quarta-feira, 1 de dezembro de 2021

Comportamento vicioso e redes sociais

Numa altura da nossa história em que nunca estivemos tão conectados na apelidada por Marshall McLuhan de "Aldeia Global" [1] no seu livro "A galáxia de Gutenberg", a rede de comunicações é já estabelecida em todo o mundo, com uma notória evolução dos telemóveis nesta última década, a par do crescimento das redes sociais, numa jornada simbiótica entre ambas onde uma evolução não teria acontecido sem a outra.
Toda a ação tem uma reação. O elevado uso no quotidiano das redes sociais pode levar ao vício, vício esse que pretendo refletir no livro de artista. Passo a citar um excerto de uma investigação feita por José A. García del Castillo (U. Miguel Hernández de Elche -Espanha),  Carmen López-Sánchez (U. de Alicante -Espanha), Victoria Tur-Viñes (Universidad de Alicante -Espanha), Álvaro García del Castillo-López (U. Miguel Hernández de Elche -Espanha) e Irene Ramos Soler (U. de Alicante -Espanha):

   " Muitas das fronteiras entre um comportamento normal e um comportamento vicioso estão ainda por determinar, sobretudo quando nos referimos aos vícios de conduta ou psicológicos. As primeiras referencias aos vícios psicológicos são já clássicos, Marlatt e Gordon (1985) já indicavam que as condutas habituais e quotidianas como comprar, trabalhar, jogar, etc., que contam com efeitos altamente fortalecedores para a maioria das pessoas têm ao mesmo tempo uma característica de imediato reforço, tornando-as potencialmente viciantes.
   No entanto, este argumento tão alarmante não nos pode induzir a pensar que qualquer comportamento fortalecedor e imediato nos levará a um vicio, porque todos estes comportamentos contêm muitos benefícios que a maioria das pessoas sabem assimilar sem chegar a criar um problema de saúde (García del Castillo, 2013). Actualmente a American Psychiatric Association (APA) não reconhece a maioria destes comportamentos como vícios, entre outro motivos porque continuam a ser mais qualificados
como um problema de controlo de impulsos do que como um vicio propriamente dito (Brugal-Martos e Villalbí, 2006).
Provavelmente a postura mais aceitada se apoie no modelo biopsicosocial de Griffiths (2005), que compara o abuso das substancias químicas (álcool, tabaco e outras drogas) com o vicio das novas tecnologias. Os critérios clínicos que sugere podem ser agrupados da seguinte maneira (García del Castillo, 2012, 9):

Saliência: Quando uma actividade particular se torna na mais importante da vida da pessoa, dominando os seus pensamentos, sentimentos e condutas. Um exemplo orientado ao vicio das redes sociais: “Passo a maior parte do meu tempo a observar o que os outros fazem nas redes sociais (ou a pensar fazê-lo)”.
Alterações de humor: Experiência subjectiva que as pessoas relatam quando se integram numa actividade particular. Pode expressar-se como “sentir uma subida”, sentimentos “desestressantes” ou tranquilizantes de escape, disforia. Um exemplo orientado ao vicio das redes sociais: “Quando participo nas redes sociais esqueço-me completamente de todos os meus problemas”.
Tolerância: Aumento necessário de qualquer coisa para chegar a sentir os mesmos efeitos do principio. Um exemplo orientado ao vicio das redes sociais: “Cada vez passo mais tempo a jogar nas redes sociais para me sentir bem”.
Síndrome de abstinência: Sentimentos de incomodidade ou estado físico, psicológico, social desagradável quando uma actividade se reduz subitamente. Um exemplo orientado ao vicio das redes sociais: “Sinto-me muito mal se por algum motivo não consigo dedicar o meu tempo a participar nas redes sociais”.
Conflito: Conflitos interpessoais ou connosco próprios (intra psíquico). São conscientes de que têm um problema mas não conseguem controlá-lo (experiência de perda de controlo). Um exemplo orientado ao vicio das redes sociais: “Por passar demasiado tempo nas redes sociais tive problemas com os meus melhores amigos”.
Recaída: Tendência a voltar aos padrões originais da actividade depois de um grande período de abstinência. Um exemplo orientado ao vicio das redes sociais: “Se passo algum tempo sem usar redes sociais, quanto volto a fazê-lo a minha actividade continua a ser a mesma”. "


[1] Conceito desenvolvido pelo teórico Marshall McLuhan (1964) para explicar a tendência de evolução do sistema mediático como elo de ligação entre os indivíduos num mundo que ficava cada vez mais pequeno perante o efeito das novas tecnologias da comunicação.

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