quinta-feira, 12 de dezembro de 2024

A New Wave - Pós-modernismo no design britânico de capas álbuns post-punk pt.1

Pós-Modernismo no Design

 

Cartaz de festival de música clássica em Zurique design by Josef Muller-Brockmann, 1957

Durante uma grande parte do séc XX design o design Modernista tinha-se definido como a norma de abordagem projetual e estética, a certo ponto, já nos anos 1970 havia-se tornado rígido e desconectado, o que deu origem ao Pós-modernismo, um movimento de contracultura que rejeitava as normas e pretendia ser mais acessível e apelativo. Este movimento, presente na arte, arquitetura e design, trouxe uma nova era de liberdade artística, caracterizada pela diversidade de formas, autoconsciência de estilo e a rejeição de um significado único e inerente na arte. Os pós-modernistas valorizavam o contingente e o temporário, rejeitando a ideia de progresso linear e teorias totalizantes. Subvertiam o materialismo e conformidade do Modernismo, com a mistura de estilos e a procura de inspiração no passado, priorizando a liberdade criativa sem restrições.

Nos anos 70, o Pós-modernismo destacou-se também no contexto musical, compartilhando a crítica ao modernismo, que se tornara comercial e materialista. Estilos como Rock Psicadélico, Punk, New Wave/Post-punk e música Eletrónica marcaram esse período. O design gráfico teve um papel essencial especialmente nas capas de álbuns, que expressavam visualmente a atitude dos músicos. Designers britânicos como Barney Bubbles, Peter Saville, Malcolm Garrett e Neville Brody foram fundamentais na indústria de capas de álbuns, tinham influenciado a estética pós-moderna, colaboraram com músicos renomerados, e tinham o fator de  estarem interligados na cultura jovem e música popular, distantes do mainstream do design profissional.

Entender a Arte da Capa de Álbum

A arte da capa de álbum sofreu muitas alterações desde a sua primeira concepção em 1910, foram do físico para o digital dentro de um período de tempo relativamente curto, sendo influenciadas pela tecnologia. Quando Alex Steinweiss criou a primeira capa para Columbia Records, nos anos 30, o número de venda de álbuns com capas ilustradas aumentou. Permitiram ao público relacionar-se de uma forma nova e mais pessoal com a música do disco.

 

Smash Song Hits by Rodgersmart, Columbia Records designed by Alex Steinweiss, 1940s

Além de sua função conceptual e criativa, as capas de álbuns são ferramentas de marketing, fundamentais para a imagem da banda e a criação de logos e transformar as mesmas em marcas. As ilustrações nas capas formam uma primeira impressão importante, pois ser visualmente captivante pode atrair consumidores, até mesmo aqueles que não conhecem ou não gostam da música.

Inclusive ter uma função conceptual e criativa, as capas dos álbuns também servem como ferramenta de marketing desenvolvidas para propósitos comerciais. Ao longo do tempo foi adquirindo uma importância na imagem geral da banda, contribuindo para a criação de logos de banda e, consequentemente, transformando as mesmas em marcas. As obras utilizadas nas capas eram essenciais em formar uma primeira impressão positiva, uma nova parte intrínseca para qualquer álbum musical: ser visualmente cativante tem o potencial de fazer um consumidor comprar uma obra que talvez nem gosta.

Desde o início do modernismo, a produção visual e a musical estabeleceram uma relação íntima. Com o séc.XX  havia-se criado uma troca fértil entre sons e formas, manchas e melodias, e diferentes espaços de composição e performance.
Já na década de 80, começou a se perceber que o primeiro contato consciente dos jovens com o Design Gráfico ocorria por meio das capas de discos.

O cenário Britânico

No Reino Unido, as tendências pós-modernistas assumiram uma forma diferente em relação aos EUA. Enquanto críticos americanos tentavam categorizar o movimento como "nova onda"(new wave) ou "pós-moderna", na Inglaterra não houve uma definição clara desse conceito. A new wave pós-modernista britânica foi fortemente associada à cultura jovem e à música popular, com os designers a afastarem-se do design profissional dominante, um gesto pós-moderno por si só.

Se esses designers britânicos passaram a ser chamados de ‘new wave’, foi principalmente por associação. A denominação pertencia, num primeiro momento, ao estilo musical de rock que surgiu no final dos anos 1970, após o punk rock, as figuras chave (do design) — Barney Bubbles, Saville, Brody e Malcolm Garrett — todos produziram designs para músicos da new wave/post punk.

Os seus trabalhos não seguiam um padrão consistente. Era eclético na sua inspiração e pluralista na aplicação de estilos. Embora, às vezes, fosse uma resposta ao modernismo ‘pioneiro’, manifestou-se mais como historicismo e homenagem do que ‘um desejo de subverter’ o que o modernismo posterior havia se tornado. Em algumas circunstâncias, era difícil identificar as fontes visuais específicas dos designs da nova onda britânica, mas isso apenas evidencia a sua ruptura com as normas e convenções predominantes na comunicação gráfica.



Legenda (por ordem de aparência) - New Order - Movement, 1981, by Peter Saville; Buzzcocks - Orgams Addict, 1977 by Malcolm Garrett;  23 Skidoo - Seven New Songs / Tranquiliser I & II, 1984, by Neville Brody

O design gráfico pós-punk acompanha de perto as operações culturais casuais do rock e da música pop (tendências, influências, híbridos, colisões, etc.) do que as noções filosóficas de ofício, habilidade, expressão, originalidade, etc., que se fomentaram e filtraram através do modernismo da primeira metade deste século.

Malcolm Garrett considerava a maior mudança da era da new wave como: um movimento "de saída da direção de arte (art direction) e introdução para o design gráfico", em que  as pessoas perceberam que isso podia ser feito, e feito bem. Garrett, Peter Saville e Jamie Reid exerceram para mudar as coisas. Concluíram que tinham de ‘destruir o departamento de arte interno’. A ideia de que um designer poderia ser uma parte integral da evolução e desenvolvimento de uma banda começou a surgir, mesmo antes da banda assinar com as gravadoras, que — de maneira implícita ou explícita — deixaram que os departamentos de arte internos simplesmente desaparecessem.

New wave created a better understanding of the power of graphic design to shape language, convey meaning, and communicate.” - Malcolm Garrett

A New Wave - Pós-modernismo no design britânico de capas álbuns post-punk pt.2

Apreciação e Apropriação Histórica

Adicionalmente, no design pós-modernista das capas de álbum destacou-se a apropriação de elementos do passado com uma abordagem relativamente inovadora para a sua época.
Para entender tal acontecimento é preciso realçar o antecessor/catalisador deste interesse pelo passado (sob contexto pós-modernista dos anos 80) no mundo de design de álbuns, o disco Die Mensch-Maschine do grupo de música eletrónica alemão Kraftwerk. A capa do álbum (nome traduz para Homem-Máquina) , projetada por Karl Kleefisch, transmitia imediatamente que tanto a música quanto o estilo visual eram uma diversão radical do mainstream. 

 

Frente e verso da capa Die Mensch Maschine, Kraftwerk 1977, by Karl Kleefisch

O design utilizava linhas diagonais e tipografia geométrica e robusta, evocando o estilo do Construtivismo Russo dos anos 1920, especialmente a obra de El Lissitzky, um artista pioneiro de vanguarda. Embora o visual não fosse uma paródia direta, o design comunica duas ideias principais: uma noção que a música era "vanguardista", que desafia os limites da exploração artística e musical; e que também era "futurista", sugerindo um mundo inovador e diferente do que a antecedia.

Depara-se com uma possível contradição: enquanto a música era futurista e projetada para o futuro, os elementos visuais da capa remetiam ao passado, especificamente a um estilo associado aos Construtivistas Russos, movimento do início do século XX associado ao fracasso político e à declínio dos seus ideais fundamentais. Se a música do Kraftwerk era tão nova e progressista, por que escolheram representá-la com uma estética histórica ligada ao fracasso? Na capa do álbum destaca-se, assim, uma tensão entre a natureza visionária da música e as referências visuais ao passado, sugerindo uma relação complexa entre futuro e passado na identidade visual e musical do grupo.

A capa do Kraftwerk foi um dos primeiros indícios de uma tendência que o fenómeno pós-moderno adotaria. No design gráfico, isso era particularmente evidente no setor de design das capas de vinis que na altura estava em constante crescimento e era um campo que permitia a experimentação.

Contexto para o revivalismo

Estas manifestação criativa, foi considerada por Fredric Jameson (crítico literário e teórico que analisou o pós-modernismo e cultura contemporânea) um efeito da situação artístico-cultural da década de 1980, onde os artistas e criadores depararam-se com um esgotamento criativo, devido à sensação de que todos os estilos possíveis há haviam sido explorados, tal situação leva os artistas a apenas replicar ou imitar os já existentes, em vez de criar novos estilos.

Jameson destaca duas formas pelas quais essa ‘imitação’ ocorre: paródia e pastiche. A paródia copia um estilo, mas adiciona um elemento que o ridiculariza ou destaca as suas peculiaridades, sendo possivelmente uma peça que faz as pessoas rir ou pensar criticamente. O pastiche, por outro lado, também imita um estilo, mas sem humor ou crítica. Trata-se de uma homenagem sincera a um estilo do passado, imitando-o sem tentar fazer uma declaração.

Embora o design gráfico tradicional sempre tenha tirado inspiração de outras áreas, no pós-modernismo, esse empréstimo torna-se mais numa celebração dos estilos do passado, sem necessariamente tentar transmitir algo novo ou crítico sobre eles.

Barney Bubbles

No Reino Unido, no final dos anos 1970, Barney Bubbles foi uma figura fundamental no desenvolvimento do design gráfico pós-moderno. Já era uma influência para uma geração mais jovem de designers, devido ao seu trabalho anterior nas cenas psicadélica e punk dos anos 1970. A habilidade excepcional de Bubbles como criador de imagens da ‘new wave’ no período pós-punk logo se revelou na capa do álbum Music for Pleasure da banda The Damned (1977),assim como no caso de Kraftwerk, a capa não é exatamente uma paródia — é mais uma homenagem que abraça alegremente seu material de origem, com humor. Bubbles estava disposto a usar qualquer coisa que funcionasse. Há um propósito nesta capa – mas há simultaneamente um desejo embutido no seu design de que você talvez não perceba esse propósito.

The Damned Music For Pleasure 

Frente e verso da capa  Music for Pleasure, The Damned, 1977, by Barney Bubbles- uma composição semi-abstrata, reminiscentemente de Kandinsky, construída com linhas, ziguezagues, semi-círculos, símbolos e planos de cor misturados numa composição vibrante de energia cinética. O nome da banda e os retratos dos membros estão camuflados na confusão visual. A brusca mistura de influências artísticas: o bloco oriental (o suprematismo de Malevich, o estilo eclético Bauhaus de Klee, o construtivismo de El Lissitzky, as improvisações de Kandinsky, os cartazes revolucionários russos, etc.) encontra o bloco ocidental (ácido, day-glo, logotipos de produtos dos anos 50, desenhos animados da Warner Bros., etc.). Em vez de ser exibida como um exercício intelectual, a cruzada de referências e mutações selvagens é colocada a serviço das piadas visuais autodestrutivas da capa (a tipografia ilegível e as caricaturas faciais escondidas).

Saville, Garrett e Brody’s abordagem de álbum design

Malcolm Garrett e Neville Brody, dois designers britânicos influentes, ficaram impactados com o trabalho de Bubbles. No entanto, eles, juntamente com Peter Saville, encontraram ainda mais inspiração nos movimentos artísticos e de design do início do século XX, como o modernismo, o livro Pioneers of Modern Typography (1969), de Herbert Spencer, que introduziu-lhes trabalhos como os futuristas, os dadaístas, Lissitzky e Tschichold.

Brody diferencia as abordagens de simplesmente copiar esses estilos antecedentes e de aprender com eles. Considerava importante analisar as ideias centrais e os motivos por trás desses movimentos, em vez de replicá-los diretamente. Brody fazia-o ao aproveitar o seu senso de energia, foco humanista e disposição para desafiar as regras convencionais. Com esse entendimento, os designers poderiam criar algo novo com base nesses princípios.

Em 1990, Malcolm Garrett criou o termo "Retrievalismo"(retrievalism) para descrever o seu processo criativo, resumido como "Toda arte é roubo". Essa ideia sugere que, em vez de criar algo totalmente novo, os artistas extraem de um vasto repertório de estilos e ideias do passado. Garrett acreditava que a verdadeira invenção é um mito, e que os artistas inevitavelmente reutilizam e transformam materiais existentes para criar algo para o presente e futuro. O "Retrievalismo" respeita o passado, mas evita a nostalgia, buscando reimaginar seus elementos para construir uma cultura nova e voltada para o futuro.

Acreditava que, embora a inovação estilística genuína fosse difícil, a recombinação de elementos históricos ainda poderia gerar criações relevantes. No entanto, o seu método pode vir a reduzir o significado original dos elementos do passado a meros elementos decorativos, perdendo o seu impacto e contexto.

O efeito do trabalho e obra de Saville não residia apenas nas suas apropriações precisas, quase forenses, mas também na maneira como esses designs conectavam-se com a música e a identidade da banda. Os seus designs tornaram-se uma parte integrante da imagem da banda New Order e da gravadora Factory Records, contribuindo para a mística e a visão artística associadas lhes era associada. Esses designs eram mais do que simples objetos gráficos; estavam profundamente ligados às ideias e ao ethos da música e ao contexto cultural mais amplo em que foram criados.

A capa de Procession foi diretamente influenciada por Depero, baseada numa publicação futurista de 1933. A única mudança notável foi a remoção do título "Dinamo Futurista." Embora alguns possam argumentar que os designs de Saville não fossem uma cópia direta, eles representavam uma forma de "apropriação" pós-moderna, uma tendência no início dos anos 1980, onde artistas contemporâneos pegavam obras antigas e as recontextualizavam em novas criações. Esse método era semelhante ao que ocorria no mundo da arte, onde as obras de artistas anteriores eram usadas como fontes para novas criações reinterpretadas. Saville explicou que achava mais "honesto" e intelectualmente satisfatório citar o Futurismo diretamente, em vez de tentar uma paródia mal feita. Ele considerava essa abordagem literal mais genuína, e ficou surpreso que as pessoas assumissem que havia inventado o design por completo.


Procession, album 1981, New Order, by Peter Saville


Dinamo Futurista, revista, 1933, by Fortunato Depero



O Catálogo do IKEA

Desde a sua concepção, o IKEA começou a construir uma presença marcante na indústria de móveis e no design, abrangendo tanto produtos/equipamentos quanto elementos gráficos. O catálogo do IKEA tornou-se um elemento icónico da marca, moldando não apenas os hábitos e a experiência de compra dos clientes, mas também servindo como um pilar visual e gráfico. Ele atua como uma extensão da identidade da marca, consolidando a imagem do IKEA como sinônimo de design acessível e inovador.

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Origem do IKEA

O IKEA começou como um negócio modesto de materiais de vendas por correspondência nos anos 1940, comercializando itens como canetas, relógios e meias/collants de nylon, com o fundador Ingvar Kamprad, que inicialmente tinha o apoio da família para administrar e trabalhar no seu negócio. Em 1948, a empresa expandiu para o setor de móveis, colaborando com fabricantes locais e alcançou um público mais amplo por meio de um formulário de pedidos enviado a 285.000 pessoas em 1949. O sucesso dessa campanha levou ao lançamento do primeiro catálogo IKEA em 1951, distribuído gratuitamente.

No entanto, em 1955, o IKEA enfrentou desafios quando a indústria de móveis estabelecida boicotou a empresa devido aos seus produtos de baixo preço. Isso forçou Kamprad a inovar, levando o IKEA a projetar os seus próprios móveis, um momento crucial que diferenciou a marca. Reconhecendo a necessidade de os clientes experimentarem os móveis presencialmente, o IKEA abriu a sua primeira loja em Älmhult em 1953, combinando os benefícios da conveniência da venda por correio com a experiência tátil do varejo(retail) tradicional.

Em 1969, as atitudes dos consumidores em relação aos móveis haviam se transformado. Antes vistos como um investimento de longo prazo, os móveis passaram a refletir tendências de moda, priorizando estilo e funcionalidade em vez de permanência, longevidade e durabilidade para as futuras gerações (contando que durasse +10 anos, por exemplo). Essa mudança marcou uma nova era, na qual as pessoas começaram a comprar com mais frequência, especialmente num período de um ano. A adaptabilidade e o foco no cliente do IKEA posicionaram a empresa para prosperar nesse mercado em constante evolução.

Impacto do IKEA

O IKEA é baseado em três princípios fundamentais que revolucionaram o varejo(retail) de móveis: autoatendimento, apoiado por catálogos atraentes e informativos; móveis desmontados, projetados para que os clientes os montem sozinhos; e um modelo de cash-and-carry (pagar o item por inteiro no momento de compra para levar logo consigo) adaptado para lojas em áreas suburbanas.

Nordic Values

O IKEA incorpora valores nórdicos fundamentais: a simplicidade despretensiosa, acessibilidade democrática e funcionalidade prática, sempre mantendo o foco na qualidade e no design elegante. Embora os seus móveis mais acessíveis não rivalizem o artesanato de alta gama, oferecem excelente custo-benefício em comparação com os concorrentes de preços semelhantes, tornando o mobiliário moderno e estiloso acessível a muitas pessoas. Os acessórios para casa e utensílios do IKEA são especialmente apreciados pela combinação de qualidade e preço acessível, aprimorados por um toque de elegância do design nórdico.

No centro da filosofia do IKEA está o Design Democrático, que equilibra cinco elementos essenciais: função, forma, qualidade, sustentabilidade e preço baixo. Essa abordagem reflete o ideal nórdico de igualdade, garantindo que produtos estilosos e de alta qualidade estejam ao alcance do maior número possível de pessoas. No Design Democrático é fundamental para alcançar a visão do IKEA de “criar uma vida cotidiana melhor para muitas pessoas.”

Tal como a coleção de moda

O IKEA trouxe o consumo em massa para o mundo da decoração ao adotar o conceito de coleção, inspirado nas tendências da moda. Essa abordagem envolve a renovação contínua das suas ofertas, uma estratégia que os críticos chamam de fast furniture, semelhante ao fast fashion, proveniente da área da moda . O termo "fast" reflete o rápido ciclo de produção e consumo de novos modelos, estilos e cores, que se tornam símbolos de um estilo de vida ideal.

Vintage IKEA designs reissued: Third drop of the Nytillverkad collection –  IKEA Global
 

Nesse sentido, o IKEA funciona como uma marca de moda dentro da indústria de móveis. Assim como na moda, não é a demanda do consumidor que molda o mercado, mas a introdução constante de novos produtos e técnicas de marketing que impulsionam o consumo.

Curador de gostos

O IKEA posicionou-se como um curador de estilos de vida modernos, oferecendo um destino único para uma vida acessível e estilosa. Com a missão de "criar uma vida cotidiana melhor para muitas pessoas", a marca atrai todos que aspiram a um estilo de vida de classe média, tornando-se um fenómeno global.

Rompendo com as normas tradicionais do varejo(retail), o processo de design do IKEA começa com a funcionalidade e um preço-alvo muito baixo. Os custos são meticulosamente reduzidos sem comprometer a qualidade, assumindo o desafio de criar produtos bonitos e funcionais que permaneçam acessíveis.

Mais do que simples objetos, os designs do IKEA refletem e moldam gostos pessoais, atitudes e aspirações, incorporando mudanças culturais e sociais enquanto tornam o estilo acessível para todos.

Popularização de flatpack

O IKEA revolucionou o varejo(retail) de móveis com o seu conceito inovador de flatpack. Ao vender móveis desmontados em embalagens compactas e planas diretamente dos seus próprios armazéns, o IKEA integra de forma otimizada a produção, a distribuição e as vendas num modelo coeso. Essa abordagem não apenas simplificou a logística, mas também tornou os móveis mais acessíveis e económicos.



 

Guiado pelo mantra "Nós odiamos ar", o IKEA minimiza o espaço vazio nas embalagens, reduzindo os custos de transporte e acaba por transferir os benefícios de custo para os clientes. Ao diminuir o volume de produtos como cómodas e mesas para os envios, a empresa garante custos mais baixos e preços competitivos, reforçando o seu compromisso com a acessibilidade e a eficiência.

Cliente consumidor/produtor

O IKEA transformou os clientes em participantes ativos no processo de compra, um conceito frequentemente chamado de "IKEA Way". Os consumidores escolhem, recolhem, transportam e montam as suas compras, contribuindo para a eficiência da empresa, enquanto os consumidores entendem/percepcionam isso como um nível aprimorado de serviço. A integração faz com que os clientes se sintam mais envolvidos, mesmo que neste caso acabem por assumir mais responsabilidades.

A experiência de compra na loja IKEA é projetada para ir além da funcionalidade; é promovida como entretenimento para toda a família. Desde o ‘explorar os showrooms’ até aproveitar as áreas de recreação infantil, o processo é envolvente e agradável, transformando a compra de móveis em algo divertido em vez de uma tarefa entediante.


sexta-feira, 29 de novembro de 2024

Can you rebrand a republic?

XXIII Portuguese Government Visual Identity System, Studio Eduardo Aires, 2023


Over the past weekend, I attended a lecture by designer Eduardo AiresThe conference evolved around typography and Aires discussed a recent rebranding done by his studio for of the Republic of Portugal.

The Government's visual identity was changed by António Costa's Executive in the first half of 2023. The objective, as explained in the brand manual, was to adapt the image to the digital environment, in which much of the communication takes place. The lecture provided a detailed description of the strategic and aesthetic choices made, keeping a clear focus on aligning with the spirit of the current era, emphasizing readability, legibility, and suitability for digital platforms.


XXIII Portuguese Government Visual Identity System, Studio Eduardo Aires, 2023


One of the significant elements featured in the new branding is a costume-made typeface, made in collaboration with Dino dos Santos (which attended the lecture as well). The design of the typeface for the Government of the Portuguese Republic involved a careful balance between tradition and contemporaneity, legibility and visual distinction. The resulting font, with its wide range of glyphs and attention to linguistic detail, is capable of representing the image of the Portuguese Republic in different contexts and in over 250 languages, offering a consistent and distinctive tool for Portugal’s communication in the world.


I felt that, although the outcome might be perceived as somewhat simplistic, the process was profound and thorough, with an emphasis on forward movement and modernization, both spiritual and practical. I found a great amount of grace in the way the complexed flag was abstracted in an elegant and playful manner, and I was pleased to discover that the Portuguese Republic had initiated and collaborated on such an endeavor.

As the lecture was over I was keen to know where, and as I ran I quick google search I was surprised to discover that the fresh new branding that just presented has already been shelved, after being at the center of a widely discussed public debate. Apparently the logo had reverted to the old former version. This not only reintroduced the detailed flag, but also added a three-dimensional depth that made the logo unit even more complex than the flag itself.

2023 / 2024

And here we have a worthy subject for discussion – isn't it fascinating how "good" is a subjective state of mind? How many process aimed to make a significant progress moves in a circular way (back and forth) and not necessarily "up" or "forward"? I never imagined that anyone might oppose a progress, especially such an aesthetically reasoned one. I had to dig a bit deeper.


The 24th government came into power on April 2, 2024. An article published on April 4, 2024, describes the following:

Official Government website restores previous logo

The logo change took place immediately after the inauguration of the Prime Minister and the new Government. It was a commitment that the Prime Minister made before the campaign. "Enough of plastic politics", said Luís Montenegro at the time.

Apparently, Luís Montenegro, as leader of the Social Democratic Party (PSD), was highly critical of this new logo prior to being elected. His main criticism was that the logo did not adequately reflect Portugal's history and tradition, particularly regarding the coat of arms and other national symbols. He argued that the government was trying to "rebrand" the nation in a way that downplayed important elements of Portugal's heritage and identity.

Some specific points raised by Montenegro and his party included:

  1. "Aesthetic and historical dissonance": He believed that the new logo, by simplifying and altering traditional elements, created a disconnection from Portugal's established symbols and values.
  2. Absence of key symbols: He pointed out that the official coat of arms (the "five shields" of Portugal) was reworked and was no longer displayed in a form that closely adhered to its historical design, which was an important national symbol.
  3. Political motives: Montenegro and others in his party suspected that the new logo was part of an effort by the Socialist government to create a more "modern" image of the Republic, potentially for political reasons rather than for the sake of national unity and tradition.


While the former government, led by António Costa and the Socialist Party, defended the design as a step toward modernization, this issue became part of a broader political debate about the balance between tradition and modernization in national symbols. Montenegro and the PSD viewed the government's push for the new logo as an example of left-wing political maneuvering, while the government argued that the new design was not about undermining tradition, but rather about making Portugal's identity more approachable and relevant in the modern era.


An article published on April 3, 2024, describes the following:

"The new logo of the Portuguese Republic, launched last year, has been shelved by Luís Montenegro. The decision has been praised by brand and communication experts."


I'll finish with a mesmerizing quote by Carlos Coelho, an outspoken critic of the rebranding (retrieved from the article mentioned above):

“Going back is always better than continuing down the wrong path"


Is it, though? 


quarta-feira, 27 de novembro de 2024

Como é que as Cores Influenciam Emoções através de um objeto Gráfico

O uso estratégico de cores num objeto gráfico vai muito além da simples escolha agradável das cores. Ela baseia-se essencialmente num lado mais influenciado pela psicologia que a envolve. O espiritualismo das cores é um campo que investiga como diferentes tonalidades podem influenciar as emoções, o comportamento das pessoas em relação ao objeto e o impacto que o mesmo tem perante o público a que o objeto é destinado. Essa compreensão das cores permite aos designers criar comunicações visuais que não só chamam apenas a atenção, mas também se refletem emocionalmente com as pessoas. 

Por exemplo, o vermelho é uma cor poderosa, associada a sentimentos de energia, paixão e urgência. Ele é muito utilizado em campanhas de vendas e em chamadas de atenção, pois desperta uma resposta imediata e intensa. Um exemplo clássico é a utilização do vermelho em logotipos como o da Coca-Cola, que promove sensações de entusiasmo e dinamismo. Por outro lado, o azul é frequentemente escolhido por marcas que desejam transmitir segurança e confiabilidade. Empresas como Facebook e LinkedIn optam por essa cor para criar um ambiente de confiança e conexão, ressaltando a estabilidade e serenidade ao público. O azul tem um efeito calmante, que promove sentimentos de paz e lealdade.



O amarelo é a cor do otimismo e da alegria. Utilizado em projetos que desejam evocar sensações positivas, ele é vibrante e chama atenção, mas deve ser usado com moderação para não causar desconforto. Marcas como a IKEA usam o amarelo para transmitir entusiasmo e acessibilidade. Outro exemplo interessante é o verde, que simboliza a natureza, tranquilidade e crescimento. Frequentemente associado a produtos e marcas que promovem sustentabilidade e saúde, como a Whole Foods, o verde comunica um senso de bem-estar e equilíbrio.


Com isto surge-nos sempre perguntas como figurativamente: Como é que isso tem impacto no Design?

Bem parece um pouco óbvio para os mais observadores, é só associar uma coisa a outra. A verdade é que não é preto no branco. A escolha de uma paleta de cores adequada pode fazer toda a diferença na percepção de uma marca, um produto e até mesmo num simples objeto gráfico. O uso incorreto das cores pode causar danos colaterais como equivocar o ser humano devido ás diferentes percepções causadas, ou desviar a intenção inicial para outro público alvo indevido. Alguns exemplos dessa prática foram: o Logotipo das Olimpíadas de Londres em 2012, onde a paleta de cores do logotipo foi amplamente criticada por ser muito vibrante e confusa, causando um certo desconforto visual. Algumas combinações dessas mesmas cores chegaram a ser vistas como agressivas ou desarmônicas. 

Alguns sites e aplicativos com interfaces multicoloridas onde os designs de interfaces digitais têm sido bastante criticados por misturar cores que não criam contraste suficiente ou que cansam a visão do utilizador. O que acaba por dificultar a navegação e a compreensão do conteúdo. E até mesmo algumas marcas de fast-food com cores não tradicionais que tentaram diferenciar-se usando cores como azul ou verde em vez do vermelho e amarelo que são as mais comuns (porque dizem que estimulam o apetite). Essa abordagem, em alguns casos, resultou numa mensagem confusa ou desproporcional do conceito de comida rápida e prazerosa.

O que nos trás á conclusão que uma combinação que reforce as emoções desejadas tem o potencial de aumentar o envolvimento, melhorar a memória visual e gerar uma conexão emocional mais profunda com o público. 

Ainda por cima num mundo como o nosso que é tão saturado de informações visuais. Acho que podemos dizer que a compreensão da psicologia das cores permite aos designers criar experiências mais eficazes e impactantes. 


Por fim, o design é uma ferramenta de comunicação muito poderosa, e o uso inteligente das cores é essencial para transmitir a mensagem correta.


Pergunta para o público: Qual foi a cor que mais te chamou a atenção num item de design e como é que ela influencia a tua percepção sobre o produto ou marca?

Deixo aqui afixado a baixo algumas referências de alguns especialistas na psicologia das cores.


Johann Wolfgang von Goethe: Autor da obra Teoria das Cores, publicada em 1810. Goethe explorou como diferentes cores podem provocar sensações distintas e reações emocionais nos seres humanos. Ele dividiu as cores em categorias baseadas em como as mesmas impactam o humor e a percepção.

Faber Birren: Um dos principais especialistas do século XX na psicologia das cores e autor de livros como Color Psychology and Color Therapy. Birren investigou como as cores afetam o comportamento humano e como podem ser aplicadas para influenciar ambientes e produtos.

Angela Wright: Psicóloga das cores a nível contemporâneo e criadora do Color Affects System, que relaciona cores com traços de personalidade e como essas cores podem ser usadas estrategicamente no campo do design e do marketing.

Josef Albers: Artista e teórico que estudou como as cores interagem entre si. O seu trabalho Interaction of Color examina como a percepção das cores muda de acordo com os contextos adjacentes.

Como é que a Tipografia ajuda a criar uma Narrativa Visual na capa de um Livro?

Já reparas-te como a capa de um livro atrai ou afasta o teu interesse instantaneamente? Ou, qual foi a última vez que escolhes te um livro pela capa? 

Bem como todos nós sabemos, a capa de um livro é a primeira experiência visual que o leitor tem com o objeto. Dentro das inumeráveis escolhas de design a fazer no objeto gráfico, a tipografia desempenha um papel fundamental por ser um elemento que contribui para a mensagem, o tom e o tema do conteúdo do livro mesmo antes de o abrirmos e folhearmos as páginas. Este post é direcionado a abordar um pouco sobre esse tema em especifico. Por exemplo como é que a tipografia, e a escolha das fontes para os pormenores de posicionamento e cor, se torna uma ferramenta poderosa e narrativa visual na capa de um livro. 


A decisão do tipo de letra e do estilo tipográfico é muito importante para atribuir características próprias a cada livro. Por exemplo analisando com mais atenção, uma fonte serifada e clássica pode indicar que o livro se trata de um romance histórico ou uma obra literária enquanto que, por exemplo, se for uma fonte bold e sans-serifa pode sugerir um livro de temas contemporâneos ou técnicos.


Um excelente exemplo dessa prática é o livro “As Vantagens de Ser Invisível” de Stephen Chbosky. Na edição mais conhecida, a tipografia é manual e irregular, transmitindo uma sensação de autenticidade e imperfeição, que reflete o tema de crescimento e autodescoberta do livro. O estilo manuscrito e sóbrio da fonte combina com o tom jovem da narrativa, remetendo ao diário do protagonista. Da mesma forma podemos discutir o layout da tipografia em relação às imagens, cores ou outros elementos visuais da capa. A forma como o texto interage com a imagem pode sugerir movimento, hierarquia ou um ponto focal específico. 




Como no livro da "Alice no País das Maravilhas” de Lewis Carroll. Algumas edições mostram o título em fontes lúdicas, quase "retorcidas" ou "derretidas", integrando-se nas ilustrações surrealistas de personagens como o Coelho Branco ou o Gato de Cheshire. A tipografia brincalhona e excêntrica complementa a natureza fantástica e absurda da história.







Agora a pergunta é: como é que o design pode servir como uma ferramenta de conexão com o leitor? Bem, é simples! O espaçamento, as cores e as letras afetam diretamente a percepção emocional. Uma tipografia arredondada dá uma sensação de suavidade e conforto, ideal para livros infantis ou de auto-ajuda. Por outro lado, letras mais retas e espaçadas em tons escuros podem sugerir suspense ou mistério. Essa escolha alinha o leitor ao conteúdo e provoca emoções que o envolvem na experiência antes mesmo de abrir o livro.


Para quem gosta de observar mais de perto como a tipografia conversa com o design da capa, existem algumas dicas rápidas:

Dica 1: Observe se a capa usa fontes serifadas ou sans-serif – isso pode indicar o tom da história. Fontes serifadas são geralmente usadas para livros clássicos e sérios, enquanto sans-serif sugere temas modernos e acessíveis.

Dica 2: Note o espaçamento e o estilo da fonte; letras apertadas podem indicar tensão ou complexidade, enquanto letras mais espaçadas sugerem leveza e ritmo lento.


Além disso, devemos observar também o layout da tipografia. A forma como o texto interage com a imagem pode sugerir movimento, hierarquia ou um ponto focal específico. Por exemplo, no caso do livro "On Earth We’re Briefly Gorgeous", de Ocean Vuong, a tipografia minimalista sobreposta a uma fotografia em preto e branco cria uma sensação de intimidade e profundidade, refletindo a natureza poética e introspectiva da narrativa.

A tecnologia digital também acrescentou novas possibilidades, especialmente com o uso de fontes personalizadas e digitais. Um ótimo exemplo é a série Harry Potter, cuja fonte personalizada é imediatamente reconhecível e ajuda a criar um vínculo emocional com o universo do livro. Além de estabelecer um “branding” icônico, a fonte faz parte da identidade visual da série, capturando a essência mágica da história.

Assim para concluir, podemos resumir que a tipografia é mais do que uma escolha estética. É uma maneira de contar a história do livro logo na primeira impressão. Daqui a diante experimente olhar para as capas dos livros ao seu redor e tente identificar como a tipografia complementa ou sugere a narrativa.

 Qual é a capa do livro que mais te marcou pela tipografia? 

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sexta-feira, 15 de novembro de 2024

Bruce Nauman's unsettling words

Bruce Nauman is a renowned contemporary artist whose work spans a wide range of media, including sculpture, performance, video, neon, and installation. One of the most intriguing aspects of Nauman's practice is his exploration of language, particularly how words and typography function as both formal elements and conceptual tools. His works often manipulate language to probe the limits of communication, the instability of meaning, and the relationship between language and perception. Typography in Nauman’s work serves as more than just a graphic design element; it becomes a medium for unsettling viewers, challenging them to reconsider how words are experienced and interpreted in the visual realm.


The True Artist Helps the World by Revealing Nature of Human Existence, 1967


In Nauman's neon works, such as The True Artist Helps the World by Revealing Nature of Human Existence (1967), the artist uses bold, direct text to confront the viewer with philosophical and existential inquiries. These neon signs transform the space they occupy, turning the words into physical objects that demand attention. The use of typography in these works is not just for legibility, but also for its ability to create an immersive experience. The glowing, often fragmented letters are rendered in a stark, mechanical font that emphasizes their materiality while also invoking a sense of alienation. By using neon, Nauman amplifies the tension between the ephemeral nature of light and the permanence associated with written language, forcing the viewer to confront the weight of the words themselves.


Human/Need/Desire, 1983


Human/Need/Desire (1983) is a striking neon installation that explores the fundamental aspects of human existence—our needs, desires, and the intrinsic nature of being. The work consists of a series of neon signs, each flashing one of the three words—“Human,” “Need,” and “Desire”—intermittently in bright, vivid colors. The pulsating lights draw attention to the tension between these basic human conditions, creating an intense, almost overwhelming experience for the viewer. The repetition of the words, combined with the raw, cold aesthetic of the neon medium, emphasizes the urgency and cyclical nature of these concepts, while also evoking a sense of isolation and introspection. Nauman’s use of neon, a medium often associated with advertising or commercial signs, here becomes an unsettling vehicle for philosophical inquiry, forcing the viewer to confront the emotional and existential weight of the words themselves. In this work, Nauman interrogates how language, light, and space can reflect the complexities of the human psyche and the paradoxes inherent in human life.


100 Live and Die, 1984


The conceptual weight of Nauman's work with words and typography can also be seen in his repeated explorations of wordplay and paradox. In pieces like One Hundred Live and Die (1984), Nauman uses language to evoke the cyclical and sometimes contradictory nature of existence. The repetition of simple yet profound phrases such as "Live and Die" reflects the constant loop of human experience, while the use of text as a rhythmic, almost meditative element emphasizes the tension between the fleeting and the permanent. Typography, in these cases, takes on an additional layer of meaning, where the visual representation of the words, their placement, and the rhythm of their repetition become part of the philosophical inquiry. Through these works, Nauman not only challenges the viewer’s understanding of language but also invites them to experience the material and conceptual weight that words carry in the context of art.


segunda-feira, 11 de novembro de 2024

O Design Atemporal do Golden Record : Tipografia do Infinito

 O Golden Record – ou Disco de Ouro da Voyager – é um disco de áudio e dados enviado ao espaço nas sondas Voyager 1 e Voyager 2, lançadas pela NASA em 1977. Idealizado por uma equipa lidereada pelo astrónomo Carl Sagan, o objetivo do Golden Record é servir como uma espécie de “mensagem engarrafada” interestelar: uma introdução da Terra e da huminada a possíveis formas de vida extraterrestre que encontrem o mesmo. Apesar de terem sido criados para uma missão científica, os discos representam uma initicativa mais filosófica e cultural.

O Golden Record é um disco de cobre banhado a ouro, com uma capa de alumínio e um diagrama explicando como reproduzi-lo. Este contém 90 minutos de áudio e cerca de 120 imagens codificadas, projetadas para apresentar aspetos fundamentais da vida e da cultura humana. 


No seu conteúdo inclui saudações em 55 idiomas, uma seleção de sons naturais e urbanos, como trovões, vulcões, ondas do mar, canto de passáros e risos, para representar o ambiente sonoro da Terra. A música escolhida representa culturas e eras diferentes, entre as obras estão peças clássicas como a “Quinta Sinfonia” de Beethoven, músicas étnicas de diversas regiões do mundo, e também canções contemporâneas para a época, como “Johnny B. Goode” de Chuck Berry. Também incluiu diagramas anantômicos do corpo humano, sequência de DNA, mapas, estruturas químicas e informações matemáticas para oferecer uma visão científica e biológica da Terra. Fotografias de pessoas de diferentes partes do mundo e em atividades diversas. Além de imagens de planetas do sistema solar, representações de localização espacial e de fenômenos astronômicos.

A capa do Golden Record inclui instruções codificadas que explicam como decifrar as imagens e áudios. Usa diagramas que indicam a velocidade de rotação do disco e infromações técnicas para a decodificação, com base em referências universais, como a estrutura do hidrogênio.  



 



A estrutura do Golden Record é um exemplo notável de comunicação universal, onde o design e a tipografia assumem um papel crucial na transmissão de informações através de barreiras culturais, linguísticas e temporais. Na sua concepção, os criadores precisaram pensar além das convenções tipográficas conhecidas e se voltar a símbolos e padrões visuais com significado científico universal, como as representações de hidrogênio, sequências binárias e diagramação atemporal. O design minimalista e direto das instruções na capa do disco reflete uma estética tipográfica onde cada linha e símbolo tem função crítica, eliminando excessos e construindo uma "tipografia do desconhecido", na qual elementos gráficos se tornam a ponte entre a Terra e uma possível inteligência alienígena. Esta abordagem destaca o poder do design e da tipografia em transcender palavras, comunicando ideias complexas por meio de uma linguagem visual cuidadosamente elaborada e intrinsecamente conectada aos fundamentos da ciência e da percepção humana.

A essência do design do Golden Record também dialoga com o conceito tipográfico de clareza universal, buscando um equilíbrio entre simplicidade e profundidade para garantir compreensão além das fronteiras humanas. Cada elemento visual é meticulosamente planeado para facilitar a leitura e interpretação por uma inteligência que, possivelmente, não compartilhe nenhuma referência cultural ou sensorial com a nossa. A disposição dos símbolos, as linhas e os esquemas no Golden Record lembram os princípios do design funcionalista: uma estética limpa, sem ornamentos, onde a forma segue a função. É um exemplo potente de como o design e a tipografia podem construir pontes com o desconhecido.


É considerado um marco da exploração espacial e um símbolo da curiosidade e esperança da humanidade. Em 2012, a Voyager 1 tornou-se o primeiro objeto humano a entrar no espaço interestelar, levando o disco ainda mais longe de nós. A ideia do Golden Record inspirou outras iniciativas de mensagens interestelares e é constantemente referenciada na cultura popular, destacando a tentativa de comunicar com o universo em um nível universal.

As sondas Voyager estão atualmente na borda do sistema solar, no espaço interestelar, e continuarão a sua jornada por milhões de anos. Dado o tamanho do universo e a trajetória desconhecida de qualquer civilização alienígena, as chances de o Golden Record ser encontrado são extremamente pequenas.

Hoje, os Golden Records são reconhecidos como artefatos únicos, representando a ciência, arte e diversidade cultural da Terra, e continuam a inspirar curiosidade sobre a humanidade e o cosmos.




O Manuscrito de Voynich: Ficção Medieval ou Conhecimento Perdido?

O LIVRO INDECIFRÁVEL

O Manuscrito de Voynich é um dos textos mais misteoriosos do mundo. Do ínicio do século XV – entre 1404 e 1438 – é um livro manuscrito ilustrado, escrito em uma linguagem ou código desconhecido e é ilustrado com o que parecem ser plantas, diagramas astrológicos, figuras femininas e outros elementos enigmáticos. O nome do manuscrito vem de Wilfrid Voynich, um antiquário polonês que o descubriu em 1912, quando o comprou a um jesuíta antes que o mesmo o vende-se ao Vaticano. Desde então, ele tem sido objeto de especulação e estudo, mas até hoje ninguém conseguiu decifrá-lo ou determinar o seu propósito exato.


Os textos desta obra estão escritos num sistema de escrita não identificado, chamado de “voynichês”. Este apresenta um padrão de escrita coerente e estrutura, mas nenhuma língua conhecida corresponde ou se parece a esta. Vários linguistas e criptógrafos já tentaram decifrá-lo, sem sucesso. 

No campo das ilustrações, é possível identificar cerca de 113 plantas ilustradas espalhadas pelos livros, enquanto que algumas plantas têm elementos reconhecíveis, a maioria parece ser fictícia. O manuscrito possui diagramas celestiais, símbolos zodiacos e representações do que parece ser o ciclo lunar. Este conteúdo sugere um conhecimento de astronomia ou astrologia. Há também figuras de mulheres nuas, algumas envolvidas em tubos ou estruturas semelhantes a sistemas biológicos ou canais de àgua. Essas ilustrações têm sido interpretadas como representações simbólicas de processos biológicos ou médicos. É possível encontrar também desenhos de frascos e recipientes, além de uma seção com o que parece ser uma lista de plantas e substâncias, levando alguns estudiosos a acreditar que o manuscrito poderia ser um guia de ervas medicinais. 


Alguns pesquisadores acreditam que o manuscrito seja um herbário medieval com plantas medicinais e receitas terapêuticas. No entanto, as plantas não correspondem diretamente a espécies conhecidas. Devido à presença das figuras femininas e diagramas semelhantes a órgãos, outra teoria é que seja um livro sobre medicina medieval, talvez um tratado ginecológico ou de saúde feminina. Muitos estudiosos acreditam que o manuscrito esteja em código, criado para proteger conhecimento específico. Em alternativa, poderia ter sido escrito num idioma perdido ou inventado. Existe também a teoria de que o manuscrito seja uma invenção intencionalmente sem sentido, uma brincadeira ou mistificação, criada para confundir os leitores. Contudo, a complexidade do texto sugere que uma construção cuidadosa, pouco provável de ser apenas um enigma sem sentido. 

O Manuscrito Voynich já foi submetido a várias tentativas de decifração, usando técnicas desde criptografia clássica até análises de inteligência artificial. Em 2013, testes de carbono-14 foram realizados para determinar a idade do pergaminho, o que confirmou a sua origem no ínicio do século XV.

Criptógrafos da Primeira Grande Guerra, como William Friedman, e modernos estudiosos de inteligência artificial tentaram decifrar o texto, mas nenhum conseguiu. No entanto, através dessas análises, conclui-se que o “voynichês” possui padrões de repetição e frequência de palavras similares aos de linguagens naturais. Isso sugere uma gramática interna, mas até agora, sem correspondência com nenhum idioma conhecido.


Alguns linguistas notaram que certas palavras parecem ocorrer em àreas específicas do manuscrito, sugerindo temas relacionados com o conteúdo visual. Por exemplo, palavras específicas aparecem em seções botânicas e outras na seção artronômica, o que indica organização intencional.


O manuscrito possui marcas e inscrições adicionais que sugerem uma longa histórica de proprietários. Entre esses, Rudolf II da Germânia, que teria comprado o manuscrito no século XVII acreditanto que o seu conteúdo fosse valioso. Também Athanasius Kircher, um estudioso jesuíta e criptógrafo que também tentou decifrar o manuscrito. Chegando então Wilfrid Voynich, ao qual o manuscrito apropriou o seu nome.

O Manuscrito de Voynich é atualmente mantido na Biblioteca Beinecke de Manuscritos e Livros Raros da Universidade Yale, onde está catalogado como MS 408. O mesmo foi digitalizado e está disponível para ser consultado online.

O mistério do manuscrito permance até hoje, sem uma decifração definitiva, continuando a alimentar teorias e estudos.