quinta-feira, 2 de dezembro de 2021

O vazio na pintura oriental

Quando questionando sobre o vazio, rapidamente se formula uma ideia da sua definição. Sabemos que o vazio é o contrário de cheio, que é um termo desprovido e representa a ausência de conteúdo. Mas, para encontrá-lo, é preciso compreender o imaterial. O vazio é, agora, o desconhecido, o que o olhar não alcança, um tipo de silêncio, o que foi esquecido. É o desapego do material e, por isso, a consciência da verdade. Materializar este espaço negativo é atribuir sentido ao invisível.

No Taoismo, alcançar o vazio denota um estado de placidez e silêncio — considerado “o espelho do universo” e da “mente pura”. Lao Tzu, em Tao Te Ching (obra influente da filosofia espiritual chinesa), relaciona o vazio com o “Tao, Criador e Sustentador de tudo no universo”. Diz ser “o estado mental do discípulo Taoista que segue o Tao”, que esvaziou a mente de “todos os desejos e ideias não enquadradas no movimento de Tao”. Por outras palavras, integra um caminho ontológico, evolutivo e transformador, compreendido por dois termos antagónicos — a presença e a ausência. O primeiro, refere-se ao universo empírico e em constante transformação. O segundo, ao vazio de onde a presença parece emergir.

A pintura chinesa é uma manifestação dos princípios Taoistas, que moldaram a mente dos intelectuais ao longo dos séculos. De facto, a paisagem chinesa destaca-se pela abundância do vazio (ou, na cultura ocidental, o espaço negativo), que descreve a ausência, enquanto que os restantes elementos se tornam visíveis num reino material, ou quase desaparecem, de volta no vazio. Na Cascata, de Wang Wei (701-761), o vazio toma a forma do céu e do rio. Mais tarde, o pensamento extende-se ao nevoeiro, nuvens e lagos, revelando o fundo, em branco, de seda ou papel.

Cascata, Wang Wei (701-761), Dinastia Tang.











Apesar de um espaço livre, o vazio aquire significado e demonstra ser, afinal, repleto em conteúdo. Lao Tzu, em Tao Te Ching reflete sobre esta ideia no capítulo onze.

Thirty spokes will converge / In the hub of a wheel; / But the use of the cart / Will depend on the part / Of the hub that is void. / With a wall all around / A clay bowl is molded; / But the use of the bowl / Will depend on the part / Of the bowl that is void. / Cut out windows and doors / In the house as you build; / But the use of the house / Will depend on the space / In the walls that is void. / So advantage is had / From whatever is there; / But usefulness rises / From whatever is not.

Tradução para inglês de Raymond Blackney, 1955.

 Yohaku no bi — conceito de influência Taoista, por meio da pintura de paisagem chinesa —  define a beleza do vazio na arte japonesa, em que a ausência seria central durante o processo criativo. A noção de potencial infinito num espaço vazio relaciona-se, por outro lado, com o Budismo Zen. (o vazio) e mu (a não-existência) refletem-se na obra do século XVI, Pinheiros, de Hasegawa Tōhaku. A pintura promove, tal como o Zen, a cultivação da mente e do espírito. Nela, testemunha-se a atmosfera meditativa e a serenidade presente em algumas pinturas anteriores, destacando-se o artista chinês Muqi (no fim da Dinastia Song).

Hasegawa Tōhaku, Pinheiros,

Período Azuchi-Momoyama,

séc. XVI tardio,

Museu Nacional de Tóquio,

Tóquio, Japão.














Zen Masters (s.d). Muqi Fachang. Retirado em novembro 19, 2021 de https://terebess.hu/zen/mesterek/MuqiFachang.html

E-Flux (2012). Título em itálico. Retirado em novembro 19, 2021 de https://www.e-flux.com/announcements/34066/invisible-art-about-the-unseen/

Drawing (2018). Absence, emptiness and the void. Retirado em novembro 19, 2021 de http://fineartdrawinglca.blogspot.com/2018/09/absence-emptiness-and-void.html

eGreenWay (s.d). Tao Te Ching. Chapter 11. Retirado em novembro 19, 2021 de ttps://www.egreenway.com/taoism/ttclz11.htm

Art in America (2018). The Tao of Painting. Retirado em novembro 19, 2021 de https://www.artnews.com/art-in-america/features/the-tao-of-painting-63566/

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