A retrospectiva de Christian Krohg no Museu D'Orsay, um olhar que retrata com profunda empatia o povo escandinavo
Entre as estatuarias da ala central e os salões/galerias que albergam obras do academismo francês e grandes artistas como Courbert, Damier e Miller, encontramos uma pequena abertura (liberdade de apelidada de pequena comparativamente com a dimensão, não só em tamanho mas como em importância histórica), com uma segurança na entrada que timidamente nos faz o gesto e nos convida a entrar nesta outra dimensão ali criada.Cosmopolita, estudou na Alemanha, visitei Paris diversas vezes, tornou-se um dos principais pintores do grupo de artistas de Skagen, na Dinamarca. Admirador dos realistas aos impressionistas, ele personificou as tendências pictóricas de sua época. Com isso em mente, é mais que natural que encontre seu lugar no Museu de Orsay, ao lado de seus pares.
Ao passar pela "pequena" porta, entre paredes brancas com pequenas obras em molduras, em letras grandes lê-se Christian Krohg, e os dizeres que cativaram os meus olhos "Le peuple du nord". E com ela a sensação de ter entrado em um mundo envolto nele mesmo, dato não só pelo título mas as dimensões das obras, nesse caso as telas que a exposição dispõe. Desde do primeiro instante, esse efeito das obras e o peso do texto que as acompanham eleva e aumenta a atenção do espectador, e como se por instantes somente estivesse eu e a obra em uma espécie de redoma de vidro, onde nenhum suspirar do "mundo exterior" fosse capaz de quebrar essa ligação, mesmo que por vezes de forma fugaz, o observador é encorajado a observar cada pincelada/detalhe ali representado - aqui as "didascálicas", aqui tomo a licença de fazer uso do termo utilizado especialmente nas artes cênicas, porque a retratação aqui apresentada é de tal forma real e intensa que, a linguagem teatral parece-me mais correta do que apelida-la de mera etiqueta/descrição. Não é feita distinção entre aquilo que é visto e aquilo que é lido, os dois conversam de forma simultânea, um ato de olhar e absolver a obra.
Uma janela, uma janela para dentro da mente do próprio artista, um recorte na vida daqueles que para Krohg eram os mais vulneráveis, os invisíveis os quais sempre representou. O pincel na mão de Krogh, não era somente uma ferramenta de pintura, mas transformava-se numa espécie de lupa de aumento, quase como um microscópio, no qual retratava as cenas esquecidas na sociedade.A disposição das obras levam a que elas criem seus próprios microcosmos; a exposição como o seu próprio universo dentro do museu, e cada parede, cada secção como um microcosmos, uma aproximação não só com a obra mas com o seu tema, a plasticidade da tela torna-se maleável, assim como a divisa entre a tela e o observador, o elemento invisível das obras não reflete somente na pessoa retratada mas em a quem a observa, em "La Barre sous le vent", a utilização de texturas, acumulo de tinta em algumas zonas e a própria plasticidade da tinta e da pincelada, em contacto com a luz reluzente leva a esse elemento invisível quase tangível de vento molhado, que age com o mar conturbado atrás e cobre a face tencionada do personagem e consequentemente a do observador também, como que se mesmo por um fração de segundos estivéssemos dentro daquele barco também.
Cosmopolita, estudou na Alemanha, visitei Paris diversas vezes, tornou-se um dos principais pintores do grupo de artistas de Skagen, na Dinamarca. Admirador dos realistas aos impressionistas, ele personificou as tendências pictóricas de sua época. Com isso em mente, é mais que natural que encontre seu lugar no Museu de Orsay, ao lado de seus pares.
A exposição contextualiza a importância do artista no movimento realista e a sua relação como os artistas da época. Seu trabalho transcende a representação fiel do cotidiano e transforma-se em um manifesto contra as injustiças sociais. Transcende a simples execução da representação visual.
Krohg, transparece em suas obras os grandes debates sociais da sua época, debates estes que permanecem muitos atuais, suas pinturas fazem homenagens aos mais vulneráveis. Parecia interessada em congelar momento fugazes, quase como um repórter de rua, o elemento principal trabalhar a empatia com o seu publico. O enquadramento para o artista era de extrema importância, a arte deveria tocar o espectador de forma a suscitar empatia, tanto no seu conteúdo como na sua forma. A imagem não devia ser construída em termos de perspectiva, ele pinta seus modelos em intensa proximidade;
suas obras não trabalham apenas o realismo "fotográfico", mas todo um realismo de uma sociedade inteira esquecida e ignorada, o artista utiliza a pintura quase como um catalizador para falar do que realmente importa, as pessoas.
Vemos nas obras de Christian Krohg, a pinceladas conjuntas dos impressionistas como Manet e Gustave Caillebotte, estes enquadramentos ousados que criam a ilusão de fragmentos de vida tomados aleatoriamente, fez desta prática seu slogan "É tudo questão de enquadramento".
A exposição nos leva do enquadramento a pintura em família, passando pela arte social, a "Kristiania Bohemia". Este pequeno círculo de artistas, intelectuais e estudantes – incluindo os pintores Edvard Munch e Oda Krohg (nascida Lasson), e o escritor Hans Jæger, ao romance Albertine que foi imediatamente banido por ofender a decência pública; a história de uma jovem pobre que foi violentada e um crime na qual a sociedade vejo os olhos para, Krohg denuncia o tratamento injusto dispensado pelas autoridades norueguesas a essas mulheres, privadas de sua liberdade e sem lei que as proteja.
Indignado Christian Krohg, defende na Suprema Corte, alegou que baseou sua história em um relato real de uma de suas modelos, sentia que era seu dever "revelá-lo ao mundo, para que todos pudessem ouvir", inspirando a sua grande pintura "Albertine na Sala de Espera do Médico da Polícia".
“Albertine na sala de espera do médico da polícia” [Albertine i politilegens ventevaerelse] (1885-1887) de Christian Krohg (1852-1925) – Nasjonalmuseet (Oslo)
O espaço de mediação cultural que encontramos no meio do percurso da exposição é um dos seus diferenciais. Permite aos visitantes uma experiencia ainda mais interativa e imersiva, independente das faixa etária. Com painéis explicativos, utilização de vídeo de caráter documental e atividades interativas, proporcionam um contexto mais amplo sobre a vida e o obra do artista. Consequentemente, provoca um dialogo mais profundo das obras e a própria exposição.
A construção desses espaços é fundamental, para aproximar a arte do espectador, incentivando o publico a refletir sobre os temas abordados nas pinturas e sua relevância contemporânea, tornando a exposição acessível tanto para especialistas quanto para o publico geral.