sexta-feira, 9 de maio de 2025

William Klein – O Mundo Inteiro É um Palco

 Introdução – Sobre o que ou quem é a exposição:

Trata-se de uma retrospetiva dedicada ao fotógrafo norte-americano William Klein (Nova Iorque, 1926 – Paris, 2022), considerado um dos artistas mais influentes do século XX. De espírito multidisciplinar, Klein revolucionou géneros como a fotografia de moda e de rua, quebrando convenções estéticas e temáticas da sua época.

A sua experiência na Europa começou quando se alistou no exército, o que o levou a viajar primeiro pela Alemanha e, mais tarde, para França. Após a desmobilização, acabou por se estabelecer em Paris. Em 1948 matriculou-se na Sorbonne e, posteriormente, estudou com o pintor cubista Jules-Fernand-Henri Léger, o que influenciou a sua abordagem visual e conceptual.

Com 26 anos, Klein regressa aos Estados Unidos e cria um diário gráfico da cidade de Nova Iorque. Esse trabalho deu origem ao seu primeiro livro, "Life is Good and Good for You in New York: Trance Witness Revels" (1956), que viria a tornar-se um marco na história da fotografia. Rejeitado inicialmente nos EUA, o livro foi publicado em França e, em 1957, recebeu o Prémio Nadar.

Uma das imagens mais emblemáticas desse projeto é Gun 1, New York (1954), onde uma criança aponta uma arma de brincar diretamente para a câmara, criando uma sensação de ameaça que se transfere para o espectador. O olhar da criança é duro, quase violento – um exemplo claro da audácia de Klein, presente em todo o seu trabalho. Para além do domínio técnico da composição, luz e enquadramento, Klein acrescenta sempre uma provocação temática e formal que desafiava as expectativas da época.

O tema da cidade e da vida pulsante nos grandes centros urbanos tornou-se um traço marcante no seu portfólio. Depois do sucesso do primeiro livro, Klein expandiu o seu registo para outras cidades: Roma (1959), Moscovo (1964), Tóquio (1964) e Paris (2002), sempre com uma abordagem livre e pessoal.

Em 1958, mergulha noutra linguagem artística: o cinema. Começa com a curta-metragem Broadway by Light, e segue-se o filme Qui êtes-vous, Polly Maggoo? (1966), que lhe valeu o Prémio Jean Vigo em 1967. Em 1969, realiza Mister Freedom, um projeto mais independente, marcado por cenas de ação e um forte posicionamento político.

O reconhecimento institucional à sua obra também se fez sentir. Em 2005, o Centre Pompidou, em Paris, dedicou-lhe uma grande retrospetiva, seguida pela Tate Modern, em Londres, em 2012. Ao longo dos anos, diferentes facetas da sua

obra foram exibidas em cidades como Amesterdão, Barcelona, Berlim, Bruxelas, Chengdu, Madrid, Milão, Rouen, Seul, entre outras.

A Exposição

A exposição “William Klein – O Mundo Inteiro é um Palco” está organizada em diversos espaços expositivos, cada um dedicado a diferentes temas fotográficos e vertentes artísticas que Klein explorou ao longo da sua carreira. Logo à entrada do Museu da Eletricidade, onde a mostra teve lugar, deparamo-nos com uma parede onde se lê o nome do autor e o título dado à exposição pelo curador David Campany. Nessa mesma parede estão disponíveis panfletos informativos, em português e inglês, que nos contextualizam um pouco sobre a vida e obra de Klein.

Avançando, encontramos uma parede com uma compilação de imagens consideradas “highlights” da carreira do artista, segundo o olhar do curador. Embora os espaços aparentem estar divididos por temas, a quem conhece a obra de Klein, a sensação que se impõe é de certa confusão. As imagens estão demasiado próximas, o que impede que respirem e tira-lhes parte do impacto. Algumas mereciam uma parede só para si, permitindo uma contemplação mais pausada e valorizando melhor o seu conteúdo.

O primeiro espaço expositivo, particularmente, causou-me algum desconforto. Esperava mais cuidado com a apresentação da obra de um fotógrafo tão marcante, especialmente nas áreas da fotografia de rua e de moda. Em vez disso, somos confrontados com uma espécie de "mixórdia" de imagens de várias vertentes e temas — todas numa só parede. Fotografias feitas na Europa, dentro da abordagem street, estão misturadas com dípticos de moda, sem qualquer separação temática evidente. Apesar das salas serem amplas e permitirem a circulação confortável, a disposição densa das obras provocava uma sensação de claustrofobia. Parecia informação a mais para tão pouco espaço.

Logo a seguir, há uma sala escura onde são projetados pequenos trechos dos filmes realizados por Klein. As imagens são projetadas em duas paredes sincronizadas, com o mesmo áudio, mas legendadas em português e francês, respetivamente. O espaço é confortável e bem pensado — tem bancos voltados para cada ecrã, permitindo uma experiência imersiva e tranquila.

Alguns corredores de passagem acolhem obras aparentemente consideradas de menor relevância — nomeadamente os retratos de celebridades ou fotografias captadas com câmaras digitais. A forma como estas foram colocadas transmite a

sensação de que foram secundarizadas, o que pode não refletir com justiça a amplitude e importância da produção de Klein nestes campos.

Logo após a sala dos filmes, encontramos uma pequena sala escura com imagens feitas no Japão. Este momento da exposição parece finalmente respirar. As fotografias estão bem distribuídas, com o devido espaço entre si, o que valoriza a experiência do visitante. Nota-se aqui uma seleção cuidada, talvez por estarem associadas ao livro Tokyo (1961), dando a ideia de que cada imagem é uma página isolada, com tempo para ser lida. No entanto, persiste um problema que se arrasta ao longo da exposição: o brilho do vidro das molduras e a iluminação excessiva dificultam a apreciação plena das obras, prejudicando o impacto visual.

Segue-se então o espaço dedicado às experiências de Klein com light painting, jogos de espelhos e os seus trabalhos enquanto designer gráfico e pintor. Este espaço está mais escondido, no piso superior, acessível apenas por uma longa escadaria, o que poderá ser uma limitação para alguns visitantes. Apesar de pequeno, o espaço está bem organizado. Há ecrãs com conteúdos multimédia explicativos e, ao centro, uma mesa expositiva com obras de design gráfico protegidas por vidro.

Por fim, entramos no último espaço da exposição, onde estão algumas das imagens mais icónicas de Klein — fotografias disruptivas tanto no universo da street photography como da fotografia de moda. Entre elas, destaca-se o famoso retrato do rapaz a apontar uma arma para a câmara (que quase dispara sobre o espectador); a imagem que nos coloca no meio de uma multidão, com o rosto desfocado de uma senhora em primeiro plano; ou aquela em que parece haver um retrato de gerações familiares, com uma rapariga à frente, seguida por um homem e uma senhora mais velha ao fundo. Também aqui está presente a emblemática fotografia de moda Isabella + Opera + Blank Faces, Paris, VOGUE, 1963, onde a modelo está de frente para a câmara, rodeada por figuras com os rostos apagados.









Bibliografia

Campany, D. (n.d.). About. David Campany. Recuperado em 22 de abril de 2025, de https://davidcampany.com/about/

Connaissance des Arts. (2022, 13 de setembro). Mort du photographe William Klein, l’oeil féroce de la pop culture. Recuperado de https://www.connaissancedesarts.com/depeches-art/deces/mort-du-photographe-william-klein-loeil-feroce-de-la-pop-culture-11176719/

Varsity. (n.d.). William Klein: The photographer who broke all the rules. Recuperado em 22 de abril de 2025, de https://www.varsity.co.uk/culture/5357

Jones, J. (2022, 13 de setembro). High-octane visions: Blurred, distorted genius photographer William Klein. The Guardian. Recuperado de https://www.theguardian.com/culture/2022/sep/13/high-octane-visions-blurred-distorted-genius-photographer-william-klein

Quis saber quem sou - um concerto teatral

 No dia 25 de Abril de 2024 fui assistir à peça “Quis saber quem sou” de Pedro Penim. Foi uma experiência profundamente simbólica e emotiva para mim. Há que dizer logo de partida que dentro da minha família o 25 de abril teve sempre uma importância bastante grande pelo meu avô ter sido preso político na altura do fachismo e termos sempre celebrado muito esta data. Escolhi fazer esta recensão porque estamos perto da mesma data um ano depois e me recordo o quão especial foi para mim assistir a este espetáculo no quinquagésimo aniversário do dia da liberdade em Lisboa. Nesse dia desci a avenida da liberdade, como costumo fazer todos os anos, com amigos e senti que estava uma atmosfera muito especial e que muitos mais jovens estavam a celebrar esse dia tão importante. Assisti à atuação com a minha amiga Maria por recomendação de outra amiga que conhecia pessoas que iam participar na peça. Conseguimos bilhetes no próprio dia meio em cima da hora e lá fomos nós assistir a produção no teatro São Luiz no Chiado. A escolha da data foi por acaso, mas como já referido intensificou a experiência e marcou a celebração da revolução dos cravos simbolizando o dia da liberdade em Portugal. Esta data ofereceu à obra um peso adicional porque cruzou a história coletiva do país com a intimidade da procura identitária do autor, intérprete e do espectador.

O diretor Pedro Penim apresenta-nos um espetáculo profundamente pessoal, mas com significado universal: a descoberta da identidade através da memória, da história, da música e da herança - não apenas familiar, mas também política. A peça parte da procura da individualidade de várias personagens e debruça-se sobre questões de identidade de género, pertença e liberdade. A peça é um monólogo poético, onde as palavras e os silêncios são igualmente significativos.

A escolha do título “Quis saber quem sou”, que foi retirado da música “E Depois do Adeus” de Paulo de Carvalho de 1974, encaixa-se devidamente com a temática do teatro. Penim concedeu ao espetáculo com o primeiro verso da canção o questionamento e a procura da identidade individual e coletiva. Ele pretendeu marcar assim o momento histórico do início da revolução em 1974, tornando a composição num símbolo da liberdade.

A obra é um concerto teatral que tenciona revisitar as canções da revolução. A interpretação dos temas revolucionários antigos entregaram um clima nostálgico à experiência. O diretor usou as palavras e as cantigas como armas de afirmação e expressão pessoal. A direção musical de Filipe Sambado integra canções emblemáticas associadas ao 25 de Abril de 1974. O espetáculo apresenta uma seleção de 23 temas, que abrangem diferentes épocas e geografias, incluindo músicas portuguesas, brasileiras, angolanas, francesas e norte-americanas. Entre os temas destacados estão:

● “E Depois do Adeus” (José Niza, José Calvário), interpretada por Paulo de Carvalho, cuja primeira frase dá título ao espetáculo.

● “Acordai” (Fernando Lopes-Graça, José Gomes Ferreira).

● “Grândola Vila Morena” (José Afonso).

● “Vira Bom” (Grupo de Ação Cultural – Vozes na Luta).

● “Labanta Braço” (Os Tubarões).

● “Como nossos Pais” (Elis Regina).

● “Somos livres (A Gaivota)” (Ermelinda Duarte).

Através desta seleção musical e narrativa, “Quis saber quem sou” pretende reavivar a memória coletiva e destacar a relevância contínua das mensagens de liberdade e resistência presentes nestas obras.

Ao ter escolhido um elenco de atores e cantores jovens, Penim conseguiu fazer a ponte entre as pessoas que fizeram o 25 de Abril e a geração corrente que ainda luta pelos seus direitos e pela liberdade. Por serem jovens em palco a encenar essas temáticas, a mensagem e o assunto da obra tornaram-se bastante relacionáveis com os tempos de hoje em dia. Isso demonstra o quão intemporal o assunto do espetáculo é.

Tem que ser referido que a audição de atores foi feita a nível nacional. Além disso, a língua gestual portuguesa foi integrada no espetáculo pela incorporação de um personagem mudo. Estes dois fatores demonstram o valor inclusivo da peça, pondo ênfase na igualdade e na rejeição de deixar certos grupos da nossa sociedade de parte. O facto dos personagens estarem todos vestidos de maneira quase idêntica, transmite um lema de união e igualdade das várias personalidades representadas em palco.

Há um claro paralelismo entre a conquista da liberdade política e a busca por uma liberdade pessoal, que continua a ser necessária e urgente. A presença de arquivos, imagens, textos e canções da época reforça este cruzamento entre a memória coletiva e a individual.

É de mencionar que a peça foi representada em várias outras cidades ao longo do ano após ter sido estreada fazendo êxito a nível nacional mantendo viva e celebrando a mensagem do dia da liberdade em outras datas e alturas do ano também.

O momento mais emocional da peça foi pessoalmente quando no final do espetáculo os atores e os espectadores cantaram todos juntos em coro o tema “Grândola Vila Morena” de José Afonso para celebrar em conjunto o dia do 25 de Abril.

Em suma, “Quis saber quem sou” é uma obra profundamente atual e necessária. No dia em que se celebrou a liberdade de Portugal conquistada há 50 anos, Penim recordou-me que essa liberdade só está completa quando também é pessoal, íntima e inclusiva. Classifico a peça um gesto artístico comovente e corajoso, que soube transformar a celebração do passado num apelo ao futuro. Comoveu-me e marcou-me muito a forma como nos foi dada, naquele dia tão cheio de significado, a possibilidade de celebrarmos a liberdade que ainda estamos a aprender a viver.

















Webografia

https://www.tndm.pt/pt/programacao/livros-e-pensamento/quis-saber-quem-sou/

https://www.tndm.pt/pt/odisseia-nacional/pecas/quis-saber-quem-sou/

https://www.tndm.pt/pt/programacao/espetaculos/quis-saber-quem-sou/

https://www.youtube.com/watch?v=701QEa7sS3Y

sexta-feira, 2 de maio de 2025

Onze Mulheres a ilustrar (o seu) mundo

 MAEDS – Museu de Arqueologia e Etnografia do Distrito de Setúbal

Janeiro a Maio de 2025

Curadoria: Ana Férias


Ilustração de uma mulher em perfil, e dos seus cabelos decorrem os nomes das 11 artistas que participam na exposição


“IlustraMulher” é uma exposição coletiva que junta o trabalho de onze ilustradoras contemporâneas e que, mais do que mostrar estilos, partilha visões — sobre o mundo, sobre a intimidade, sobre o que é viver, criar e ser mulher hoje. Está patente no MAEDS, um museu que tem vindo a abrir espaço a linguagens visuais diversas e que aqui aposta numa proposta onde a arte se cruza com questões sociais e afetivas.


Ao entrar na sala, sente-se desde logo que cada artista tem o seu lugar. Não há esforço em forçar semelhanças. O que une estas obras é talvez uma inquietação comum — com o corpo, com a memória, com o gesto de contar histórias — mais do que um tema explícito. As linguagens variam: há trabalhos digitais, aguarelas, colagens, misturas técnicas. Mas o que permanece é uma energia de partilha, de procura e, por vezes, de denúncia.


O percurso expositivo é simples e direto. Não se impõe ao visitante, o que permite um tempo de leitura mais pessoal e atento a cada proposta. A curadoria respeita o universo de cada artista, e talvez por isso mesmo se sinta, nalguns momentos, falta de um fio que ligue as obras entre si — um gesto de costura mais presente. Ainda assim, essa autonomia pode ser lida também como uma afirmação de pluralidade, da recusa de encaixar o trabalho destas mulheres num molde comum.


Algumas obras ficam na memória. Cristina Arvana cria mundos delicados onde natureza e imaginação se fundem com uma leveza muito sua. Daniela Mata traz-nos imagens que falam alto — como Free Palestina — e que não deixam dúvidas quanto ao poder político da ilustração. O duo Math Is Good trabalha com referências da cultura visual popular (como o cinema), construindo imagens densas, carregadas de memória e camadas simbólicas.


Falo aqui também na qualidade de artista participante. Foi a minha primeira exposição, e isso não me
é indiferente. Estar entre estas vozes foi uma experiência marcante — não só pelo desafio de escolher o que mostrar, mas sobretudo por ver o meu trabalho colocado em diálogo com o das outras. Esta vivência despertou em mim uma vontade mais clara de, no futuro, poder também criar espaços expositivos colaborativos, onde a curadoria se torne extensão do processo criativo, e não apenas seu reflexo.

Várias mãos levantadas, com diferentes padrões inscritos, como se de tatuagens se tratassem, identificando a multiplicidade feminina contida até na própria artista.


O catálogo da exposição é cuidado e bonito, com boas imagens e um design claro. Sente-se o investimento institucional, o que é sempre importante. Talvez se note a ausência de um texto crítico mais aprofundado que ajude a pensar a exposição num contexto mais amplo — mas isso também deixa espaço para quem a visita (ou escreve sobre ela) formular as suas próprias leituras.


“IlustraMulher” deixa-nos com a sensação de que há ainda muito por dizer e mostrar — e isso, para mim, é sinal de que cumpriu o seu papel. É uma exposição que se posiciona com coragem, sem ser moralista nem superficial. E oferece uma galeria viva de vozes que, cada uma à sua maneira, desafia o que significa ilustrar, cuidar e criar neste tempo em que vivemos.

quarta-feira, 30 de abril de 2025

A Casa da Cerca e as oficinas artísticas

 A Casa da Cerca, em Almada, é um centro de arte contemporânea, onde nele podemos observar um belo jardim botânico com vários tipos de plantas com o objetivo de aproveitá-las para fazer arte, ou seja, plantas estas que são utilizadas para as mais variadas práticas artísticas. 

Para além disso, esta casa tem um vasto programa cultural. O momento inicial serviu para explorar e observar a linda paisagem do rio Tejo bem como admirar e refletir sobre as esculturas que naquele jardim habitavam. Uma experiência imersiva, na medida em que, neste centro de arte contemporânea são também exploradas através de oficinas, várias experiências artísticas bem como exposições e atividades culturais.


No dia 11 de Abril esteve presente uma oficina onde foi explorado uma mistura entre a fotografia e o desenho com o objetivo de retirar das pessoas o melhor que elas têm dentro e fora de si. 

Através da arte, neste caso da fotografia em consonância com o desenho, todos aqueles que foram mergulhados pelo desafio conseguiram superar algo que seria para muitos impossível. Desenhar através de uma câmara obscura, sentir que todos podemos fazer arte mesmo que não seja aquela que pensamos ser a nossa arte principal. 

Podemos dizer que, muitos são movidos pela arte que têm dentro deles, mas podemos ter mais do que uma arte dentro de nós, podemos ser artistas por completo! Mas o que é ser um artista por completo? 

Ao longo do decorrer desta oficina que oferecia um espaço tranquilo, com música relaxante e ao mesmo tempo motivadora, foram criados retratos. As reações foram várias, desde curiosidade e surpresa, a estranheza e reflexão. 



Perante este centro contemporâneo e através desta oficina surgiram diálogos, reflexões, contacto com a natureza, questionamentos, observações e um olhar crítico e artístico.

Todos os que se submeteram a esta experiência saíram dela mais leves e enriquecidos, cada um à sua maneira.


terça-feira, 29 de abril de 2025

Spiral Tribe Exhibition de Mark Angelo Harrison - ADAO Associação Cultural, Barreiro.

 

Spiral Tribe Exhibition esteve presente na ADAO Associação Cultural sem fins lucrativos localizada no Barreiro de 22 de março a 29 de março. Esta exposição foi uma exposição de fotografia montada num local que não foi pensado para uma iniciativa como esta, sendo assim o espaço onde esta ocorreu improvisado.

A inauguração começou com um discurso de Mark Angelo Harrison, cofundador do coletivo Spiral Tribe, que se estendeu para a apresentação da exposição e relação da mesma com o livro A Darker Electricity: The Origins of Spiral Tribe Soundsystem, escrito pelo próprio, num processo que demorou oito anos. Sendo um ambiente que é frequentado por pessoas que conhecem bem a música eletrónica e o conceito de Free Party não existiu uma explicação aprofundada sobre os temas, em vez disso foi esclarecido em que momento foram capturadas as fotografias. Ao longo da conversa com o cofundador foi fácil de entender que a exposição não foi sobre o processo visual das fotografias tiradas, mas, acima de tudo, sobre a sua história.

As fotografias podem ser desconfortáveis para quem não tem conhecimento destas festas ditas ilegais, mas percebesse que é reconfortante para o grupo de pessoas que se revê nestes movimentos.

Nenhuma das fotografias tinha identificação ou o nome do autor, pois nunca foram capturadas com o intuito de serem expostas, mas sim, com a intenção de criar registos e memória daquilo que foram construindo. Estas fotografias foram recolhidas ao longo dos anos 90 até inícios dos anos 2000, primeiros anos em que o coletivo atuou, com origem no Reino Unido e mais tarde difundindo eventos pela Europa.

As imagens espelham perfeitamente a influência do grupo na cultura da música eletrônica e ainda o movimento anticapitalista, mal visto por muitos, tendo em conta que o estilo de música Acid House era considerado ilegal por ser novidade e chamar mais público a esta cena gratuita, o que causava prejuízo ao ambiente dos clubes noturnos. A composição das imagens não é muito trabalhada, por serem capturados momentos velozes, tendo todas estas dimensões entre 15cm por 10 cm e 10 cm por 10 cm. Descrevendo de uma forma mais profunda estas fotografias, as mesmas mostram tanto o ambiente destas festas como, flyers utilizados para informar que o coletivo estava por perto, artistas em performance, confrontos com a polícia, idas a tribunal e transporte de sistema de som. É notável que existia uma prioridade na identificação visual do grupo, tanto pela decoração feita á mão como por camisolas com designs e frases originais que representavam a ideologia, “MAKE SOME FUCKIN NOISE!”.



Esta exposição foi articulada ainda com outros workshops, estes sendo: “Redesigning Revolution” que explorou a simbologia em movimentos culturais; “Guerrilla Theatre Mask Making” onde se produziram máscaras, estes desenvolvidos por Mark Angelo; e por último “Ableton Live Improvisations” onde artistas falaram do seu processo de improvisação de música eletrónica ao vivo.

Arrematando, esta exposição talvez não seja para qualquer pessoa, porque não é montada de acordo como ditam as regras, ou até por mostrar estilos de vida alternativo, mas sem dúvida que mostra de forma transparente a construção de um espaço importante para a música eletrónica e para o conceito de Free Party, a que muitos se agregam nos dias de hoje.






segunda-feira, 28 de abril de 2025

Fragmentos Híbridos no continuum da realidade - virtualidade



Entre os dias 3 de abril de 2025 e 10 de abril de 2025, a Galeria da Faculdade de Belas Artes da Universidade de Lisboa apresentou a exposição “Fragmentos Híbridos”, a qual se situa no corredor interior da entrada das Belas Artes. A Faculdade é por si um espaço fragmentado pelo tempo -1217, 1858, 1932, 1980, 2025 - pedras gastas pelas pegadas onde se tenta unir a fissura do passado com o presente.  A pedra invade luz bege, paredes expondo azulejos que escondem portas. Se não estiver atento à pequena placa da galeria, mergulha num espaço fragmentado de pedras, portas, degraus e esculturas de gesso. Subindo alguns degraus, do lado esquerdo, o espanto encontrou na parede uma abertura branca e lisa. A profundidade predominou, o vazio surpreendeu até ao vislumbre dos objetos.    
 

Sentiu-se a simplicidade de uma exposição intimista e delicada, onde o espaço foi amplo para o tamanho pequeno dos desenhos, fotos, pinturas e instalações de pequenos objetos, fragmentos e experiências sensoriais. A luz vem de 3 janelas, de alguns pequenos holofotes acentuando o brilho refletido nas paredes e nas composições. No fundo mais escuro, desenhou-se um círculo de luz que destacou um misterioso espaço. Os artistas participantes foram: Carlos Henriques, Catarina Reis, o grupo: João Pedro Costa, Ana Mena, Helena Elias e João Castro Silva; Jorge Forero, Lui Avallos, Marta Lucas, Pedro Ângelo, e os coletivos ARTiVIS e ÉBANO, “as composições plasmam diferentes temporalidades e estágios matéricos, colapsando planos visuais que evocam tanto a teoria “da matéria vibrante de Jane Bennett, como o “conhecimento situado de Donna Haraway e “o sujeito nómada de Rosi Braidotti.”

Os folhetos da exposição ressaltavam ao olhar pela imagem ilustrativa da capa e a e a sua relação com o título, Fragmentos Híbridos. Acompanhou bem a visita e a reflexão sobre os conteúdos teóricos e informativos.  Continha um QR code para aceder à Realidade Aumentada, Artivive, uma ferramenta revolucionária que ajudou a transformar a maneira de olhar a exposição. O acompanhamento foi contínuo no descobrir dos fragmentos correspondentes que formavam, assim, um todo. “Através de uma seleção de imagens e objetos de diversos artistas, a exposição apresenta fragmentos que ora se manifestam como documentos, ora se reconfiguram como “imagens sobreviventes” de Georges Didi-Huberman, surgindo em novas materialidades e ambientes digitais que mantêm a latência das suas aparições anteriores.” As imagens fantasmas, as que “sobrevivem nas fotografias”. O folheto foi dando a conhecer a exposição, através do mapa da galeria, e a possibilidade de ler e pesquisar para aprofundar e conhecer os diversos projetos. Um bom guia informativo e didático, para quem não é desta área “A exposição Fragmentos Híbridos, emerge no âmbito das materialidades híbridas e de processos artísticos baseados na prática. Explora-se assim a potencialidade especulativa do fragmento como conceito operativo nas artes e como recurso para a formação em investigação artística no ensino superior.” Partindo da ideia de que uma porção de algo pode renascer e recriar qualquer outra “coisa”, a mostra propõe situações experimentais que articulam diferentes corpos materiais no continuum da realidade-virtualidade. Este processo visa promover o diálogo entre sujeitos e materiais, que também podem ser sujeitos.”
A organização do espaço foi fluida no seu percurso, sendo este contínuo. A disposição das obras ajudou na compreensão da intenção dos conteúdos. As ferramentas digitais ou virtuais estiveram disponibilizadas na exposição. Num fluxo grande, houve sempre a possibilidade de aceder ao QR code e utilizar a ferramenta Realidade Aumentada no telemóvel. Deu a ideia de que os materiais não são meros recipientes passivos de experiências, mas entidades ativas, portadoras de histórias. Há uma energia latente em tudo o que existe: uma potência que vibra, embora invisível, presenteia o mundo com uma presença além da humana. O percurso iniciou  por um pequeno desenho de um fragmento arqueológico, com o nº1, no qual foi utilizada a Realidade Au
Planta da galeria, percurso numerado e títulos das composições


  

                                               Nº1     Nº2
                                                                                                                 
                                                         
                                                        


                 

Continuando por 3 composições sem título pode-se, assim, ver dois mundos, duas visões, nas quais se deixou a perceção divagar e surpreender-nos.




As emoções evadiram e tudo se transformou num percurso de espanto e curiosidade. O espaço começou a ser mais pequeno, mas os objetos continuaram a contar a sua história e memórias fantasmas. A mostra propôs situações experimentais, as quais interagiram fragmentadas com o corpo e o espaço. A RA desvendou essas memórias interiores.                                                              

 


“Inspirando-se na noção de tessera da crítica literária de Harold Bloom, (1973), e no conceito de constelação enquanto processo criativo dinâmico de Helena Elias, (2019), que resgata a complexidade, significado e autonomia do fragmento de Luísa Perienes 2010), Fragmentos Híbridos expande o conceito de “fragmento nómada proposto por Helena Elias, Mónica Mendes, Pedro Ângelo e Marta Lucas (2024)”. “Numa progressão de texturas, espaços e materializações híbridas, a exposição é um convite à imersão através de experiências multissensoriais, do desenho e da pintura aos fragmentos de múltiplas proveniências, aos conteúdos em Realidade Aumentada e Realidade Virtual.” 

       

             https://www.belasartes.ulisboa.pt/o-fragmento-nomada-workshop- do-projecto-caphe/

 

  


      
                                                             projeto CAPHE  
         A Curadoria da exposição foi da Helena Elias (professora auxiliar a tempo inteiro no departamento de escultura da FBAUL, coordenadora da unidade curricular de cerâmica e coordenadora da linha de investigação no fazer artístico e científico no VICARTE, supervisionando 3 bolseiros de doutoramento de investigação artística da FCT e liderando o projeto ARcTic South e ela é membro do projeto de pesquisa artística Memory) e da Mónica Mendes (artista de media digitais, designer e professora no Departamento de Arte Multimédia. É também investigadora no ITI/LARSYS - Instituto de Tecnologias Interativas, colaboradora no CIEBA – Centro de Investigação e de Estudos em Belas-Artes, da FBAUL, membro fundadora do hackerspace altLab do AZ Labs. Interessada em projetar para um mundo mais sustentável, criou o projeto ARTiVIS, explorando sistemas interativos em tempo real na intersecção entre Arte, Ciência e Tecnologia.). A Curadoria foi eficaz, deu coerência entre as composições e o tema. As curadoras estiveram envolvidas, foram participantes, investigadoras e organizadoras, conseguindo que os conteúdos e os resultados fossem mais coesos. A Exposição relacionou-se bem com as tendências contemporâneas na Arte e na Sociedade, refletindo as diversas preocupações, e tentando uma aplicação mais consistente ao nível da Realidade Virtual e da Inteligência Artificial. Uma exposição com um teor didático devido às práticas de Workshops com outras Faculdades (Quénia) e na própria FBAUL, com alunos. Novas metodologias em escultura com ações criativas em 3 ambientes: sala de aula, atelier, residência artística; as dinâmicas foram decorrentes da prática/reflexão; o conceito de constelação como processo dinâmico criativo: imagem migrante, mesa de montagem/ tessera. “As experiências resultantes abrem caminho para novas abordagens na educação artística, especialmente no que respeita à investigação artística e à sua transferência de conhecimento.“Em particular, a exposição dá a conhecer o trabalho de investigação artística desenvolvido por doutorandos da FBAUL no âmbito das atividades do projeto CAPHE…Neste enquadramento, incluem-se conteúdos documentais realizados durante as mobilidades efectuadas aos países dos seus parceiros, nomeadamente as explorações artísticas assumidas no treino de investigação ao nível do 3º ciclo FBAUL.” Foi uma experiência Híbrida, enriquecedora culturalmente, lúdica, experimentalista nas diversas realidades em que andámos (atual, passada, do sonho, digital, virtual, aumentada…) e importante para a Educação Artística ao nível da formação dos professores. Sem dúvida que foi uma exposição inesquecível para quem a fruiu, principalmente nas Salas Fechadas Virtuais - Os Quatros Elementos, e na visita à Sala da Exposição Virtual -  Avatares,sem faltar o normal “AAAH!”

Apoios de ITI/LARSYS, VICARTE e LiDA – (ESAD.CR/ IPL) com a parceria da CAPHE©2025 - COMMUNITIES AND ARTISTIC PARTICIPATION IN HYBRID ENVIRONMENTS – HORIZON EUROPE PROGRAM UNDER GRANT – AGREEMENT NO. 101086391

https://iti.larsys.pt/project/artivis/                                                                      https://iti.larsys.pt/                https://www.artivive.com/                                                       https://www.ebanocollective.org/team/ 

http://artivis.net/about/                                                                         https://vicarte.org/projects/

https://lida.pt/pt-pt/about/