segunda-feira, 18 de dezembro de 2017

Turbulências : obras da coleção de arte contemporânea "la Caixa" - Cordoaria Nacional

A exposição Turbulências fez parte da programação artística do programa Lisboa Capital Ibero-americana de Cultura. Com curadoria de Nimfa Bisbe contava com 40 obras de 18 artistas em diferentes meios como pinturas, fotografias, instalações e vídeos Colocando as questões da periferia global como centro do debate, os trabalhos tratavam de temas contemporâneos como fronteiras, imigrações, poder, pobreza, nacionalismo e revoltas.Artistas consagrados ocuparam os dois andares do prédio da Cordoaria Nacional entre os dias 8 de setembro e 3 de dezembro de 2017. A exposição tinha como objetivo claro dar voz ao pensamento artístico periférico e ao olhar crítico sobre questões pertinentes a nossa sociedade global contemporânea. Dentro os trabalhos expostos alguns chamaram a atenção por sua força.
Exposto logo da entrada estava um dos trabalhos mais emblemáticos da exposição.A projeção do vídeo Centro di Permanenza Temporanea de Adrian Rici. Esse é um trabalho aparentemente simples mas de uma força poética imensa. Os centros de permanência temporária podem ser entendidos como os lugares onde imigrantes ilegais são mantidos antes da deportação, um lugar temporário/ transitório. Embora seja um trabalho de 2007 suas questões são cada vez mais latentes. Uma escada de avião isolada em um pátio de aeroporto aos poucos é ocupada por um grupo de imigrantes ilegais que ali esperam como uma performance, registrada em vídeo que se encerra sem que essas pessoas saiam dali. A deportação é o momento onde um corpo tem seu lugar negado e é expulso, forçado a se deslocar, um impacto direto da fronteira sobre o corpo. O registro da espera por esse momento é feito de uma forma simbólica através da escada, trazendo a tona as histórias e trajetos desses indivíduos e como todos acabaram com o mesmo fim, uma espera pela o repatriamento. Essa escada é acima de tudo mais um elemento de transição, quase como uma nova fronteira, entre os desejos e o duro choque da realidade. Um lugar onde o indivíduo se encontra num estado de espera permanente.


Still frame de Centro di Permanenza Temporanea 


Outro trabalho que me chamou muito a atenção foi a série de fotografias da dupla de artistas Bleda e Rosa. O trabalho intitulado de Campos de Batalhas trata da geografia das revoltas. Uma série de retratos de paisagens com legendas que nos indicam que em cada um daqueles lugares retratados grandes batalhas foram realizadas em outros tempos. As legendas invocam a memória daqueles lugares e a aparente tranquilidade reforça a esmagadora força do tempo. As fotografias remetem a história de uma forma absolutamente inesperada, um registro aparentemente tardio e ao mesmo tempo um registro do espaço e do tempo . Elas não funcionam como um registro de ações mas como uma forma de resgatar as ações de outros momentos, que marcaram esses lugares não em sua paisagem mas em sua história.

O trabalho de campo feito pelas artistas para registrar esses lugares por toda América nos dias de hoje, que aparentemente é quase que sem sentido ou em vão, ganha uma grande força com a forma em que as fotografias são exibidas com as legendas. Registros de batalhas no México, Canadá, Argentina e outros países americanos, no relembram como as fronteiras e as sociedades americanas foram forjadas por conflitos e mortes, muitos deles esquecidos pela história e apagados das paisagens.


Campos de Batalla de Bleda y Rosa





De uma forma geral a exposição é bem sucedida naquilo que se propõe. Outros trabalhos como as fotos de Cao Guimarães e a instalação audiovisual de Apichatpong Weerasethakul  reforçam o diálogo multicultural e o foco em questões sociais da exposição. Embora os trabalhos em sua grande maioria sejam críticos a globalização e apontem para algumas das desigualdades e problemas trazidos por esse processo como os conflitos sociais, a exposição consegue traduzir também o aspecto do sincretismo cultural e da multiculturalidade de uma forma positiva. A visibilidade dada às questões políticas trazidas pela exposição Turbulências é a meu ver de caráter fundamental para a arte contemporânea nos dias de hoje, dando voz aos excluídos. As reflexões propostas pelos artistas da exposição são uma narrativa paralela a arte dos grandes centros. O que vemos nos dois andares da exposição são artistas periféricos assumindo uma posição de porta vozes das condições marginais, com discursos fortes, coerentes e pertinentes. Fica evidente que independente da origem dos artistas, a exposição consegue abranger questões que comuns aos territórios à margem do centro do capitalismo global.










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