sexta-feira, 7 de julho de 2023

Ora toma! Bordalo a interpretar-nos até aos dias de hoje

 O Museu Bordalo Pinheiro está centrado na vida e obra do artista Rafael Bordalo Pinheiro (1846-1905). A nível histórico e cultural é um artista de imensa importância. Viveu com grande presença social e política no final do século XIX, altura próxima do fim da monarquia em Portugal. Distinguiu-se a nível nacional nas áreas da cerâmica, da banda desenhada, da caricatura e do humor.

O edifício do museu, moradia situada no Campo Grande em Lisboa, é composto por dois blocos relativamente pequenos, ambos de dois pisos. Num dos blocos, após atravessar a loja e a bilheteira, encontramos várias peças do artista em diferentes fases, contextos e assuntos. Pode-se dizer que essa sala serve de introdução ao museu. No piso superior encontramos um espaço dedicado a um dos personagens mais icónicos da cultura portuguesa, o Zé Povinho. Essa personagem caricaturada representa o povo português face às injustiças sociais e à relação que tem com o poder político. O Zé Povinho é um homem de barbas, por vezes sujo e de um contexto humilde. É representado de duas formas opostas: ora é passivo, humilde e subserviente, ora é revoltado e insolente. Na sua versão revoltada faz o gesto icónico do manguito.


Zé Povinho a fazer o gesto manguito, MRBP.CER.0375 © Museu Bordalo Pinheiro, Lisboa


Ainda no espaço dedicado ao Zé Povinho, encontramos a exposição temporária “Estado Crítico”. Foi um projeto desenvolvido em parceria entre a equipa do Serviço Educativo do museu, uma turma do 11º ano da Escola Secundária Marquês de Pombal e o artista e fotógrafo Vitorino Coragem. Nesse trabalho os jovens debateram entre si três temas: adolescência e liberdade, amor e guerra, arte e escola. Posteriormente montaram um quadro com fotografias e ideias escritas pelos alunos resultantes dos debates. Esse projeto enquadra-se muito bem no contexto do museu. A vida e obra do artista Rafael Bordalo Pinheiro foram marcadas pelo seu espírito crítico e sentido de humor perante a sociedade e a típica mentalidade portuguesa. Trabalhar com uma turma do secundário é um bom contributo para o envolvimento do museu com a comunidade escolar, aproveitando o espírito crítico dos adolescentes que começam a formar a sua posição política face ao mundo que os envolve. Acabam por ter flexibilidade para ver os acontecimentos de uma perspetiva mais imparcial, de quem vê do lado de fora, ainda sem a bagagem de conhecimentos que os poderia condicionar com ideias pré-concebidas.




No piso térreo do outro edifício encontra-se a biblioteca do museu. Mais adiante, passando pelas escadas, estão duas salas que mostram o artista como ceramista na sua vertente mais comercial. São peças peculiares e criativas, mas que mantêm uma convencionalidade que alicia qualquer pessoa a utilizar as peças. No piso superior, encontramos uma exposição temporária com as obras dos primeiros cartoonistas portugueses. Naturalmente, Bordalo Pinheiro está incluído nesta exposição.


Painel de azulejos padrão "Nabo"


Numa análise global, o museu está muito bem organizado e catalogado. As peças têm legendas simples, diretas e legíveis. A iluminação é adequada às obras expostas, permitindo a sua clara observação. No entanto, as salas não são excessivamente iluminadas, o que reduz a fadiga do visitante. A lógica da organização museológica é perfeitamente compreensível. Todas as obras têm a sua relevância no espaço onde se encontram. Importa destacar a dinâmica da programação do museu, percetível através do site, com a existência regular de exposições temporárias devidamente integradas na temática da exposição permanente, para além das atividades pontuais e de continuidade do Serviço Educativo.

A visita ao museu é recomendável para todos os públicos e faixas etárias devido à enorme importância do artista do ponto de vista histórico e artístico. Contudo, a recomendação deve ser dirigida especialmente a pessoas que queiram aprofundar o seu entendimento da cultura e do pensamento português, através do sentido de humor fino e peculiar de Rafael Bordalo Pinheiro.


Webgrafia: Museu Bordalo Pinheiro

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