessa abertura à programação futura e à diversidade de atividades culturais. Esta flexibilidade estende-se também à presença digital do museu: o seu site oferece não só informação detalhada sobre exposições atuais e futuras, como também disponibiliza o acervo da biblioteca e um vasto arquivo digital do museu, organizado por áreas como Produto, Gráfico, Moda e Joalharia, permitindo inúmeras formas de pesquisa e exploração online.

Como nota final, não pude deixar de reparar no contraste entre o movimento intenso das ruas da Baixa Pombalina, repletas de turistas a ponto de ser difícil circular, e a tranquilidade no interior do MUDE, onde ao longo da visita apenas me cruzei com outras 2 pessoas. Esta experiência leva-me a questionar se o museu ainda não está a conseguir alcançar verdadeiramente o seu público, ou se o tipo de turismo que hoje ocupa o centro da cidade estará mais interessado nas lojas multinacionais, que certamente encontram nas suas cidades de origem, do que em viver uma experiência cultural onde poderiam conhecer, de forma mais profunda, a história do nosso país e também da Europa, através do design, da moda e das transformações sociais que os acompanham. Esta ausência de publico levanta questões importantes sobre o papel dos museus e sobre a urgência de repensar estratégias de mediação cultural mais eficazes.



sexta-feira, 23 de maio de 2025

6ª Edição de “IlustraBD”

Começou mais uma edição de “IlustraBD”, evento este que acontece há 6 anos no Auditório Municipal Augusto Cabrita (AMAC), no Barreiro. As obras estarão expostas no auditório de 5 de abril de 2025 a 27 de julho de 2025. Esta é uma exposição de banda desenhada e de manga, com uma curadoria atenta à diversidade estética e narrativa, com uma apresentação que oferece ao público uma oportunidade de contacto com obras menos conhecidas.

O percurso expositivo está dividido por editoras, cada uma ocupando um espaço próprio, o que permite organizar visualmente o conteúdo e dar destaque à identidade gráfica de cada publicação. Esta divisão favorece uma leitura individualizada das propostas editoriais, embora, em certos momentos, possa resultar numa fragmentação do discurso global da exposição. A opção por esta organização privilegia o lado editorial, temático e histórico, que enriquece o enquadramento geral.

Visualmente, a exposição é particularmente apelativa, cada espaço de cada livro tem páginas dos mesmo impressas em tamanho maior do que o próprio, expostas nas paredes. Também nas paredes de cada núcleo expositivo existem ilustrações ampliadas, impressas em papel autocolante e coladas diretamente na superfície, criando cenários envolventes que projetam o visitante para o universo visual de cada obra. Este recurso expositivo revela-se eficaz ao gerar uma atmosfera imersiva, que não só valoriza a estética da banda desenhada, como também aproxima o visitante do ambiente narrativo de cada história.



No piso inferior concentram-se os trabalhos de banda desenhada ocidental. A variedade de estilos, temáticas e abordagens técnicas aqui apresentadas revela um panorama rico da BD contemporânea. Algumas obras exploram o quotidiano com um traço mais minimalista, outras seguem por universos de fantasia e crítica social, com maior densidade visual e narrativa. Os textos de parede, presentes em cada espaço, fornecem informações úteis sobre os autores, editoras e contexto da obra.

Já no piso superior, o destaque vai para o manga. A disposição segue o mesmo princípio organizativo do andar inferior, mas com um foco claro na estética e linguagem gráfica japonesa. Este segmento da exposição revela-se particularmente interessante ao sublinhar o contraste com a BD ocidental, tanto ao nível do traço como da construção narrativa. O manga, aqui representado em várias subcategorias (shonen, slice of life, experimental), demonstra a versatilidade deste género, frequentemente associado a públicos juvenis, mas cuja riqueza estilística ultrapassa facilmente esse rótulo.



Um dos elementos mais bem conseguidos da exposição é a inclusão dos próprios livros em cada espaço, colocados na parede a seguir a cada explicação, e estes exemplares estão ao alcance dos visitantes, que os podem folhear livremente. Esta solução permite uma aproximação direta à obra original, promovendo uma experiência mais completa, que alia a observação das pranchas ampliadas à leitura física do livro. O gesto de folhear devolve à exposição a dimensão de leitura que muitas vezes se perde em mostras demasiado centradas na imagem. 


Em termos de percurso, a exposição está bem organizada, com sinalética clara e um equilíbrio coerente entre os espaços. O ambiente geral é tranquilo e a ausência de dispositivos digitais ou interativos contribui para uma fruição mais lenta e atenta, centrada no papel, na tinta e no desenho. No entanto, a presença de uma pequena introdução com contextualização histórica ou temática poderia reforçar a leitura global da exposição, especialmente para visitantes menos familiarizados com o universo da Banda Desenhada ou até mesmo do manga.

No seu conjunto, “IlustraBD” afirma-se como uma exposição de mérito, que valoriza o trabalho de autores emergentes e de editoras alternativas, promovendo a pluralidade de vozes e estilos num setor frequentemente dominado por grandes nomes e formatos comerciais. A proposta expositiva distingue-se pela criatividade na montagem e pela generosidade com que oferece ao público não só imagens impactantes, mas também livros reais, com a possibilidade de serem explorados com tempo e curiosidade.

Ao articular ilustração, narrativa gráfica e experiência sensorial, “IlustraBD” consegue ultrapassar os limites de uma simples mostra visual, transformando-se num espaço de leitura, descoberta e reflexão sobre o poder da imagem na construção de mundos. Uma exposição que merece ser visitada com atenção e tempo, e que contribui para afirmar o Barreiro como palco de cultura visual contemporânea.

quinta-feira, 22 de maio de 2025

Uma praça que se acende

Espetáculo de Luzes de Natal

Praça Guilhermina Suggia, Matosinhos
Dezembro de 2024



    Não foi numa sala de espetáculos, nem num palco com cortinas. 

    Foi numa praça. Ao ar livre, entre prédios e pinheiros de luz. Um espetáculo de Natal em Matosinhos que transformou o espaço urbano num lugar de maravilhamento — para todos, mas especialmente para mim e para o meu filho mais novo, que na altura tinha três anos e um diagnóstico por confirmar. A experiência foi tão marcante que me ficou cravada na pele como se tivesse sido feita de som e luz.

    A performance acontecia em ciclos, com projeções monumentais na fachada do edifício da Câmara, som sincronizado e um desenho de luz envolvente. O público juntava-se em frente, em pé, a olhar para cima com o pescoço inclinado e os olhos muito abertos. O que se via? Histórias visuais feitas de neve digital, renas douradas que dançavam com a arquitetura, sinos animados, flocos de luz que caíam do céu, ou pelo menos assim parecia.

    Mas o que mais me impressionou não foi a escala técnica nem o virtuosismo visual. Foi o modo como aquele momento — tão coletivo — conseguiu tocar algo profundamente íntimo. O meu filho, que muitas vezes se sente sobrecarregado com estímulos visuais ou sonoros, ali estava em absoluto encantamento. Parado. Silencioso. Acompanhava cada sequência com os olhos e um sorriso aberto, sem palavras. A sincronia da música com as imagens parecia oferecer-lhe uma estrutura confortável. E eu, ao lado, observava não só a performance, mas a sua forma de a viver.

    Este espetáculo, apesar de ser pensado para massas, revelava uma inteligência subtil no modo como organizava o tempo visual: pausas, transições suaves, ritmos previsíveis. Havia ali um cuidado que me fez pensar na importância do sensorial na criação artística — e na responsabilidade de considerar diferentes formas de perceção e presença no espaço.

    Enquanto performance de cultura visual, este evento ultrapassa a simples “decoração natalícia”. É uma coreografia entre luz, arquitetura e emoção. Inscreve-se num campo híbrido entre arte, design e espetáculo popular. Ao ocupar o espaço público com beleza, oferece também pertença. As pessoas riem, filmam, abraçam-se. Crianças gritam de alegria. Há um sentido de ritual — não religioso, mas comunitário.


    Para mim, foi uma experiência estética, sim. Mas foi também uma espécie de epifania sobre como a arte pode ser acolhimento. Um lugar onde um corpo pequeno, ainda a aprender o mundo, encontra uma linguagem que lhe fala direto ao coração. E talvez seja essa a missão mais nobre da cultura visual: tocar sem exigir. Brilhar sem ofuscar.