segunda-feira, 27 de novembro de 2023

Tipografia Dadaísta, a rebelião (i)rracional

    Assim como os Cubistas, os artistas modernistas que impulsionaram o movimento Dadaísta no pós-guerra da primeira guerra mundial, demonstraram grande interesse em incorporar tipografia nas suas composições. A palavra não só era essencial como tinha um carácter de protesto, metafórico e enigmático. Artistas como Raoul Hausmann ou Kurt Schwitters utilizavam fontes em negrito, espessas e sem serifa, posicionavam os seus textos em configurações diagonais, horizontais e verticais, incorporando as características do movimento, de anti-conformismo, absurdismo e espontaneidade mas levando o design gráfico e a tipografia muito a sério. Até então, o texto convencionalmente era alinhado apenas horizontalmente. Além disso, artistas reconhecidos parte desta corrente artística aventuraram-se a experimentar o espaçamento entre linhas e letras.


Merz no 11, Kurt Schwitters (1924) Pelikan. 
Letterpress, 17 1/4 x 11 1/2” (43.8 x 29.2 cm)

    Os Dadaístas desempenharam um papel fundamental na formação do Design Gráfico ao produzirem revistas que promoviam a arte. A sua informalidade no exercício do design editorial deixou marca historicamente, influenciando os designers gráficos em ascensão. Notavelmente, a influência do Dadaísmo neste campo seria reconhecida pelos designers da Bauhaus.



Optophonetic media, Raoul Hausmann (1919)

DADA, Raoul Hausmann (1919)

DADA KOMMT!, Raoul Hausmann (1958)

    O movimento Dada tinha uma forte dimensão política, com muitos dos artistas utilizando a arte para expressar desilusão e raiva em resposta à devastação da Primeira Guerra Mundial. Os dadaístas criticavam o nacionalismo, o militarismo e o autoritarismo, refletindo sobre as mais amplas convulsões sociais e políticas da época. Hausmann declamou "poemas de letras" que envolviam todo o corpo por meio de variações de respiração e voz para serem expressos, sem saber que essa poesia sem palavras já formava só por si uma das qualidades mais marcantes do Dadaísmo. Construiu-se nesta época o conceito de libertação de uma linguagem explícita que "se tornara ineficaz", pois fora "devastada pelo jornalismo". O radical Hausmann estava a milhas de distância de qualquer ato de reverência a qualquer tipo de autoridade ou cânones estabelecidos, pois despojava a linguagem até aos seus estado mais cru, ou seja, até as próprias letras. As letras eram o seu "novo material", os blocos de construção da sua poesia optofonética.

    Seguindo a sua máxima de "anti-regras", os dadaístas insurgiam-se e protestavam contra tudo o que seria convencionalmente aceito na época, redefinindo a maneira como a tipografia era utilizada. Através do livre uso de fontes, adotavam pontuações de forma não convencional e apreciavam a inclusão aleatória de letras ou símbolos nas suas páginas. Imprimiam tanto na horizontal quanto na vertical no mesmo papel, compondo de maneira indiferente em qualquer direção. O impacto visual tornava-se essencial no seus posteres, e cada página era explosiva, como se a intenção fosse que ela "gritasse" para o leitor. Conquistavam esse efeito por meio de uma hierarquia extrema, uso abundante de letras maiúsculas e minúsculas, tipos condensados e leves. Além disso, alguns dadaístas preferiam que o seu texto não fosse condicionado ao significado. Em muitos dos posteres da época, a legibilidade do texto provavelmente sofria como resultado dessa abordagem e esse fator também fazia parte de todo o sentido da obra.

    Outro artista emergente do século XX, Hans Arp ou Jean Harp, era conhecido pelo uso inovador do acaso no seu processo artístico. Muitas vezes criava colagens deixando cair ou rasgando pedaços de papel sobre uma superfície, permitindo que a aleatoriedade desempenhasse um papel na composição. Esta abordagem reflectia o interesse dadaísta em minar a racionalidade e abraçar o arbitrário. A abordagem multidisciplinar de Jean Arp, combinando arte visual e poesia, bem como o seu compromisso em explorar o "momento" e o orgânico, deixaram um impacto duradouro na trajetória da arte moderna e contemporânea e um trabalho sólido e conceptual na área da tipografia e design.

Der Pyramidenrock, Jean Hans Arp (1924) 

'Arp/ 1/ Prapoganda/ und Arp...', Jean Hans Arp (1923)

ARP (Jean) & TAEUBER-ARP (Sophie). le siège de l'air. poèmes 1915-1945, Jean Hans Arp (1946)

    Os dadaístas foram também prolíficos na criação de manifestos e publicações que apresentavam os seus ideais juntamente com a sua tipografia vanguardista. Revistas como "Cabaret Voltaire" e "Dada" serviram como plataformas para disseminar as ideias dadaístas e mostrar designs tipográficos inovadores. Apesar do movimento ter perdido relevância após a chegada do surrealismo, este prevalece como um movimento fértil em todas as áreas artísticas para a condução de um espírito crítico e que ajudou a solidificar ainda mais a ideia da arte como um mero exercício de consciência.

    O gene experimental e rebelde do uso da tipografia pelo movimento dadaísta teve repercussões no design gráfico e na tipografia. Abriu caminho para movimentos vanguardistas subsequentes e influenciou o desenvolvimento de princípios modernos de design. A abordagem dadaísta à tipografia, com ênfase na liberdade, caos e quebra de tradição, continua a inspirar designers contemporâneos que procuram ultrapassar os limites da comunicação visual.      

   



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