sexta-feira, 2 de maio de 2025

Onze Mulheres a ilustrar (o seu) mundo

 MAEDS – Museu de Arqueologia e Etnografia do Distrito de Setúbal

Janeiro a Maio de 2025

Curadoria: Ana Férias


Ilustração de uma mulher em perfil, e dos seus cabelos decorrem os nomes das 11 artistas que participam na exposição


“IlustraMulher” é uma exposição coletiva que junta o trabalho de onze ilustradoras contemporâneas e que, mais do que mostrar estilos, partilha visões — sobre o mundo, sobre a intimidade, sobre o que é viver, criar e ser mulher hoje. Está patente no MAEDS, um museu que tem vindo a abrir espaço a linguagens visuais diversas e que aqui aposta numa proposta onde a arte se cruza com questões sociais e afetivas.


Ao entrar na sala, sente-se desde logo que cada artista tem o seu lugar. Não há esforço em forçar semelhanças. O que une estas obras é talvez uma inquietação comum — com o corpo, com a memória, com o gesto de contar histórias — mais do que um tema explícito. As linguagens variam: há trabalhos digitais, aguarelas, colagens, misturas técnicas. Mas o que permanece é uma energia de partilha, de procura e, por vezes, de denúncia.


O percurso expositivo é simples e direto. Não se impõe ao visitante, o que permite um tempo de leitura mais pessoal e atento a cada proposta. A curadoria respeita o universo de cada artista, e talvez por isso mesmo se sinta, nalguns momentos, falta de um fio que ligue as obras entre si — um gesto de costura mais presente. Ainda assim, essa autonomia pode ser lida também como uma afirmação de pluralidade, da recusa de encaixar o trabalho destas mulheres num molde comum.


Algumas obras ficam na memória. Cristina Arvana cria mundos delicados onde natureza e imaginação se fundem com uma leveza muito sua. Daniela Mata traz-nos imagens que falam alto — como Free Palestina — e que não deixam dúvidas quanto ao poder político da ilustração. O duo Math Is Good trabalha com referências da cultura visual popular (como o cinema), construindo imagens densas, carregadas de memória e camadas simbólicas.


Falo aqui também na qualidade de artista participante. Foi a minha primeira exposição, e isso não me
é indiferente. Estar entre estas vozes foi uma experiência marcante — não só pelo desafio de escolher o que mostrar, mas sobretudo por ver o meu trabalho colocado em diálogo com o das outras. Esta vivência despertou em mim uma vontade mais clara de, no futuro, poder também criar espaços expositivos colaborativos, onde a curadoria se torne extensão do processo criativo, e não apenas seu reflexo.

Várias mãos levantadas, com diferentes padrões inscritos, como se de tatuagens se tratassem, identificando a multiplicidade feminina contida até na própria artista.


O catálogo da exposição é cuidado e bonito, com boas imagens e um design claro. Sente-se o investimento institucional, o que é sempre importante. Talvez se note a ausência de um texto crítico mais aprofundado que ajude a pensar a exposição num contexto mais amplo — mas isso também deixa espaço para quem a visita (ou escreve sobre ela) formular as suas próprias leituras.


“IlustraMulher” deixa-nos com a sensação de que há ainda muito por dizer e mostrar — e isso, para mim, é sinal de que cumpriu o seu papel. É uma exposição que se posiciona com coragem, sem ser moralista nem superficial. E oferece uma galeria viva de vozes que, cada uma à sua maneira, desafia o que significa ilustrar, cuidar e criar neste tempo em que vivemos.

quarta-feira, 30 de abril de 2025

A Casa da Cerca e as oficinas artísticas

 A Casa da Cerca, em Almada, é um centro de arte contemporânea, onde nele podemos observar um belo jardim botânico com vários tipos de plantas com o objetivo de aproveitá-las para fazer arte, ou seja, plantas estas que são utilizadas para as mais variadas práticas artísticas. 

Para além disso, esta casa tem um vasto programa cultural. O momento inicial serviu para explorar e observar a linda paisagem do rio Tejo bem como admirar e refletir sobre as esculturas que naquele jardim habitavam. Uma experiência imersiva, na medida em que, neste centro de arte contemporânea são também exploradas através de oficinas, várias experiências artísticas bem como exposições e atividades culturais.


No dia 11 de Abril esteve presente uma oficina onde foi explorado uma mistura entre a fotografia e o desenho com o objetivo de retirar das pessoas o melhor que elas têm dentro e fora de si. 

Através da arte, neste caso da fotografia em consonância com o desenho, todos aqueles que foram mergulhados pelo desafio conseguiram superar algo que seria para muitos impossível. Desenhar através de uma câmara obscura, sentir que todos podemos fazer arte mesmo que não seja aquela que pensamos ser a nossa arte principal. 

Podemos dizer que, muitos são movidos pela arte que têm dentro deles, mas podemos ter mais do que uma arte dentro de nós, podemos ser artistas por completo! Mas o que é ser um artista por completo? 

Ao longo do decorrer desta oficina que oferecia um espaço tranquilo, com música relaxante e ao mesmo tempo motivadora, foram criados retratos. As reações foram várias, desde curiosidade e surpresa, a estranheza e reflexão. 



Perante este centro contemporâneo e através desta oficina surgiram diálogos, reflexões, contacto com a natureza, questionamentos, observações e um olhar crítico e artístico.

Todos os que se submeteram a esta experiência saíram dela mais leves e enriquecidos, cada um à sua maneira.


terça-feira, 29 de abril de 2025

Spiral Tribe Exhibition de Mark Angelo Harrison - ADAO Associação Cultural, Barreiro.

 

Spiral Tribe Exhibition esteve presente na ADAO Associação Cultural sem fins lucrativos localizada no Barreiro de 22 de março a 29 de março. Esta exposição foi uma exposição de fotografia montada num local que não foi pensado para uma iniciativa como esta, sendo assim o espaço onde esta ocorreu improvisado.

A inauguração começou com um discurso de Mark Angelo Harrison, cofundador do coletivo Spiral Tribe, que se estendeu para a apresentação da exposição e relação da mesma com o livro A Darker Electricity: The Origins of Spiral Tribe Soundsystem, escrito pelo próprio, num processo que demorou oito anos. Sendo um ambiente que é frequentado por pessoas que conhecem bem a música eletrónica e o conceito de Free Party não existiu uma explicação aprofundada sobre os temas, em vez disso foi esclarecido em que momento foram capturadas as fotografias. Ao longo da conversa com o cofundador foi fácil de entender que a exposição não foi sobre o processo visual das fotografias tiradas, mas, acima de tudo, sobre a sua história.

As fotografias podem ser desconfortáveis para quem não tem conhecimento destas festas ditas ilegais, mas percebesse que é reconfortante para o grupo de pessoas que se revê nestes movimentos.

Nenhuma das fotografias tinha identificação ou o nome do autor, pois nunca foram capturadas com o intuito de serem expostas, mas sim, com a intenção de criar registos e memória daquilo que foram construindo. Estas fotografias foram recolhidas ao longo dos anos 90 até inícios dos anos 2000, primeiros anos em que o coletivo atuou, com origem no Reino Unido e mais tarde difundindo eventos pela Europa.

As imagens espelham perfeitamente a influência do grupo na cultura da música eletrônica e ainda o movimento anticapitalista, mal visto por muitos, tendo em conta que o estilo de música Acid House era considerado ilegal por ser novidade e chamar mais público a esta cena gratuita, o que causava prejuízo ao ambiente dos clubes noturnos. A composição das imagens não é muito trabalhada, por serem capturados momentos velozes, tendo todas estas dimensões entre 15cm por 10 cm e 10 cm por 10 cm. Descrevendo de uma forma mais profunda estas fotografias, as mesmas mostram tanto o ambiente destas festas como, flyers utilizados para informar que o coletivo estava por perto, artistas em performance, confrontos com a polícia, idas a tribunal e transporte de sistema de som. É notável que existia uma prioridade na identificação visual do grupo, tanto pela decoração feita á mão como por camisolas com designs e frases originais que representavam a ideologia, “MAKE SOME FUCKIN NOISE!”.



Esta exposição foi articulada ainda com outros workshops, estes sendo: “Redesigning Revolution” que explorou a simbologia em movimentos culturais; “Guerrilla Theatre Mask Making” onde se produziram máscaras, estes desenvolvidos por Mark Angelo; e por último “Ableton Live Improvisations” onde artistas falaram do seu processo de improvisação de música eletrónica ao vivo.

Arrematando, esta exposição talvez não seja para qualquer pessoa, porque não é montada de acordo como ditam as regras, ou até por mostrar estilos de vida alternativo, mas sem dúvida que mostra de forma transparente a construção de um espaço importante para a música eletrónica e para o conceito de Free Party, a que muitos se agregam nos dias de hoje.






segunda-feira, 28 de abril de 2025

Fragmentos Híbridos no continuum da realidade - virtualidade



Entre os dias 3 de abril de 2025 e 10 de abril de 2025, a Galeria da Faculdade de Belas Artes da Universidade de Lisboa apresentou a exposição “Fragmentos Híbridos”, a qual se situa no corredor interior da entrada das Belas Artes. A Faculdade é por si um espaço fragmentado pelo tempo -1217, 1858, 1932, 1980, 2025 - pedras gastas pelas pegadas onde se tenta unir a fissura do passado com o presente.  A pedra invade luz bege, paredes expondo azulejos que escondem portas. Se não estiver atento à pequena placa da galeria, mergulha num espaço fragmentado de pedras, portas, degraus e esculturas de gesso. Subindo alguns degraus, do lado esquerdo, o espanto encontrou na parede uma abertura branca e lisa. A profundidade predominou, o vazio surpreendeu até ao vislumbre dos objetos.    
 

Sentiu-se a simplicidade de uma exposição intimista e delicada, onde o espaço foi amplo para o tamanho pequeno dos desenhos, fotos, pinturas e instalações de pequenos objetos, fragmentos e experiências sensoriais. A luz vem de 3 janelas, de alguns pequenos holofotes acentuando o brilho refletido nas paredes e nas composições. No fundo mais escuro, desenhou-se um círculo de luz que destacou um misterioso espaço. Os artistas participantes foram: Carlos Henriques, Catarina Reis, o grupo: João Pedro Costa, Ana Mena, Helena Elias e João Castro Silva; Jorge Forero, Lui Avallos, Marta Lucas, Pedro Ângelo, e os coletivos ARTiVIS e ÉBANO, “as composições plasmam diferentes temporalidades e estágios matéricos, colapsando planos visuais que evocam tanto a teoria “da matéria vibrante de Jane Bennett, como o “conhecimento situado de Donna Haraway e “o sujeito nómada de Rosi Braidotti.”

Os folhetos da exposição ressaltavam ao olhar pela imagem ilustrativa da capa e a e a sua relação com o título, Fragmentos Híbridos. Acompanhou bem a visita e a reflexão sobre os conteúdos teóricos e informativos.  Continha um QR code para aceder à Realidade Aumentada, Artivive, uma ferramenta revolucionária que ajudou a transformar a maneira de olhar a exposição. O acompanhamento foi contínuo no descobrir dos fragmentos correspondentes que formavam, assim, um todo. “Através de uma seleção de imagens e objetos de diversos artistas, a exposição apresenta fragmentos que ora se manifestam como documentos, ora se reconfiguram como “imagens sobreviventes” de Georges Didi-Huberman, surgindo em novas materialidades e ambientes digitais que mantêm a latência das suas aparições anteriores.” As imagens fantasmas, as que “sobrevivem nas fotografias”. O folheto foi dando a conhecer a exposição, através do mapa da galeria, e a possibilidade de ler e pesquisar para aprofundar e conhecer os diversos projetos. Um bom guia informativo e didático, para quem não é desta área “A exposição Fragmentos Híbridos, emerge no âmbito das materialidades híbridas e de processos artísticos baseados na prática. Explora-se assim a potencialidade especulativa do fragmento como conceito operativo nas artes e como recurso para a formação em investigação artística no ensino superior.” Partindo da ideia de que uma porção de algo pode renascer e recriar qualquer outra “coisa”, a mostra propõe situações experimentais que articulam diferentes corpos materiais no continuum da realidade-virtualidade. Este processo visa promover o diálogo entre sujeitos e materiais, que também podem ser sujeitos.”
A organização do espaço foi fluida no seu percurso, sendo este contínuo. A disposição das obras ajudou na compreensão da intenção dos conteúdos. As ferramentas digitais ou virtuais estiveram disponibilizadas na exposição. Num fluxo grande, houve sempre a possibilidade de aceder ao QR code e utilizar a ferramenta Realidade Aumentada no telemóvel. Deu a ideia de que os materiais não são meros recipientes passivos de experiências, mas entidades ativas, portadoras de histórias. Há uma energia latente em tudo o que existe: uma potência que vibra, embora invisível, presenteia o mundo com uma presença além da humana. O percurso iniciou  por um pequeno desenho de um fragmento arqueológico, com o nº1, no qual foi utilizada a Realidade Au
Planta da galeria, percurso numerado e títulos das composições


  

                                               Nº1     Nº2
                                                                                                                 
                                                         
                                                        


                 

Continuando por 3 composições sem título pode-se, assim, ver dois mundos, duas visões, nas quais se deixou a perceção divagar e surpreender-nos.




As emoções evadiram e tudo se transformou num percurso de espanto e curiosidade. O espaço começou a ser mais pequeno, mas os objetos continuaram a contar a sua história e memórias fantasmas. A mostra propôs situações experimentais, as quais interagiram fragmentadas com o corpo e o espaço. A RA desvendou essas memórias interiores.                                                              

 


“Inspirando-se na noção de tessera da crítica literária de Harold Bloom, (1973), e no conceito de constelação enquanto processo criativo dinâmico de Helena Elias, (2019), que resgata a complexidade, significado e autonomia do fragmento de Luísa Perienes 2010), Fragmentos Híbridos expande o conceito de “fragmento nómada proposto por Helena Elias, Mónica Mendes, Pedro Ângelo e Marta Lucas (2024)”. “Numa progressão de texturas, espaços e materializações híbridas, a exposição é um convite à imersão através de experiências multissensoriais, do desenho e da pintura aos fragmentos de múltiplas proveniências, aos conteúdos em Realidade Aumentada e Realidade Virtual.” 

       

             https://www.belasartes.ulisboa.pt/o-fragmento-nomada-workshop- do-projecto-caphe/

 

  


      
                                                             projeto CAPHE  
         A Curadoria da exposição foi da Helena Elias (professora auxiliar a tempo inteiro no departamento de escultura da FBAUL, coordenadora da unidade curricular de cerâmica e coordenadora da linha de investigação no fazer artístico e científico no VICARTE, supervisionando 3 bolseiros de doutoramento de investigação artística da FCT e liderando o projeto ARcTic South e ela é membro do projeto de pesquisa artística Memory) e da Mónica Mendes (artista de media digitais, designer e professora no Departamento de Arte Multimédia. É também investigadora no ITI/LARSYS - Instituto de Tecnologias Interativas, colaboradora no CIEBA – Centro de Investigação e de Estudos em Belas-Artes, da FBAUL, membro fundadora do hackerspace altLab do AZ Labs. Interessada em projetar para um mundo mais sustentável, criou o projeto ARTiVIS, explorando sistemas interativos em tempo real na intersecção entre Arte, Ciência e Tecnologia.). A Curadoria foi eficaz, deu coerência entre as composições e o tema. As curadoras estiveram envolvidas, foram participantes, investigadoras e organizadoras, conseguindo que os conteúdos e os resultados fossem mais coesos. A Exposição relacionou-se bem com as tendências contemporâneas na Arte e na Sociedade, refletindo as diversas preocupações, e tentando uma aplicação mais consistente ao nível da Realidade Virtual e da Inteligência Artificial. Uma exposição com um teor didático devido às práticas de Workshops com outras Faculdades (Quénia) e na própria FBAUL, com alunos. Novas metodologias em escultura com ações criativas em 3 ambientes: sala de aula, atelier, residência artística; as dinâmicas foram decorrentes da prática/reflexão; o conceito de constelação como processo dinâmico criativo: imagem migrante, mesa de montagem/ tessera. “As experiências resultantes abrem caminho para novas abordagens na educação artística, especialmente no que respeita à investigação artística e à sua transferência de conhecimento.“Em particular, a exposição dá a conhecer o trabalho de investigação artística desenvolvido por doutorandos da FBAUL no âmbito das atividades do projeto CAPHE…Neste enquadramento, incluem-se conteúdos documentais realizados durante as mobilidades efectuadas aos países dos seus parceiros, nomeadamente as explorações artísticas assumidas no treino de investigação ao nível do 3º ciclo FBAUL.” Foi uma experiência Híbrida, enriquecedora culturalmente, lúdica, experimentalista nas diversas realidades em que andámos (atual, passada, do sonho, digital, virtual, aumentada…) e importante para a Educação Artística ao nível da formação dos professores. Sem dúvida que foi uma exposição inesquecível para quem a fruiu, principalmente nas Salas Fechadas Virtuais - Os Quatros Elementos, e na visita à Sala da Exposição Virtual -  Avatares,sem faltar o normal “AAAH!”

Apoios de ITI/LARSYS, VICARTE e LiDA – (ESAD.CR/ IPL) com a parceria da CAPHE©2025 - COMMUNITIES AND ARTISTIC PARTICIPATION IN HYBRID ENVIRONMENTS – HORIZON EUROPE PROGRAM UNDER GRANT – AGREEMENT NO. 101086391

https://iti.larsys.pt/project/artivis/                                                                      https://iti.larsys.pt/                https://www.artivive.com/                                                       https://www.ebanocollective.org/team/ 

http://artivis.net/about/                                                                         https://vicarte.org/projects/

https://lida.pt/pt-pt/about/