quinta-feira, 31 de dezembro de 2015

The Wrong - New Digital Art Biennale

The Wrong – New Digital Art Biennale

1 de Novembro 2015 a 31 de Janeiro 2016

The Wrong é actualmente a maior exposição de arte digital e ocorre principalmente online usando como ponto central o seu site thewrong.org, que se dívide em pavilhões virtuais curados por artístas convidados ou auto-propostos e embaixadas, locais fisicos localizados em vários pontos do planeta que paralelamente apresentam peças, performances, conversas e outros durante o periodo desta bienal.

No trabalho complexo de tentar organizar sem enclausurar as obras dos já mais de mil artistas participantes, o design do site talvez não faça o melhor trabalho para que o visitante não se sinta perdido, mas passeando um pouco pelo site, lendo as informações sobre as várias secções, é possivel perceber a forma como a exposição está organizada, assume-se que será quase impossivel ver tudo e começamos a ver peças.

Na secção Directory do site principal da exposição, poderemos ver uma lista dos pavilhões (à data estão 57 listados, mas somos informados, no final desta lista e na página principal do thewrong.org que o conteúdo está ainda a ser actualizado e que vai sendo carregado diariamente ao longo dos 90 dias da bienal), enquanto que na secção Agenda se pode consultar os eventos programados para as embaixadas.

A intenção do seu organizador, David Quiles Guillo, é que esta exposição seja o mais abrangente e livre possivel, permitindo que qualquer pessoa se possa propor como curador ou como artista até ao ultimo dia da bienal, tal como disse numa entrevista ao Art FCity: “Sou eu que selecciono as pessoas para os pavilhões, por isso, antes de dizer que sim, faço a minha pesquisa. Confirmo que não é só um brincalhão, e mesmo que seja talvez consideremos inclui-lo. O que é realmente bom quanto a organizar um evento online é que temos bastante flexibilidade. Podemos aceitar pessoas até ao ultimo minuto.” (disponível em: http://artfcity.com/2015/10/29/launching-the-largest-digital-biennale-in-the-world-on-shoestring-budget-an-interview-with-david-quiles-guillo/, tradução nossa).

Existem também, na secção Tour, o que se poderá chamar de visitas guiadas virtuais que ajudam a visitar obras sem ter de se perder pelos labirintos dos pavilhões e destaques. Estas visitas guiadas, são alteradas semanalmente e têm a duração prevista de 5 minutos, levando-nos automaticamente para o site de cada obra pela ordem estabelecida pelo curador da visita. Aconselho que se use a opção de se interromper a contagem, no canto superior direito, antes que passe para outra peça pois em todas as que visitei, o tempo dado era insuficiente.

Destaco alguns trabalhos da visita guiada proposta no dia 13 de Dezembro (e prolongada até dia 30), dedicada particularmente a obras em video:


Anatta, 2014, DELEV, Victor e GRUBERSKA, Joanna

Neste vídeo uma bailarina performa interactivamente com uma projecção. Segundo a descrição da peça, o sistema reage aos movimentos da bailarina mas também esta ultima reage ao movimentos da projecção fazendo com que seja criado um jogo de acções e reacções que não se percebem exactamente em que direcção estão a fluir.
As composições entre branco e preto, luz e sombra, tanto da projecção video como da própria bailarina que está vestida de branco e de sombras fortemente vincadas pela luz da projecção, adicionam mais ainda a esta união ou mistura entre o movimento do corpo humano e a reprodução de movimento de um sistema digital tornando-os quase um só.



You were fed by buzz and it was fed by you. But the buzz was insatiable, 2015, COLINA PEREZ, Maria


Este video parte de uma frase de Ray Bradbury: “You can get people to swallow anything at all by intensifying the details”. Partindo desta frase podemos ler no livro The Vision Machine (VIRILIO, Paul. Londres: British Film Institute; Bloomington: Indiana University Press, 1994. ISBN 0-AS17D-L4L45-X. p.65) de que tal como os voyeurs apenas se prendem aos detalhes mais sugestivos, parecem ser apenas os detalhes mais intensivos, ou a própria intensidade da mensagem que contam actualmente deixando tudo o resto para segundo ou terceiro plano. Assim, partindo da ideia de que actualmente a intensidade é o valor máximo para o maior ou menor interesse de algo, a autora desta obra Maria Colina Perez, cria um vídeo bastante saturado de imagem, cor e movimento, com bastante ruído visual, sem no entanto se tornar demasiado agressivo ao que a isso ajuda bastante a nota musical continua e a curta duração da obra, de forma a criar um estado quase hipnotico de fascinação no qual, segundo a artista, a mente fica menos propícia a criticismo.


Google01 - And we danced, 2014, RODRIGUEZ, Borja

Nesta obra o autor usa o motor de busca da Google, mais concretamente a sua função de previsão instantanea onde o site sugere completar os nossos termos de pesquisa partindo de uma base de dados com as pesquisas mais utilizadas.Isto é, quando se escreve algo no motor de busca da Google este sugere completar o que estamos a escrever com o que a maior parte das pessoas escreveram quando usaram termos idênticos.
A obra começa então com uma imagem do motor de busca e é escrita a frase “Eu tenho anos e” à qual é depois acrescentada a idade começando com “Eu tenho 10 anos e” até aos 80 anos. Através deste exercício simples, conseguimos vislumbrar quais são as questões mais comuns (porque mais procuradas no motor de busca) que a maioria das pessoas que usam internet se colocam, percebendo, como diz a descrição da obra, “abstracções desconcertantes, verdades, falacias, desejos e medos sobre todos nós”.


Vitreous, 2015, SEIDEL, Robert

A descrição desta obra diz-nos que o que vemos são 9 esculturas virtuais que resultam de instalações experimentais de objectos digitais tridimensionais. O tratamento dado aos objectos faz com que estes pareçam manchas de tinta suspensas que interagem como imans liquidos que se atraem ou repelem e deformam uns aos outros sendo estimulados por curto-circuitos invisiveis que os mantêm em movimento.


Em jeito de conclusão, para o caso de terem ficado interessados em ler mais sobre esta exposição, deixo alguns links de artigos interessantes:

http://thecreatorsproject.vice.com/blog/the-best-of-the-net-comes-together

https://rhizome.org/editorial/2015/dec/01/the-wrong-biennale-review/

quarta-feira, 30 de dezembro de 2015

Urbano, Biombos e Outras Janelas, 
Galeria 111, Lisboa, Campo Grande 

7 Novembro — 31 Dezembro 2015 
Entrada gratuita





Quando ia buscar as minhas irmãs mais novas à escola, numa tarde em Dezembro, passei pela Galeria 111  e desde o momento em que olhei de relance as grandes portas transparentes da exposição, fiquei com a imagem de que haveria uma algo com motivos florais e coloridos que me chamava a atenção (imagem 1).


Uns dias depois entrei na exposição de Biombos e Outras Janelas, na qual me entregam uma folha com um poema e com um breve resumo de Urbano, " Urbano é da Ilha de São Miguel, Açores. Estudou na Slade School of Fine Art, Londres, entre 1995 e 1997. Em 1998 participou no Kaleidoscope Program: The Royal University College of Fine Arts, Estocolmo e Tavira Print Workshop. Em 1998- 99 decorou a Capela do Hospital do Divino Espírito Santo em Ponta Delgada, Açores. Desde 1997 é representado pela Galeria 111, e desde 2000 colabora com a Galeria Fonseca Macedo de Ponta Delgada."


imagem 1














Começo por observar ainda fora da exposição o biombo azul, o modo como está pintado faz parecer os quadros impressionistas, as pinceladas livres e as cores que de longe nos dão ideia uniforme continuavam a despertar o meu interesse. Enquanto caminhava em direção aos outros quadros, ia lendo o poema que me entregaram à entrada.

Poema Visita Guiada


























Ao longo da visita para além de ir apreciando as cores e a Natureza que o autor tão bem ilustra, talvez por ser dos Açores, viajei pelo jardim, desviei a cortina da minha curiosidade e desvendei o seu segredo " desviar a cortina como quem sabe muito pouco do segredo, sempre casto, que cada pétala protege" a tal mulher que troca as lágrimas do autor em sorrisos.





Seguidamente juntamente aos retratos de flores, frutos e árvores aos poucos vai aparecendo a figura de uma mulher com um gesto subtil, que nos acompanha até ao fim da exposição. 




















































Adorei cada minuto que estive nesta exposição, se já ia com a expectativa elevada pela representação gráfica das obras, o seu lado poético tocou a minha alma, pensei que se tivesse o dinheiro que pediam, tinha trazido um dos biombos.


quinta-feira, 17 de dezembro de 2015

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Projecto Teatral
«nenhuma entrada entrem»
Carlos M Gonçalves
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Culturgest / Galeria 1 / Entrada Gratuita / De 24 de outubro a 10 de janeiro, de terça a sexta-feira das 11h às 18h (última admissão às 17h30); sábados, domingos e feriados, das 11h às 19h (última admissão às 18h30). 
Encerra à segunda-feira / Curadoria: Projecto Teatral
Rua do Arco do Cego, 50; 1000-300 Lisboa / Telf.: 21 790 51 55 / e-mail: culturgest@cgd.pt
 
© Carlos M Gonçalves
Fig. 1 vazio do teatro, 2009. Peça A: terra prensada; B: pano-cru e madeira, na Culturgest, Lisboa, Portugal. Fonte: própria.
Quem quiser visitar em Lisboa uma exposição com responsabilidade social que procura eliminar a discriminação, evitar a poluição e tudo mais que sejam ideias-chave da cultura reformadora contemporânea, a escolha deverá recair sobre a seleção de peças do coletivo Projecto Teatral que se auto-qualificam como não-autores.

Desde de 1994 que o coletivo Projecto Teatral (Helena Tavares, João Rodrigues, Maria Duarte, André Maranha, Gonçalo Ferreira de Almeida: composição atual) iniciou um trabalho empresarial artístico redirecionado para questões que desafiam o conceito tradicional de teatro enquanto representação do mundo sempre com títulos em minúsculas, aparentemente, como forma de resistência à lexia. O porquê do abandono do espaço, do tempo, do ator, da voz e do texto, motiva o coletivo ao «vazio do teatro» (Figura 1). Não um teatro vazio espacial, mas um corpo humano sem proprietário. 
Filiados nos ideais minimalistas de representação artística em que radicam um processo de desfamiliarização [que] corresponde um movimento de desterritorização, aceitam a matéria fora do espaço convencional de representação de acontecimentos artísticos que interpretam como sendo teatrais. A ideia de artista tradicional – preocupado com a notoriedade social, com a consequente valorização económica da sua obra e mesmo do seu próprio corpo enquanto arte – também é aqui abandonada. Ao manter o produto artístico dentro das regras do jogo económico, participa de uma competição livre e aberta, sem espaço ao engano nem à fraude. Podendo-se classificar esse produto artístico de escultura contemporânea, tanto visual quanto sonora.
Este ano reúnem na conceituada galeria de arte da Culturgest um grupo de seis peças embrionárias da noção principal que o coletivo mantém há quinze anos: a tragédia do teatro. Uma escavação interior do Ser que deixa um vazio ao qual chama alma. A alma é o vazio íntimo de um vivo ... é a forma física do vazio. A ausência de um corpo morto enquadrado no vazio de um túmulo, um túmulo enquadrado, por sua vez, num templo que remete para o oculto e o ritual teatral. 
Quem visita a exposição, é convidado a participar numa cena que é um templo e entra num túmulo visitável. Testemunha a cena dividindo-a em duas: dentro e fora-de-cena. Uma cena vazia, sem mistério, é o templo onde o Homem se vê vazio a si mesmo e torna a representação viva. É na representação que o Homem explora o seu vazio com o objectivo de se conhecer. Na vertiginosa descoberta de si fora de si o mistério assume-se como abismo que ele mesmo é.  
O teatro é assim, definitivamente a condição hiante do Homem.

© Carlos M Gonçalves
Fig. 2 moinho, 2013. Pó branco, na Culturgest, Lisboa, Portugal. Fonte: própria.

Exposição de grande grande interesse não só por desenvolver uma espécie de teoria da condição humanatravés da ausência, mas também pela materialidade austera das peças sob o pretexto do prazer do culto patente na fragilidade imediata da peça «moinho» (Figura 2). Assumindo que a arte é uma teatralizarão (contemplação) da morte – é ... o teatro que no-lo dá a ver e a ouvir, Projecto Teatral explora dois sentidos do Homem em que a arte se enraíza e que podem atuar à distância: na visão e na audição. É com esta consciência bem presente que Projecto Teatral produz as suas peças omne ignotum pro magnifico, o seu produto artístico. A partir do círculo e do quadrado, formas primordiais que acolhem matérias orgânicas como a terra prensada, a água em forma de vapor, a madeira, o pano-cru o gesso e um pó, nascem peças de grande e pequenas dimensões com um ou dois elementos impactantes como é o exemplo de «ostra» (Figura 3).

© Carlos M Gonçalves
Fig. 3 ostra, 2010. Terra prensada e gesso, na Culturgest, Lisboa, Portugal. Fonte: própria.

«ostra» é constituída por dois blocos em terra prensada em forma de ataúde, sendo que no seu interior a base é revestida a gesso branco onde assentaria o corpo sem vida. Platão definiu o corpo humano como uma espécie de concha de ostra agarrada a nós. Ostra torna clara esta dicotomia alma-corpo e sugere talvez ressurreição. 

Projecto Teatral, «nenhuma entrada entrem», move-se na bicromia da luz e da sombra. A luz presente no branco imaculado das peças de uma das salas, atinge todo seu esplendor em «imaginação morta imaginem» (Figura 4). Em 2001, o Projecto Teatral publica um pequeno livro de Samuel Beckett: "imaginação morta imaginem". Visual e sonora, esta peça é uma voz que traça um desenho geométrico de um espaço expositivo, iluminado por uma luz ativadora da percepção espacial e do olho do visitante...

© Carlos M Gonçalves
Fig. 4 imaginação morta imaginem, 2001. Áudio analógico, 15mnts, na Culturgest, Lisboa, Portugal. Fonte: própria.
«Bouvard e Pécuchet» (Figura 5) uma confrontação encenada, um lugar vivido onde uma chaleira continua a expulsar o vapor da pressão da água que se aquece. Um perfil de uma confrontação entre testemunha e personagem; entre presente e ausente tornando possível a amizade e o amor... «Bouvard e Pécuchet» une dois Seres separados por cópias de textos antropológicos...
Antropológico é também o filme-arquivo que faz e completa parte da peça denominada «dom» (Figura 6). Secção da exposição que convida a nos sentarmos e observarmos na penumbra a forma de uma mortalha em pano-cru, rasante ao chão, ladeada de bancos corridos

© Carlos M Gonçalves
Fig. 5 Bouvard e Pécuchet (2004). Madeira, vidro, metal, papel e água, na Culturgest, Lisboa, Portugal. Fonte: própria.
© Carlos M Gonçalves
Fig. 6 dom, 2012. Filme, loop, 16 mm, na Culturgest, Lisboa, Portugal. Fonte: própria.

Enfim, "Teatro do vazio" é o manifesto que Yves Klein publica em "Dimanche - Le Journal d'un Seul Jour",  a 27 de Novembro de 1960, fazendo parte do Festival de Arte de Vanguarda onde, na primeira página é apresentada pela primeira vez afamada fotomontagem "Salto no vazio".
Neste sentido
«vazio do teatro» (Figura 1), exercita a catarse estética do teatro. Aqui o observador (a testemunha) é convidado a dois olhares sobre o mesmo vazio. Por uma lado a força de uma caixa compacta de terra prensada que dispõe no centro uma vala de dois níveis de difícil acesso e do tamanho de um corpo adulto. A ideia de que veio de outro lugar, resulta nesta espécie de palco com fosso recortado no centro, iluminado com luz produtora de sombra de pôr-do-sol. Por outro, a forma convexa coberta de tiras entrelaçadas em pano-cru que formam uma quadricula vertiginosa relembra faixas envolventes das múmias de Faium. A grande caixa de terra prensada com a fossa no centro evoca a memória de um defunto desconhecido; a pequena forma convexa, o corpo infantil sem rosto conhecido.

«nenhuma entrada entrem» é assim uma exposição portuguesa inédita; uma memória de futuro dentro de um túmulo esvaziado; o imemorial do passado dentro de um templo impessoal; um estranhamento Noir contemporâneo.



Folha de sala. Mapa que suprime as tradicionais legendas, ausentes propositadamente nesta exposição. Encontra-se disponível na livraria/biblioteca da Galeria um belíssimo objecto-livro que reúne textos e imagens da seleção de peças do colectivo Projecto Teatral alinhadas na programação resultado da colaboração entre Culturgest e Teatro Maria Matos.



 A realização do trabalho que conduziu a esta recensão apenas foi possível devido à disponibilidade imediata da Fundação Caixa Geral de Depósitos - Culturgest plo coordenador de produção | Exposições, Exm.º Sr.º Mário Valente e sua equipa.

terça-feira, 15 de dezembro de 2015

À luz do dia até os sons brilham


Wim Wenders à descoberta de Portugal

Museu da Água Reservatório da Mãe d’Água das Amoreiras
Inserida na programação do Lisbon & Estoril Film Festival – LEFFEST
Curadoras: Ana Duque y Gonzales e Laura Schimidt
Realizada pela Wenders Images e pela Fundação Wim Wenders em colaboração com o LEFFEST e com o Museu da Água da EPAL
De 07 de novembro de 2015 até 02 de abril de 2016
Preço: 5 

"No one will doubt that, besides water, life is the best thing a human being has."
Georg Christoph Lichtenberg (1742-1799)


A exposição se encontra no Reservatório da Mãe d’Água das Amoreiras, depósito que recolhe as águas provenientes do aqueduto das Águas Livres, no distrito de Lisboa. A construção data de 1834 e sua arquitetura sóbria veste a exibição perfeitamente, combinando com a nostalgia das 28 fotografias escolhidas, assim como o som da cascata e da Arca d’Água que ditam o clima presente no espaço.
Wim Wenders é um realizador de renome alemão, importante figura integrante do Novo Cinema Alemão e, hoje, Presidente da Academia de Cinema Europeu em Berlim. Wenders costuma misturar abordagens transitando entre ficções, documentários e séries de televisão, marcados frequentemente pelo realismo fantástico. As fotografias em exibição foram registradas pelo autor enquanto descobria Portugal em preparação para as filmagens de suas obras O Estado das Coisas, Até o Fim do Mundo e Lisbon Story. Isso se deu entre 1980 e 1994, momento em que o país passava por mudanças políticas e iniciava uma expansão econômica.


A frase de Fernando Pessoa “À luz do dia até os sons brilham” é utilizada como título da exposição,  utilizada pelo realizador em seu filme Lisbon Story, e nenhum outro título cairia melhor aqui também. As imagens de Portugal surgiram com uma visita de Wenders às instalações abandonadas do Hotel da Praia Grande, em Sintra.


Once
at the westernmost tip
of the European continent,
where Portugal has its pointed nose,
at least on the atlas,
I came across an abandoned hotel.
With every wave
the Atlantic asserted its claim on this piece
of land.
This place longed to became a movie,
I felt,
realizing at the same time
that I had already brought the story for it
with me,
and that only here I’d be able to get it off
my chest.
America was “opposite”,
just across the sea.

(Wim Wenders, Once. Pictures and Stories. Munique, Schirmer Art Books, 2015, p.26)

 

A paixão de Wenders por Portugal, suas transformações e sua história foi instantânea.  O clima nostálgico e malancólico de Lisboa acabou em arte.

“e em Lisboa lembrei-me da Alemanha da minha infância.”
(texto: Wim Wenders, Once. Pictures and Stories. Munique, Schirmer Art Books, 2015, p.244) 


Começamos a caminhar pelo caminho cinzento e estreito que dá a volta ao espelho d’água no centro do prédio, o som da água caindo e a música clássica ao fundo acentuam a nostalgia presente nas imagens de Wim Wenders, não só como tema das fotos, mas em suas cores e ângulos. O fato de não se poder tomar distância para observar as fotos, devido ao caminho estreito, força-nos a quase fazer parte da imagem, percebendo cada canto da composição. As fotografias de Wenders são carregadas de detalhes e nuances que só uma boa observação pode captar.


Num ambiente nostálgico e clássico, percorre-se o caminho de 27 obras postas às paredes, iluminadas individualmente, mas também banhadas com a luz natural que entra pelas longas e antigas janelas do edifício. O olhar de Wenders é emoldurado pelos detalhes do local, mas também pela sua história, visto que o aqueduto que desagua neste local é também assunto de imagens em questão. Há história nas imagens e nas paredes que as vestem.

 

A última obra, que também pode ser a primeira, já que o caminho é praticamente um círculo, de numero 28, é enorme e colocada sob o espelho d’água, o chamariz da exposição, primeira e última coisa que se vê.


Wim Wenders pousa seu olhar pelas ruas, telhados, construções, trabalhadores e pelo abandono. Usa de cores e preto e branco, contrastes marcantes entre luz e sombras. Suas composições são recheadas de observação e curiosidade. O descobrimento de uma cidade em pleno estado de transição, uma nostalgia quase palpável. As imagens de Wenders não são apenas documentais, mas uma homenagem à Lisboa, à sua evolução, símbolos de uma transformação que se manifesta no espaço.


A exibição fica até abril de 2016 e, sem dúvida, é uma visita que vale a pena, para quem conhece o trabalho de Wim Wenders ou não.