Nos últimos anos, tornou-se evidente que um álbum já não vive apenas no som. A música contemporânea é também imagem, narrativa e atmosfera. Lançado em 2024, Romance, dos Fontaines D.C., é um exemplo de como o design pode expandir o significado de um disco e redefinir a identidade de uma banda.
Desde o início, os Fontaines D.C. foram associados a uma estética crua e realista, guitarras distorcidas, e uma energia pós-punk direta. Com Romance, a banda dá um passo em direção a um imaginário mais cinematográfico.
A capa do álbum, criada em colaboração com uma nova equipa criativa, apresenta um coração rosado e distorcido, com traços humanos e expressão melancólica, trabalho da artista taiwanesa Lulu Lin. A imagem é simultaneamente romântica e grotesca, como o próprio sentimento de que o disco fala. O fundo azul profundo e a tipografia verde-neon completam um visual que mistura paixão e estranheza, emoção e excesso. Este coração funciona como metáfora para o próprio conceito do álbum: o amor deformado, intensificado, sobrevivente num mundo em colapso. É um design que parece “maior do que a embalagem”, feito para transbordar emoção e presença.
“When we listened to the album, we were struck by how big the music sounded so wanted to use bold bright acid colours and oversized typography to reflect that. Everything is heightened and loud. We wanted to create a sense of the artwork bursting out of the packaging, like it was too big to be contained.” - Texas Maragh, Diretor artístico da XL Recordings.
O design de Romance não se limita à capa. Ele estende-se por toda a campanha: vídeos, performances ao vivo, iluminação, e merchandising. Cada detalhe participa do mesmo universo estético: saturado de cor, luz artificial e melancolia futurista.
A banda inspira-se em referências visuais urbanas e cinematográficas, evocando grandes metrópoles e o brilho artificial dos neons. Essa estética cria contraste com a fase anterior dos Fontaines D.C., mais enraizada no realismo e na identidade irlandesa. Agora, o grupo parece habitar um cenário imaginário, onde o amor e a solidão se refletem em paisagens digitais e luzes distorcidas.
Cada elemento visual reforça a mesma ideia central: um romantismo distorcido e vibrante, que resiste à desintegração do mundo moderno. O vocalista Grian Chatten descreveu o álbum como a tentativa de manter viva uma pequena chama enquanto tudo à volta desaba, e é exatamente essa sensação que o visual comunica. “(…)falling in love at the end of the world(...)The album is about protecting that tiny flame.”
O streaming reduziu a materialidade dos álbuns, o design tornou-se essencial para criar presença e identidade. Romance demonstra que a arte visual pode ser tão importante quanto a sonoridade, não como acessório, mas como extensão emocional e conceptual da música.
Num tempo em que a atenção é fragmentada e as imagens circulam mais rápido do que as melodias, os Fontaines D.C. criaram algo raro: um álbum que se ouve, se vê e se sente como uma obra única e coerente. Romance não é apenas um disco: é um mundo.