terça-feira, 15 de dezembro de 2015

À luz do dia até os sons brilham


Wim Wenders à descoberta de Portugal

Museu da Água Reservatório da Mãe d’Água das Amoreiras
Inserida na programação do Lisbon & Estoril Film Festival – LEFFEST
Curadoras: Ana Duque y Gonzales e Laura Schimidt
Realizada pela Wenders Images e pela Fundação Wim Wenders em colaboração com o LEFFEST e com o Museu da Água da EPAL
De 07 de novembro de 2015 até 02 de abril de 2016
Preço: 5 

"No one will doubt that, besides water, life is the best thing a human being has."
Georg Christoph Lichtenberg (1742-1799)


A exposição se encontra no Reservatório da Mãe d’Água das Amoreiras, depósito que recolhe as águas provenientes do aqueduto das Águas Livres, no distrito de Lisboa. A construção data de 1834 e sua arquitetura sóbria veste a exibição perfeitamente, combinando com a nostalgia das 28 fotografias escolhidas, assim como o som da cascata e da Arca d’Água que ditam o clima presente no espaço.
Wim Wenders é um realizador de renome alemão, importante figura integrante do Novo Cinema Alemão e, hoje, Presidente da Academia de Cinema Europeu em Berlim. Wenders costuma misturar abordagens transitando entre ficções, documentários e séries de televisão, marcados frequentemente pelo realismo fantástico. As fotografias em exibição foram registradas pelo autor enquanto descobria Portugal em preparação para as filmagens de suas obras O Estado das Coisas, Até o Fim do Mundo e Lisbon Story. Isso se deu entre 1980 e 1994, momento em que o país passava por mudanças políticas e iniciava uma expansão econômica.


A frase de Fernando Pessoa “À luz do dia até os sons brilham” é utilizada como título da exposição,  utilizada pelo realizador em seu filme Lisbon Story, e nenhum outro título cairia melhor aqui também. As imagens de Portugal surgiram com uma visita de Wenders às instalações abandonadas do Hotel da Praia Grande, em Sintra.


Once
at the westernmost tip
of the European continent,
where Portugal has its pointed nose,
at least on the atlas,
I came across an abandoned hotel.
With every wave
the Atlantic asserted its claim on this piece
of land.
This place longed to became a movie,
I felt,
realizing at the same time
that I had already brought the story for it
with me,
and that only here I’d be able to get it off
my chest.
America was “opposite”,
just across the sea.

(Wim Wenders, Once. Pictures and Stories. Munique, Schirmer Art Books, 2015, p.26)

 

A paixão de Wenders por Portugal, suas transformações e sua história foi instantânea.  O clima nostálgico e malancólico de Lisboa acabou em arte.

“e em Lisboa lembrei-me da Alemanha da minha infância.”
(texto: Wim Wenders, Once. Pictures and Stories. Munique, Schirmer Art Books, 2015, p.244) 


Começamos a caminhar pelo caminho cinzento e estreito que dá a volta ao espelho d’água no centro do prédio, o som da água caindo e a música clássica ao fundo acentuam a nostalgia presente nas imagens de Wim Wenders, não só como tema das fotos, mas em suas cores e ângulos. O fato de não se poder tomar distância para observar as fotos, devido ao caminho estreito, força-nos a quase fazer parte da imagem, percebendo cada canto da composição. As fotografias de Wenders são carregadas de detalhes e nuances que só uma boa observação pode captar.


Num ambiente nostálgico e clássico, percorre-se o caminho de 27 obras postas às paredes, iluminadas individualmente, mas também banhadas com a luz natural que entra pelas longas e antigas janelas do edifício. O olhar de Wenders é emoldurado pelos detalhes do local, mas também pela sua história, visto que o aqueduto que desagua neste local é também assunto de imagens em questão. Há história nas imagens e nas paredes que as vestem.

 

A última obra, que também pode ser a primeira, já que o caminho é praticamente um círculo, de numero 28, é enorme e colocada sob o espelho d’água, o chamariz da exposição, primeira e última coisa que se vê.


Wim Wenders pousa seu olhar pelas ruas, telhados, construções, trabalhadores e pelo abandono. Usa de cores e preto e branco, contrastes marcantes entre luz e sombras. Suas composições são recheadas de observação e curiosidade. O descobrimento de uma cidade em pleno estado de transição, uma nostalgia quase palpável. As imagens de Wenders não são apenas documentais, mas uma homenagem à Lisboa, à sua evolução, símbolos de uma transformação que se manifesta no espaço.


A exibição fica até abril de 2016 e, sem dúvida, é uma visita que vale a pena, para quem conhece o trabalho de Wim Wenders ou não.



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