quinta-feira, 8 de junho de 2023

Revista é Sempre Revista! _ Um espetáculo teatral português da alegria!

 

Fonte: Fotos da autora tiradas no dia da apresentação.

 

 

Oeiras, 07/06/2023



Um espetáculo de encher os olhos no Teatro Politeama em Lisboa! Canto, dança, música e narrativas que contam de maneira jocosa, através de sátiras e ironias sobre o teatro de revista em Portugal, seus personagens e contextos, e revive a “revista” como um gênero teatral que trás o riso e a crítica social como mobilizador da ação cênica. Como um dos próprios atores se refere no palco, em que a revista é “a arte de ser português”, Filipe La Féria nos vai revelando pouco a pouco, em um espetáculo de variedades, os personagens que fizeram da revista portuguesa um sucesso de público e entrelaçando assim a tradição com a contemporaneidade. 

Os atores e dançarinos em figurinos graciosos e ricos em detalhes, contam-nos sobre experiências vividas pelos artistas, os de ontem, de meados do século XX, que fizeram a revista portuguesa quando a mesma nasceu, assim como os de hoje, que nos trazem a revista contemporânea. Em cenas que remetem ao quotidiano, o espetáculo mostra também pessoas comuns, bem como críticas aos políticos e autoridades, expondo as mazelas sociais, criando conexões com os tempos atuais, unindo a revista do passado à revista do presente.

Vamos da plateia rindo e nos emocionando com a atuação dos atores no palco que buscam em muitos momentos a interação com o público, quer seja nas brincadeiras endereçadas a alguém da plateia, que nos leva a gargalhadas, quer seja no chamamento às palmas ou até mesmo, na narração engraçada de uma estória que se comunica com as nossas vivências do dia-a-dia, ou através dos números cantados e dançados e interpretados ao ritmo do fado. É como se subíssemos ao palco a cada atuação e vamos a cada instante sendo convidados a bater palmas, a cantarmos, nos envolvendo e divertindo juntamente com o elenco, dando um ritmo especial ao espetáculo que nos vai afetando como a própria vida.

Alguns locais da cidade de Lisboa são citados e assim aos poucos vão sendo construídos através da atuação dos atores contextos variados na nossa imaginação, como o Teatro Apolo, ponto central da revista, o Teatro da Trindade, o Teatro Nacional e o Teatro Maria Vitória, considerado o primeiro teatro do Parque Mayer que fez 100 anos e que foi palco de vários teatros de revista, inaugurado em 1922.


Fonte: Foto da Agenda Cultural.


Enquanto imaginamos os contextos, somos ao som do Charleston, uma dança surgida na década de 1920 na Carolina do Sul na América do Norte, convidados a bater palmas, vão aparecendo então a seguir, as canções e danças populares portuguesas, o público reconhece as canções e vão seguindo cantando com os atores e cantores, momentos especiais vão sendo criados em que a plateia e os artistas fazem a festa, o espetáculo de revista. Neste palco da alegria e da irreverência, os atores e atrizes vão personificando acontecimentos, e dando vida a personagens, a conceitos, e a instrumentos políticos, como a censura. Personificada como uma velha senhora, a censura, símbolo da repressão, é representada pela atriz que afirma ser contra a revolução, figura vigente nos períodos da monarquia e da ditadura. Todos no palco gritam, evocando o pensamento crítico em meio à brincadeira e a alegria.

O espetáculo vai-se tornando também uma homenagem aos artistas da revista, surgem no palco grandes painéis com os retratos de cantores, atores, coristas e vedetas que se sobressaíram no teatro de revista, citando alguns nomes como: Eunice Munhoz (1928-2022), Beatriz Costa (1907-1996), Ribeirinho (1911-1984), Vasco Santana (1898-1958), Eugenio Salvador (1908-1992), Ivone Silva (1935-1987) e que são interpretados pelos artistas da companhia. Através de cantorias que unem o fado às narrativas de vida dos artistas da revista de um tempo longínquo, pelas memórias de tempos idos vão sendo reveladas à plateia, com humor e emoção, sentimentos pensamentos e modos de ser.

                                                                Fonte: Foto da Agenda Cultural.


A crítica mordaz, a sátira e as piadas preenchem o palco com personagens que de suas palavras relatam a obscuridade das ações de agentes políticos que prejudicam a população, gerindo mal os recursos. Para ilustrar, em um determinado momento no palco, entra um ator que interage com outro grupo de atores que representa um rancho folclórico. Como um coro bem jocoso e divertido, este grupo vai reforçando e representando os descalabros provocados pelos agentes políticos à população. Os atores se utilizam do exagero nas expressões corporais e nas repetições das ações e falas, para ressaltar o desespero como consequência das ações desastrosas que acometem a população vitima do desrespeito e da exclusão.

Como em um ato de manifestação, indignação e inconformismo, com piadas e duplos-sentidos, os personagens vão relatando à plateia os problemas atuais, como por exemplo, os 125 euros de apoio extraordinário dos ordenados, o aumento de 50% das reformas em um mês, e da retirada de 30% ao ano nos impostos, o aumento do leite, do gás, das fraudas, da gasolina, do aumento constante das taxas e mais taxas e taxinhas.

 Como um ato de revolta o coro repete:

Já chega! Somos pobres! Também quero agradecer a Marcelo, o Marcelinho. É fome! É miséria! É injustiça! Falta de habitação! Se alguém souber de um T0 por menos de 100 euros...é que fico esperando vocês rirem das desgraças.

A plateia se diverte e é convidada pelos atores para acompanhar com palmas o canto, que vai se tornando cada vez mais crítico e sendo acompanhado pelas danças folclóricas que reforçam toda a situação de desagrado e desespero da população representada pelos atores em cena. Uma cena inusitada quando uma vedeta entra no palco em desespero por não ter comida para fazer uma sopa. O canto é crítico, dando destaque ao preço do pão, do leite, do bacalhau. Em meio às piadas, as cantigas de fado seguem emocionando, gerando dramaticidade e vão revelando personagens de revista de outrora. A plateia canta juntamente com os atores uma das canções de Lisboa que diz em coro:

 Lisboa tem cheiro de flores e de mar, cheira bem, cheira a Lisboa!

Quando o espetáculo se aproxima do fim o ápice das interpretações dos atores vai se dando através dos variados solos de fado. As vozes incríveis dos atores entram em conexão com a emoção da plateia que busca acompanhar cantando. Retornam narrativas de vida, as vedetas contam as suas histórias, dando vivacidade à apresentação, que não reduz a energia e empolgação em nenhum momento, dando ritmo ao espetáculo nas alternâncias das variadas cenas. Um dos atores ressalta que a vida é bela! Um teatro que vai se mostrando alinhado com as causas sociais, humanitárias e instigando a plateia a compartilhar com o riso e as palmas, o que é dito com o coração.

Vamos sentindo que não queremos que o espetáculo acabe. Tudo vai se tornando uma ode à alegria. Em meio às plumas das vedetas, seus cômicos e dramáticos relatos e em meio as cores dos figurinos que encantam o olhar, as letras das canções vão-se  posicionar como em alto relevo no palco, mais um convite para que as  pessoas da plateia participem da festa da revista, lendo do telão, cantando e batendo palmas juntamente com os atores.

 E a plateia vem abaixo nos risos, quando entram em cena os times de futebol, Benfica, Porto e Sporting, personalizados pelos atores que rivalizam entre si com muito humor, levando as pessoas que assistem às gargalhadas, ao som das cantigas dos times e das canções populares portuguesas. Um show à parte. Vamos sentindo mais uma vez que o fim do espetáculo se aproxima, uma das vedetas convida a entrar no palco todo o grupo, mais uma vez atores e plateia cantam e se divertem com um espetáculo onde predomina a alegria e saímos do Teatro Politeama com o coração aliviado e feliz e com a mensagem que nos foi deixada pelos atores:

Deixem esse teatro com uma gargalhada! A vida vale a pena se tivermos a coragem de rirmos dela! Porque Revista é sempre Revista!

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